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Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1945)/II

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Base i

O k, o w, e o y mantêm-se nos vocábulos derivados eruditamente de nomes próprios estrangeiros que se escrevam com essas letras: franklianiano, kantismo; darwinismo, wagneriano; byroniano, taylorista. Não é lícito, portanto, em tais derivados, que o k, o w, e o y sejam substituídos por letras vernáculas equivalentes: cartismo, daruinismo, baironiano, etc.

Base ii

Em congruência com a base anterior, mantêm-se nos vocábulos derivados eruditamente de nomes próprios estrangeiros, não tolerando substituição, quaisquer combinações gráficas não peculiares à nossa escrita que figurem nesses nomes: comtista, de Comte; garrettiano, de Garrett; jeffersónia, de Jefferson; mülleriano, de Müller; shakespeariano, de Shakespeare.

Base iii

O h inicial emprega-se:

  1. por força da etimologia: haver, hélice, hera, hoje, hora, humano;
  2. em virtude de tradição gráfica muito longa, com origem no próprio latim e com paralelo em línguas românicas: húmido, humor;
  3. em virtude de adopção convencional: hã?, hem?, hum!

Admite-se, contudo, a sua supressão, apesar da etimologia, quando ela está inteiramente consagrada pelo uso: erva, em vez de herva; e, portanto, ervaçal, ervanário, ervoso (em contraste com herbáceo, herbanário, herboso, formas de origem erudita).

Se um h inicial passa a interior, por via de composição, e o elemento em que figura se aglutina ao precedente, suprime-se: anarmónico, biebdomadário, desarmonia, desumano, exaurir, inábil, lobisomem, reabilitar, reaver, transumar. Igualmente se suprime nas formas do verbo haver que entram, com pronomes intercalados, em conjugações de futuro e de condicional: amá-lo-ei, amá-lo-ia, dir-se-á, dir-se-ia, falar-nos-emos, falar-nos-íamos, juntar-se-lhe-ão, juntar-se-lhe-iam. Mantém-se, no entanto, quanto, numa palavra composta, pertence a um elemento que está ligado ao anterior por meio de hífen: anti-higiénico, contra-haste, pré-história, sobre-humano.

Base iv

Os diagramas finais de origem hebraica ch, ph, e th conservam-se íntegros, em formas onomásticas da tradição bíblica, quando soam (ch = c, ph = f, th = t) e o uso não aconselha a sua substituição: Baruch, Loth, Moloch, Ziph. Se, porém, qualquer destes diagramas, em formas do mesmo tipo, é invariàvelmente mudo, elimina-se: José, Nazaré, em vez de Joseph, Nazareth; e se algum deles, por força do uso, permite adaptação, substitui-se, recebendo uma adição vocálica: Judite, em vez de Judith.

Base v

Dada a homofonia existente entre certas consoantes, torna-se necessário diferençar os seus empregos gráficos, que fundamentalmente se regulam pela etimologia e pela história das palavras. É certo que a variedade das condições em que se fixam na escrita as consoantes homófonas nem sempre permite fácil diferenciação de todos os casos em que se deve empregar uma consoante e daqueles em que, diversamente, se deve empregar outra, ou outras, do mesmo som; mas é indispensável, apesar disso, ter presente a noção teórica dos vários tipos de consoantes homófonas e fixar pràticamente, até onde for possível, os seus usos gráficos, que nos casos especiais ou dificultosos a prática do Idioma e a consulta do vocabulário ou do dicionário irão ensinando.

Nesta conformidade, importa notar, principalmente, os seguintes casos:

