Cantigas de Martim Codax, presumido jogral do século XIII/Lições dos três manuscritos

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Em todos os três apógrafos, Cancioneiros da Vaticana, Colocci-Branculi e fôlha publicada por P. Vindel, se encontram divergências, mesmo esta última, por nalgumas partes se achar deteriorada pelo tempo, carece de ser completada por aqueles, no entanto a lição que nos ministra é superior à dos outros códices, dá-se todavia nela uma circunstância que atribuo a obediência às notas musicais, isto é, a 1.ª estrofe de tôdas as sete cantigas acha-se copiada defeituosamente, tendo o primeiro verso sòmente, na mesma linha, palavras que fazem parte do outro; fora de aí, a disposição é perfeita. Também a grafia aí adoptada é a castelhana, como se vê da representação do l e n molhados por ll e nn (hoje ñ) respectivamente, enquanto os outros códices usam lh e nh, à portuguesa, de-certo em harmonia com o original donde foram transcritos. Confrontando, pois, os três manuscritos, nota-se o seguinte[1]:

I. A lição de C. B. concorda com a de V., o C. V., em vez de e ay, tem cay em todo o estribilho, que só aparece escrito por inteiro na primeira estrofe nos apógrafos italianos, mas em tôdas em Vindel. É possível que a conjunção e, nele contida, a-pesar-de existir em todos os manuscritos, seja um acrescento, pois o sentido não a exige.

No verso 11, C. V. e C. B. toem mais que V. o artigo o antes da prop. por, artigo que excede a medida do verso e de certo o copista escreveu por analogia com o que se encontra em igual verso da precedente estrofe, onde é necessário. Enquanto aqueles dizem cuydado, emprega êste coidado, forma peculiar ao galego, que continua a mantê-la.

II. C. B. tem no 1.º verso mandadey..., mas a 2.ª estrofe diz:

Comigue mandado
E uë sane vyuo

isto é, o copista saltou para o 2.º verso da 3.ª estrofe, deixando portanto de escrever a 2.ª C. V. omite sempre, C. B. mantem só na 1.ª estrofe a conjunção e, que em V. precede hirey do estribilho; cabe aqui dizer o mesmo que na 1.ª cantiga.

III. Em C. V. e C. B. o 1.º verso tem disposição idêntica à seguida por V. em tôdas as estrofes, com excepção da 1.ª, em que ela foi alterada, segundo já ficou dito, os restantes, porém, estão escritos de modo que formam dois versos, com excepção das estrofes 3.ª e 4.ª cujos segundos versos C. B. dispõe como V. Enquanto C. V. diz madre meu (verso 11), e C. B. madro meu, tem V. madre o, a mais, nos versos 8 e 11, mia, antes de madre e escreve miraremos, isto é, não faz a assimilação do s ao l, e depois a sua simplificação, como é de uso. No mesmo os dísticos 3.º e 4.º estão invertidos, contrãriamente a C. V. e C. B., que seguem a ordem exigida pelo paralelo.

IV. Em vez de , (verso 8) e nó é (verso 13) de C. V. e C. B. tem V. nó ei. Do certo por lapso os copistas de C. V. e C. B. escreveram nélhas (verso 8, mas nulhas, verso 11), enquanto V. mantém a verdadeira forma.

V. O copista de C. V. trocou o t por c em treydes, mas só nos versos 2 e 5. Tanto êste apógrafo como C. B. teem ao (versos 5, 7 e 10), mas V. a lo. No 4.º verso aqueles dizem damar, mas êste damor.

VI. No 1.º verso teem C. V. e C. B. sagrade, mas V. sagrado en. No 4.º verso a lição é igual em todos, falta contudo uma sílaba para completar o verso e por isso substitui no por eno. C. V. e C. B. teem a mais que V. hu, no verso 7, antes de baylaua. Ao nunc ouuer (versos 8, 11, 13 e 16) de V. corresponde em C. V. e C. B. nunca (omitido porém, no verso 13 em C. V.) ouuera. O verso 17 em C. V. e C. B. diz ergas no uigo sagrado, mas em V. ergas en vigo no sagrado. Porque, a manter-s e a forma ergas, o verso ficaria com uma sílaba a mais, substitui-a pela mais vulgar: ergo.

Como na cantiga IIIª, os mesmos dísticos acham-se invertidos também em V.

VII. À grafia errada de C. V. no verso 5, uin uirar (em lugar destas duas palavras tem C. B. uma cruz) corresponde em V. uĩ mirar.

Notas[editar]

  1. Regulo-me por uma cópia manuscrita da edição de Vindel, que devo à gentileza do snr. Dr. Francisco Lopes Júnior, que à sua profissão de médico distinto, em Olhão, alia a de cultor invulgar da música e da fotografia. Por C. V. designo o Codice da Vaticana, como por C. B. e V., respectivamente, os manuscritos Colocci-Brancuti e Vindel.