A um legista

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Tu foges á cidade?
Feliz amigo! Vão
Comtigo a liberdade,
A vida e o coração.

A estancia que te espera
É feita para o amor

Do sol co'a primavera,
No seio de uma flôr.

Do paço de verdura
Transpõe-me esses humbraes;
Contempla a architectura
Dos verdes palmeiraes.

Esquece o ardor funesto
Da vida cortezã;
Mais vai que o teu Digesto
A rosa da manhã.

Rosa... que se enamora
Do amante colibri,
E desde a luz da aurora
Os seios lhe abre e ri.

Mas Zephyro bregeiro
Oppõe ao beija-flôr
Embargos de terceiro
Senhor e possuidor.

Quer este possuil-a,
Tambem o outro a quer.

A pobre flôr vacilla,
Não sabe a que attender.

O sol, juiz tão grave
Como o melhor doutor,
Condemna a briza e a ave
Aos osculos da flôr.

Zephyro ouve e appella.
Appella a colibri.
No emtanto a flôr singela
Com ambos folga e ri.

Tal a formosa dama
Entre dous fogos, quer
Aproveitar a chamma...
Rosa, tu és mulher!

Respira aquelles ares,
Amigo. Deita ao chão
Os tedios e os pezares.
Revive. O coração

É como o passarinho,
Que deixa sem cessar

A maciez do ninho
Pela amplidão do ar.

Pudesse eu ir comtigo,
Gozar comtigo a luz;
Sorver ao pé do amigo
Vida melhor e a flux!

Ir escrever nos campos,
Nas folhas dos rosaes,
E á luz dos pyrilampos,
Ó Flora, os teus jornaes!

Da estrella que mais brilha
Tirar um raio, e então
Fazer a gazetilha
Da immensa solidão.

Vai tu que podes. Deixa
Os que não podem ir,
Soltar a inutil queixa,
Mudar é reflorir.