  1. Distinção entre ch e x: achar, archote, bucha, capacho, capucho, chamar, chave, Chico, chiste, chorar, colchão, colchete, endecha, estrebuchar, facho, ficha, flecha, frincha, gancho, inchar, macho, mancha, murchar, nicho, pachorra, pecha, pechincha, penacho, rachar, sachar, tacho; ameixa, anexim, baixel, baixo, bexiga, bruxa, coaxar, coxia, debuxo, deixar, eixo, elixir, enxofre, faixa, feixe, madeixa, mexer, oxalá, praxe, puxar, rouxinol, uxte (interjeição), vexar, xadrez, xarope, xenofobia, xerife, xícara.
  2. Distinção entre g palatal e j: adágio, alfageme, álgebra, algema, algeroz, Algés, algibebe, algibeira, álgido, almargem, Alvorge, Argel, estrangeiro, falange, ferrugem, frigir, gelosia, gengiva, gergelim, geringonça, Gibraltar, ginete, ginja, girafa, gíria, herege, relógio, sege, Tânger, virgem; adjectivo, ajeitar, ajeru (nome de planta indiana e de uma espécie de papagaio), canjerê, canjica, enjeitar, granjear, hoje, intrujice, jecoral, jejum, jeira, jeito, jelala, Jeová, jenipapo, jequiri, jequitibá, Jeremias, Jericó, jerimum, Jerónimo, Jesus, jibóia, jiquipanga, jiquiró, juiquitaia, jirau, jiriti, jitirana, laranjeira, lojista, majestade, majestoso, majerico, majerona, mucujê, pajé, pegajento, rejeitar, sujeito, trejeito.
  3. Distinção entre as sibilantes surdas s, ss, c, ç, e x: ânsia, ascensão, aspersão, cansar, conversão, esconso, farsa, ganso, imenso, mansão, mansarda, manso, pretensão, remanso, seara, seda, Seia, sertã, Sernancelhe, serralheiro, Singapura, Sintra, sisa, tarso, terso, valsa; abadessa, acossar, amassar, arremessar, Asseiceira, asseio, atravessar, benesse, Cassilda, codesso (idênticamente, Codessal ou Codassal, Codessada, Codessoso, etc.), crasso, devassar, dossel, egresso, endossar, escasso, fosso, gesso, molosso, mossa, obsessão, pêssego, possesso, presságio, remessa, sobresselente, sossegar; acém, acervo, alicerce, cebola, cereal, Cernache, cetim, Cinfães, Escócia, Macedo, obcecar, percevejo; açafate, açorda, açúcar, almaço, atenção, berço, Buçaco, caçanje, caçula, caraça, dançar, Eça, enguiço, Gonçalves, inserção, linguiça, maçada, Mação, maçar, Moçambique, Moçâmedes, Monção, muçulmano, murça, negaça, pança, peça, quiçaba, quiçaça, quiçama, quiçamba, Seiça (grafia que pretere as erróneas Ceiça e Ceissa), Seiçal, Suíça, terço; auxílio, Maximiliano, Maximino, máximo, próximo, sintaxe. A propósito deve observar-se:
    1. Em princípio de palavra nunca se emprega ç, que se substitui invariàvelmente por s: safio, sapato, sumagre, em vez das antigas escritas çafio, çapato, çumagre.
