A Divina Comédia (Xavier Pinheiro)/grafia atualizada/Purgatório/XXV: diferenças entre revisões

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Revisão das 19h54min de 10 de outubro de 2010

Subindo por estreita senda, do sexto ao sétimo e último compartimento, Dante pergunta a Virgílio como podem emagrecer as almas, que não precisam de alimento. Respondem-lhe Virgílio, antes, e depois Estácio. Este fala da geração do corpo do homem, da alma que nele Deus infunde, e da maneira de existência depois da morte. O compartimento no qual acabam de chegar está cheio de flamas, nas quais estão se purificando as almas dos luxuriosos.

Para subir o tempo nos urgia;
Meridiano ao Tauro o sol já dera,
Bem como a noite ao Scorpião cedia

Qual viajor, que o passo não modera,
Que em nada atenta e sempre segue avante,
Se em seu querer necessidade impera,

Nós penetramos no rochedo hiante,
Por escada estreitíssima subindo,
Que obriga um ir atrás outro adiante.

Da cegonha o filhinho, asas abrindo,
Por voar logo, encolhe-as e não tenta
Deixar o ninho, esforço não sentindo:

Tal o desejo em mim ferve e arrefenta
De perguntar chegando quase ao ato
De quem para dizer se experimenta.

O Mestre, sem parar, pressente o fato:
— &#0147;Tens da palavra o arco&#0148; — diz — &#0147;tendido,
Deixa a seta partir; não sê coato&#0147;. —

De confiança então já possuído,
Falei, — &#0147;Como é possível fique magro
Quem não precisa mais de ser nutrido?&#0148; —

— &#0147;Se recordaras&#0148; — torna — &#0147;Meleagro
Que, em ardendo um tição se consumia
Isso não fora de entender tão agro.

&#0147;Também de fácil crença te seria,
Se no espelho notaras que o teu rosto,
Segundo te movesses, se movia.

&#0147;Por dissipar-se a dúvida ao teu gosto,
Eis Estácio, a quem rogo fervoroso
Seja a dar-te o remédio bem disposto.&#0148; —

— &#0147;Se eu o eterno conselho explicar ouso&#0148;
— Disse Estácio — &#0147;quando és, Mestre, presente,
Ao teu querer me curvo respeitoso.

&#0147;Se, filho, o que eu disser guardas na mente,
Hás de ter — prosseguiu — &#0147;esclarecidas
Essas dúvidas tuas prontamente.

&#0147;Sangue puro, que as veias ressequidas
Não bebem, que de parte permanece
Quais viandas em mesas bem providas,

&#0147;Do coração tomou que lhe oferece
Virtude de que a forma aos membros veio,
Como o que às veias por fazê-los desce;

&#0147;Ainda, elaborado, desce ao seio
De canal que não digo; após, unido
Em vaso é natural com sangue alheio.

&#0147;É ali com outro confundido,
Paciente sendo um, sendo outro ativo,
Pela perfeita sede, em que há nascido.

&#0147;Trabalho então começa produtivo
Coagulando e depois vivificando
O condensado efeito primitivo:

&#0147;Em alma a força ativa se tornando,
Como em planta, é, no entanto, diferente:
Pára a planta, vai a alma caminhando.

&#0147;Prosseguindo, já move-se, já sente,
Como o fungo marinho; e logo emprende
Os sentidos, que em si tem qual semente.

&#0147;Ora contrai-se, filho, ora se estende
A força genetriz, do peito vinda,
Donde natura em todo o corpo entende.

&#0147;Mas, filho meu, não sabes certo ainda
Como a ser vem um ente cogitante:
É ponto em que um mais sábio no erro finda;

&#0147;Pois, na doutrina sua extravagante,
Distinto da alma fez o entendimento
Possível, não lhe vendo órgão bastante.

&#0147;Abre à luz da verdade o pensamento:
Vê que, no feto os órgãos em chegando
Do cérebro ao perfeito acabamento,

&#0147;O Primeiro Motor, ledo encarando
Da natureza tal primor, lhe inspira ,
Esp?rito, em que virtudes stão brilhando,

&#0147;E que ativo alimento dali tira
Para a própria substância; e alma se forma,
Que vive e sente e pensa e em si regira.

&#0147;Com meu dizer tua mente se conforma,
Notando que do sol calor em vinho,
Da uva ao sumo unido, se transforma.

&#0147;O esp?rito, se Laquésis não tem linho,
Deixa a carne e virtude, traz consigo
Dotes, que teve no corpóreo ninho.

&#0147;Sobem de ponto no valor antigo
A memória, a vontade, o entendimento,
Da mudez o mais fica no jazigo.

&#0147;Cai logo, de espontâneo movimento,
Por maravilha, numa ou noutra riba,
Onde há do rumo seu conhecimento.

&#0147;Vindo a lugar, que o circunscreva e iniba,
Da força informativa é rodeado,
Como em membros que a morte nos derriba.

&#0147;Bem como o ar de chuva carregado,
Se dos raios solares é ferido,
De cores várias mostra-se adornado,

&#0147;O ar vizinho assim fica inserido
Nessa forma, que desde logo amanha
Virtualmente o esp?rito ali contido;

&#0147;E semelhante ao fogo, que acompanha
Labareda, com ele se movendo,
Cada alma segue aquela forma estranha.

&#0147;Aparência de forma nela havendo
Sombra se chama; e, após, ela organiza
Sentidos, o da vista compreendendo.

&#0147;Fala, ri-se, ama, odeia ou simpatiza,
Exala dor, carpindo ou suspirando:
Neste monte já tens prova precisa.

&#0147;Segundo está sofrendo ou desejando,
Da alma também altera-se a figura:
Vê, pois, o que a magreza está causando.&#0148; —

Voltando à mão direita, da tortura
Entramos pela estância derradeira:
Então preocupou-nos outra cura.

Flamas brotava aqui a ribanceira,
Aura ativa da estrada respirava:
Subindo, as rechaçava subranceira.

Ao longe da árdua borda caminhava
Um por um: precipício temoroso
De um lado, e do outro o fogo eu receava.

Disse Virgílio: — &#0147;Aqui bem cauteloso
Deve aplicar aos olhos seus o freio
Quem não quiser dar passo perigoso.&#0148; —

Summae clementiae Deus stavam no seio
Do grande incêndio as almas entoando,
E de voltar-me o ardor então me veio.

Vi nas chamas espíritos andando:
Aos movimentos seus, aos meus estava
Atento, a vista a uns e a outros dando.

E quando aquele cântico findava
Virum non cognosco alto se ouvia,
E o cântico em tom baixo renovava.

E, terminando, o coro repetia:
&#0147;Diana expulsa da floresta Helice
Que o veneno de amor tragado havia.&#0148; —

Cantaram; cada qual como antes disse
Esposas e maridos, que hão guardado
A fé, que Deus mandou sempre os unisse:

Este modo há de ser, creio, alternado,
Enquanto os rodear a chama ardente:
A chaga por tal bálsamo e cuidado

Há de ser guarnecida finalmente.