As Doutoras/IV/X

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Personagens: OS MESMOS e LUÍSA

PRAXEDES — Se o chamado é para Luísa, não tens o direito de pregar uma mentira.

EULÁLIA — Mas eu não minto, senhor, nunca menti. Menos essa!

LUÍSA (Que tem entrado e está junto ao berço.) — O que é isto, Eulália?

EULÁLIA — E o senhor que está aqui a dizer que eu minto. A senhora algum dia apanhou-me em mentira?

LUÍSA — Mas o que foi?

PRAXEDES — Nada mais, nada menos, que um chamado para ti.

LUÍSA — Para mim?

EULÁLIA — Sim, senhora!

LUÍSA — Então vai já avisar meu marido!

EULÁLIA — Era o que eu ia fazer. Mas o patrão pôs-se aqui com uma lenga-lenga muito grande, e sem mais nem menos, zás! chimpa-me na bochecha: — Você é uma mentirosa! Ora, senhora, isto dói, é preciso confessar que dói muito, sim, porque, no fim de contas por mais baixa que seja uma pobre criatura de Deus...

LUÍSA — Está bem, vai chamar meu marido.

EULÁLIA — Se eu já tivesse sido apanhada em mentira.

LUÍSA — Tens razão.

EULÁLIA — Eu sou uma mulher honrada.

LUÍSA — Sim, sim.

EULÁLIA — Fique a patroa sabendo que no Porto rejeitei pro­postas muito vantajosas e não era cá meia dúzia de mequetrefes. Eram viscondes e barões, sujeitos apatacados. Se quisesse escorregar, senhora, podia estar hoje muito bem!

LUÍSA — Já sei, já sei, Eulália.

EULÁLIA — As injustiças doem.

LUÍSA — Sim, sim, sim; mas vai chamar teu amo! (Eulália sai resmungando.)