    2. Quando um prefixo se junta a um elemento que começava outrora por ç, não reaparece esta letra: mantém-se o s, que, encontrando-se entre vogais, se dobra: assaloiado, de saloio (ant. çaloio), e não açaloiado.
  4. Distinção entre s de fim de sílaba, inicial ou interior, e x e z idênticos: adestrar, Calisto, escusar, esdrúxulo, esgotar, esplanada, esplêndido, espremer, esquisito, estender, Estremadura, Estremoz, inesgotável; extensão, explicar, extraordinário, inextricável, inexperto, sextante, têxtil; capazmente, infelizmente, velozmente. De acordo com esta distinção, convém notar dois casos:
    1. Em final de sílaba que não seja final de palavra, o x = s muda para s sempre que está precedido de i ou u: justapor, justalinear, misto, sistino (cf. Capela Sistina), Sisto, em vez de juxtapor, juxtalinear, mixto, sixtino, Sixto.
    2. Só nos advérbios em -mente se admite z = s em final de sílaba seguida de outra. De contrário, o s toma sempre o lugar do z: Biscaia, e não Bizcaia.
  5. Distinção entre s final de palavra e x e z idênticos: aguarrás, aliás, anis, após, atrás, através, Avis, Brás, Dinis, Garcês, gás, Gerês, Inês, íris, Jesus, jus, lápis, Luís, país, português, Queirós, quis, retrós, resvés, revés, Tomás, Valdês; cálix, Félix, fénix, flux; assaz, arroz, avestruz, dez, diz, fez, (substantivo e forma do verbo fazer), fiz, Forjaz, Galaaz, giz, jaez, matiz, petiz, Queluz, Romariz, [Arcos de] Valdevez, Vaz. A propósito, deve observar-se que é inadmissível z final equivalente a s em palavra não oxítona: Cádis, e não Cádiz.
  6. Distinção entre as sibilantes sonoras interiores s, x, e z: aceso, analisar, anestesia, artesão, asa, asilo, Baltasar, besouro, besuntar, blusa, brasa, brasão, Brasil, brisa, [Marco de] Canaveses, coliseu, defesa, duquesa, Elisa, empresa, Ermesinde, Esposende, frenesi ou frenesim, frisar, guisa, guisar, improviso, jusante, liso, lousa, Lousã, Luso (nome de lugar, homónimo de Luso, nome mitológico), Matosinhos (povoação de Portugal), Meneses, Narcisco, Nisa, obséquio, ousar, pesquisa, portuguesa, presa, raso, represa, Resende, sacerdotisa, Sesimbra, Sousa, surpresa, tisama, transe, trânsito, vaso; exalar, exemplo, exibir, exorbitar, exuberante, inexacto, inexorável; abalizado, alfazema, Arcozelo, autorizar, azar, azedo, azo, azorrague, baliza, bazar, beleza, buzina, búzio, comezinho, deslizar, deslize, Ezequiel, Frazão, fuzileiro, Galiza, guizo, helenizar, lambuzar, lezíria, Mouzinho, proeza, Salazar, sazão, urze, vazar, Veneza, Vizela, Vouzela.

