Amanhã
AMANHÃ.
Amanhã! — é o sol que desponta,
É a aurora de roseo fulgor,
É a pomba que passa e que estampa
Leve sombra de um lago na flôr.
Amanhã! — é a folha orvalhada,
É a rola a carpir-se com dôr,
E da brisa o suspiro, — é das aves
Ledo canto, — é da fonte o frescor.
Amanhã! — são acasos da sorte;
O queixume, o prazer, o amor,
O triumpho que a vida nos doura,
Ou a morte de baço pallor.
Amanhã! — é o vento que ruge,
A procella d’horrendo fragor,
É a vida no peito mirrada,
Mal soltando um alento de dôr.
Amanhã! — é a folha pendida,
É a fonte sem meigo frescor,
São as aves sem canto, são bosques
Já sem folhas, e o sol sem calor.
Amanhã! — são acasos da sorte!
É a vida no seu amargor,
Amanhã! — o triumpho, ou a morte;
Amanhã! — o prazer, ou a dôr!
Amanhã! — que t’importa se existes?
Folga e ri de prazer e de amor;
Hoje o día nos cabe e nos toca,
De amanhã Deos sómente é Senhor!