Através do Brasil/XXXVIII

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XXXVIII. UM PLANO

— Ah! — exclamou o coronel, interrompendo o rapaz sertanejo — então, não será difícil encontrá-los reunidos no tal rancho!

Juvêncio pensou, consigo mesmo: “Caiu no laço!...” E disse em voz alta:

— Creio que é quase certo! Pode pegá-los hoje mesmo!

— Bem! — disse o fazendeiro. — Já sei o que vou fazer! Vou mandar reunir uns doze homens decididos, — e você irá com eles, para lhes indicar o lugar.

— Mas, — exclamou o rapaz, fingindo-se aterrado — assegure-me a vida, por quem é! Estou pronto a ensinar o caminho, e a fazer tudo para que possa deitar a mão não só aos cavalos, mas também aos ladrões... Mas não me deixe desamparado, que eles são homens vingativos e rancorosos, e, se me pegam, estou morto!

— Não tenhas medo! Vais com a minha gente, e voltas com ela!

E gritou:

— Felipe!

Chegou imediatamente Felipe, a quem o coronel ordenou:

— Toma conta deste pequeno! És responsável por ele.

E saiu.

Ficando só com Juvêncio, Felipe olhou-o com certa desconfiança e ressentimento. Isso mortificou de novo o rapaz, que lhe perguntou, com voz triste:

— Tem filhos?

— Por que é que você me pergunta isso? Tinha um, que está no céu, há doze anos; e, antes assim! Antes morto do que vivo e ladrão de cavalos!

Juvêncio continuou:

— Ouça, Felipe! Tem sido bondoso comigo, e dói-me muito que me julgue ladrão. Pelo amor que teve ao seu filho, creia que sou inocente! Ainda, um dia há de saber que nunca fui ladrão!

— Sim? — perguntou Felipe, incrédulo — e que quer dizer o que você contou ao patrão?

— Estou buscando o meio de salvar-me. Que importa o meio que emprego, se com isso não faço mal a alguém? O que lhe peço, por tudo quanto possa haver de sagrado para o seu coração, é que não diga que menti ao coronel. Deixe-me ver se consigo sair desta aflição!

— Fique tranqüilo! Não sou homem capaz de fazer mal aos outros!

— Outra cousa! — acrescentou Juvêncio — peço-lhe que não vá, hoje, com os que vão fazer a diligência...

— Que diligência?

— A diligência dos que vão hoje partir à caça dos ladrões.

— Ah! Nunca faço parte dessas expedições: sou criado particular do coronel, e nunca saio de casa.

Juvêncio almoçou, e dormiu, à farta, até duas horas da tarde. Quando acordou, aproximou-se da janela gradeada do quarto, e viu que havia no terreiro um grande movimento de gente a quem o coronel dava ordens. Compreendeu que já se estava organizando a expedição. Veio sentar-se sobre o banco, e começou a refletir, assentando bem o seu plano, combinando bem os recursos de que podia lançar mão.

Daí a pouco entrava o fazendeiro:

— Está tudo pronto! Você jantará, e partirá imediatamente com os meus homens. São doze: quatro irão a cavalo, e os outros a pé; você irá na anca de um dos cavalos. A que distância fica o tal rancho?

— A três léguas mais ou menos.

— Então, é preciso não perder tempo. Saindo daqui às três e meia, podem estar lá às seis horas. Chegam, param a pequena distância, esperam que anoiteça, dão cêrco, e apanham a canalha. Mas veja bem! Tome tento no que lhe digo! Não procure fugir, não arme uma traição, não me queira enganar, porque, se o fizer, está perdido!