Base vi

O c gutural das sequências interiores cc (segundo c sibilante), e ct, e o p das sequências interiores pc (c sibilante), e pt, ora se eliminam, ora se conservam. Assim:

  1. Eliminam-se nos casos em que são invariàvelmente mudos, quer na pronúncia portuguesa, quer na brasileira, e em que não possuem qualquer valor particular: aflição, aflito, autor, condução, condutor, dicionário, distrito, ditame, equinócio, extinção, extinto, função, funcionar, instinto, praticar, produção, produto, restrição, restrito, satisfação, vítima, vitória, em vez de aflicção, aflicto, auctor, conducção, conductor, diccionário, districto, dictame, equinóccio, extincção, extincto, funcção, funccionar, instincto, practicar, producção, producto, restricção, restricto, satisfacção, víctima, victória; absorção, absorcionista, adsorção, assunção, assunto (substantivo), cativar, cativo, descrição, descritivo, escrito, excerto, inscultor, inscultura, presunção, presuntivo, prontidão, pronto, prontuário, redenção, redentor, transunto, em vez de absorpção, absorpcionista, adsorpção, assumpção, assumpto, captivar, captivo, descripção, descriptivo, descripto, excerpto, insculptor, insculptura, presumpção, presumptivo, promptidão, prompto, promptuário, redempção, redemptor, transumpto;
  2. Conservam-se não apenas nos casos em que são invariàvelmente proferidos (compacto, convicção, convicto, ficção, fricção, friccionar, pacto, pictural; adepto, apto, díptico, erupção, eucalipto, inepto, núpcias, rapto; etc.), mas também naqueles em que só se proferem em Portugal ou só no Brasil, quer geral, quer restritamente: cacto (c interior geralmente proferido no Brasil e mudo em Portugal), caracteres (c interior em em condições idênticas), coarctar, contacto, dicção, facto (c geralmente proferido em Portugal e mudo no Brasil), jacto, perfunctório, revindicta, tactear, tacto, tecto (c por vezes proferido no Brasil); assumptível, assumptivo, ceptro, corruptela, corrupto, corruptor, peremptório (p interior geralmente proferido no Brasil, mas predominantemente mudo em Portugal), sumptuário, sumptuoso;
  3. Conservam-se, após as vogais a, e, e o, nos casos em que não é invariável o seu valor fonético e ocorrem em seu favor outras razões, como a tradição ortográfica, a similaridade do português com as demais línguas românicas e a possibilidade de, num dos dois países, exercerem influência no timbre das referidas vogais: acção, activo, actor, afectuoso, arquitectura, colecção, colectivo, contracção, correcção, defectivo, dialectal, didactismo, direcção, director, eclectismo, electricidade, espectáculo, espectral, facção, faccioso, flectir, fracção, fraccionário, fractura, hecticidade, insecticida, inspecção, inspector, intelectual, leccionar, lectivo, nocturno, objecção, objectivo, Octaviano, Octávio, protecção, protector, secção, seccionar, sectário, sector, selecção, seleccionar, selectivo, subtracção, tracção, tractor, transacção, transaccionar; acepção, adopção, adoptar, adoptivo, anabaptista, baptismo, Baptista, baptistério, baptizar, cepticismo, concepção, conceptáculo, conceptivo, conceptual, decepção, excepção, excepcional, exceptuar, imperceptível, intercepção, interceptação, interceptar, interceptor, Neptuno, neptunino, opticidade, optimate, optimismo, optimista, percepção, perceptível, perceptivo, preceptivo, preceptor, recepção, receptação, receptáculo, receptador, receptivo, receptor, septenário, septênviro, septiforme, septissílabo, septuagenário, septuagésimo, septuplicar, sub-reptício, susceptibilidade, susceptível;
  4. Conservam-se quando, sendo embora mudos, ocorrem em formas que devem harmonizar-se gràficamente com formas afins em que um c ou um p mantêm, de acordo com um dos dois números anteriores, ou em que essas consoantes estão contidas, respectivamente, num x ou uma sequência ps. Escreve-se, por isso: abjecto, como abjecção; abstracto, como abstracção; acta e acto, como acção ou activo; adopto, adoptas, etc., como adoptar; afecto, como afectivo ou afectuoso; árctico e antárctico, como Arcturo; arquitecto, como arquitectura; caquéctico, como caquexia; carácter, como caracteres; colecta, como colectar; contracto (diferente de contrato = «acto de contratar»), como contracção ou contractivo; correcto, como correcção ou correctivo; dialecto, como dialectal; didáctico, como didactismo; dilecto, como dilecção; directo, como direcção ou director; ecléctico, como eclectismo; Egipto, como egípcio; eléctrico, como electricidade; epiléptico, como epilepsia; espectro, como espectral; exacto, como exactidão; excepto, como excepção ou exceptuar; flectes, flecte, flectem, como flectir; héctico, como hecticidade; objecto, como objecção ou objectivo; olfacto, como olfacção ou olfactivo; óptico, como opticidade; óptimo, como optimismo; predilecto, como predilecção; projecto, como projecção ou projector; prospecto, como prospecção ou prospectivo; recto, como rectidão; reflectes, reflecte, reflectem, como reflectir; reflicto, reflicta, reflictas, reflictamos, etc., como reflectes, reflectir, etc.; selecta e selecto, como selecção ou selectivo; séptuplo, como septuplicar; sintáctico, como sintaxe (x = ss, mas etimològicamente cs); táctica e táctico, como tacticografia; etc.

Prescinde-se da congruência gráfica referida no último número, quando determinadas palavras, embora afins, divergem nas condições em que entraram e se fixaram no português. Não há, por isso, que harmonizar: assunção com assumptivo; assunto, substantivo, com assumpto, adjectivo; cativo com captor ou captura; dicionário com dicção; vitória com victrice; etc.

Base vii

Independentemente do c gutural das sequências interiores do cc, , e ct, e do p das sequências interiores pc, , e pt, eliminam-se consoantes várias de outras sequências, sempre que são invariàvelmente mudas, quer na pronúncia portuguesa, quer na brasileira. As mesmas consoantes, porém, se conservam (ou se substituem por outras equivalentes, dentro das normas da escrita simplificada), no caso de serem invariàvelmente proferidas ou de oscilarem entre a prolação e o emudecimento. Assim:

  1. b da sequência bd: mantém-se, apesar de nem sempre soar, no adjectivo e substantivo súbdito;
  2. b da sequência bt: mantém-se, por não ser geral o seu emudecimento, em subtil e derivados;
  3. c da sequência cd: elimina-se, por ser sempre mudo, em anedota e respectivos derivados ou compostos, assim como em sinédoque;
  4. g da sequência gd: elimina-se, por ser sempre mudo, em Emídio e Madalena, ao passo que se mantém, por nem sempre ser mudo, em amígdala e respectivos derivados ou compostos;
  5. g da sequência gm: elimina-se em aumentar, fleuma, etc., mas conserva-se em todas as palavras em que invariàvelmente se profere, como apotegma, diafragma, fragmento;
  6. g da sequência gn: conserva-se em Agnelo, designar, etc., mas elimina-se em todas as palavras em que é invariàvelmente mudo, como assinatura, Inácio, Inês, sinal;
  7. m da sequência mn: mantém-se, embora nem sempre soe, em amnistia, amnistiar, indemne, indemnização, indemnizar, omnímodo, omnipotente, mas elimina-se em condenar, dano, ginásio, ónibus, solene, sono;
  8. p da sequência inicial ps: conquanto geralmente se mantenha, elimina-se, excepcionalmente, em salmo e salmodia, assim como nos derivados destas palavras;
  9. s da sequência xs: elimina-se, por ser invariàvelmente mudo, em exangue e nas palavras em que está seguido de outra consoante: expuição, extipuláceo, extipulado (parónimo de estipulado), em vez de exspuição, exstipuláceo, exstipulado;
  10. ph da sequência de origem grega phth: ao passo que perdura sob a forma de f, tal como o th seguinte sob a forma de t, em grande número de palavras, como afta, difteria, ftártico, ftiríase, ftórico, oftalmologia, etc., elimina-se em apotegma, ditongo, tísico, tisiologia, etc.;
  11. th da sequência de origem grega thm: perdura sob a forma de t, embora nem sempre seja proferido, em aritmética e aritmético, mas elimina-se em asma e derivados.

Base viii

As consoantes finais b, c, d, g, e t mantêm-se, quer sejam mudas, quer proferidas, nas formas onomásticas em que o uso as consagrou, nomeadamente antropónimos e topónimos da tradição bíblica: Jacob, Job, Moab; Isaac; David, Gad; Gog, Magog; Bensabat, Josafat.

Integram-se também nesta norma: o antropónimo Cid, em que o d é sempre pronunciado; os topónimos Madrid e Valhadolid, em que o d ora é pronunciado, ora não; e o topónimo Calecut ou Calicut, em que o t se encontra nas mesmas condições.

Base ix

O emprego do e e do i, assim como do o e do u, em sílaba átona, regula-se fundamentalmente pela etimologia e por particularidades da história das palavras. Assim se estabelecem variadíssimas grafias:

  1. com e e i: ameaça, amealhar, antecipar, arrepiar, balnear, boreal, campeão, cardeal, (prelado, ave, planta; diferente de cardial = «relativo à cárdia»), Ceará, côdea, enseada, enteado, Floreal, janeanes, lêndea, Leonardo, Leonel, Leonor, Leopoldo, Leote, lincar, meão, melhor, nomear, peanha, quase (em vez de quási), real, semear, semelhante, várzea,; ameixial, Ameixieira, amial, amieiro, arrieiro, artilharia, capitânia, cordial (adjectivo e substantivo), corriola, crânio, criar, diante, diminuir, Dinis, ferregial, Filinto, Filipe (e idênticamente Filipa, Filipinas, etc.), freixial, giesta, Idanha, igual, imiscuir-se, inigualável, lampião, limiar, Lumiar, lumieiro, pátio, pior, tigela, tijolo, Vimieiro, Vimioso, Virgílio (em vez de Vergílio);
  2. com o e u: abolir, Alpendorada, assolar, borboleta, cobiça, consoada, consoar, costume, díscolo, êmbolo, engolir, epístola, esbaforir-se, esboroar, farândola, femoral, Freixoeira, girândola, goela, jocoso, mágoa, névoa, nódoa, óbolo, Páscoa, Pascoal, Pascoela, polir, Rodolfo, távoa, tavoada, távola, tômbola, veio (substantivo e forma do verbo vir); água, aluvião, arcuense, assumir, bulir, camândulas, curtir, curtume, embutir, entupir, fémur, fístula, glândula, íngua, jucundo, légua, Luanda, lucubração, lugar, mangual, Manuel, míngua, Nicarágua, pontual, régua, tábua, tabuada, tabuleta, trégua, vitualha.

Sendo muito variadas as condições etimológicas e fonético-históricas em que se fixam gràficamente e e i ou o e u em sílaba átona, é evidente que só a consulta dos vocabulários ou dicionários pode indicar, muitas vezes, se deve empregar-se e ou i, se o ou u. Há, todavia, alguns casos em que o uso dessas vogais pode ser fàcilmente sistematizado. Convém fixar os seguintes:

  1. Escrevem-se com e, e não com i, antes da sílaba tónica, os substantivos e adjectivos que procedem de substantivos terminados em -eio e -eia, ou com eles estão em relação directa. Assim se regulam: aldeão, aldeola, aldeota, por aldeia; areal, areeiro, areento, Areosa, por areia; aveal, por aveia; baleal, por baleia; boleeiro, por boleia; cadeado, por cadeia; candeeiro, por candeia; centeeira e centeeiro, por centeio; colmeal e colmeeiro, por colmeia; correada, correame, por correia.
  2. Escrevem-se igualmente com e, antes de vogal ou ditongo da sílaba tónica, os derivados de palavras que terminam em e acentuado (o qual pode representar um antigo hiato: ea, ee): galeão, galeota, galeote, de galé; guineense, de Guiné; poleame e poleeiro, de polé.
  3. Escrevem-se com i, e não com e, antes da sílaba tónica, os adjectivos e substantivos derivados em que entram os sufixos mistos da formação vernácula -iano e -iense, os quais são o resultado da combinação dos sufixos -ano e -ense com um i de origem analógica (baseado em palavras onde -ano e -ense estão precedidos de i pertencente ao tema: horaciano, italiano, duriense, flaviense, etc.): açoriano, cabo-verdiano, camoniano, goisiano («relativo a Damião de Góis»), sofocliano, torriano («de Torres Vedras»); siniense («de Sines»), torriense («de povoação chamada Torres»).
  4. Uniformizam-se com as terminações -io e -ia (átonas), em vez de -eo e -ea, os substantivos que constituem variações, obtidas por ampliação, de outros substantivos terminados em vogal: cúmio (popular), de cume; hástia, de haste; réstia, do antigo reste; véstia, de veste.
  5. Os verbos em -ear podem distinguir-se pràticamente, grande número de vezes, dos verbos em -iar, quer pela formação, quer pela conjugação e formação ao mesmo tempo. Estão no primeiro caso todos os verbos que se prendem a substantivos em -eio e -eia (sejam formados em português ou venham já do latim); assim se regulam: aldear, por aldeia; alhear, por alheio; cear, por ceia; encadear, por cadeia; idear, por ideia; pear, por peia; etc. Estão no segundo caso todos os verbos que têm normalmente flexões rizotónicas em -eio, -eias, etc., desde que não se liguem a substantivos com as terminações átonas -ia ou -io (como ansiar ou odiar): clarear, delinear, devanear, falsear, granjear, guerrear, hastear, nomear, semear, etc.
  6. Não é lícito o emprego de u final átono em palavras de origem latina. Escreve-se, por isso: moto, em vez de mótu (por exemplo, na expressão de moto próprio); tribo, em vez de tríbu.
  7. Os verbos em -oar distinguem-se pràticamente dos verbos em -uar pela sua conjugação nas formas rizotónicas, que têm sempre o na sílaba acentuada: abençoar, com o, como abençoo, abençoas, etc.; destoar, com o, como destoo, destoas, etc.

Base x

O verbo perguntar não admite na escrita corrente a mudança da sílaba per em pre: preguntar. E o mesmo se dá, por conseguinte, com quaisquer palavras dele formadas: pergunta, perguntador, perguntante, perguntão, reperguntar, e não pregunta, preguntador, preguntante, preguntão, repreguntar. Contudo, as formas preguntar, pregunta, etc., assim como outras (prèguntar, prègunta, etc.), todas eles meras representantes de variações fonéticas, podem ser registadas em vocabulários e dicionários, para informação dialectológica ou histórico-linguística.

Base xi

Consideram-se normais na escrita corrente as formas quer e requer, dos verbos querer e requerer, em vez de quere e requere: ele quer, ele o quer, ela requer, ela o requer, quer dizer, e não ele quere, ele o quere, ela requere, ela o requere, quere dizer. São legítimas, entretanto, as formas com e final, quando se combinam com o pronome enclítico o ou qualquer das suas flexões: quere-o, quere-os, requere-a, requere-as.

A forma quer transmite a sua grafia à conjugação a que deu origem e mantém-na, além disso, em todas as palavras compostas e locuções em que figura: quer … quer; bem-me-quer, malmequer; onde quer que, quem quer que.