Caramuru/IX: diferenças entre revisões
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<poem> |
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;I |
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Depois que o tempo torna bonançoso |
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E a noite vem tranqüila em branda calma, |
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De ouvir o mais do sonho portentoso |
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Se acende a todos o desejo n'alma; |
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E no empenho do belga belicoso, |
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Desejando escutar quem teve a palma, |
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Suplicam Catarina que prossiga |
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Na narração do sonho e tudo diga. |
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;II |
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"Vi (prossegue a matrona) em Marte duro |
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Confundir-se o Brasil, vagar potente |
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O batavo feroz, e o reino escuro |
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Encher Plutão da desditosa gente. |
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Vi descendo as milícias do céu puro |
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A plebe inerme com o zelo ardente |
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Infundir valor tal, que conte a história |
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Por milagre do céu cada vitória |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/260]]== |
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<poem> |
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;III |
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Petrid e Íolo, raios da marinha, |
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Com esquadra do pélago senhoras, |
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Qualquer do lado seu queimado tinha |
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Com chamas o Brasil desoladoras; |
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Petrid a frota que das Índias vinha |
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Com procelas de fogo abrasadoras, |
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E nas naus lavra, de tesouros cheias, |
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Ao infausto Brasil novas cadeias. |
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;IV |
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Máquina move o belga ambiciosas, |
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Suprindo os gastos com a imensa prata; |
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E, armando em guerra esquadras numerosas, |
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Ocupar Pernambuco ao luso trata: |
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Nem As forças da Holanda poderosas |
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Opõe o hispano, com a nova ingrata, |
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Tal socorro que a praça na contenda |
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Do grão-poder dos batavos defenda. |
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;V |
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Rege de Pernambuco a terra extensa |
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O intrépido Albuquerque, a tudo atento. |
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Guarnece a praça, os esquadrões condensa, |
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Dispõe ao fogo o bélico instrumento, |
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Quando à maneira de floresta densa |
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Se viu coberto o liquido elemento, |
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Onde proas setenta o mar rompiam, |
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E o Wandemburgo general seguiam. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/261]]== |
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<poem> |
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;VI |
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Chamam Pau amarelo um sitio ao lado |
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Da cidade que a frota acometia. |
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Cômodo ao desembarque e mal guardado |
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De Albuquerque, que as praias defendia: |
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Ali, com quatro legiões formado, |
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A bela Olinda o batavo se envia |
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Onde com turmas de inexperta gente |
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E opôs o luso chefe ao belga ardente. |
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;VII |
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Nem muito dura ao fogo desusado |
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O tímido esquadrão da gente lusa, |
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Que, do insólito horror preocupado, |
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A fuga empreende em multidão confusa: |
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Um sobre outro, ao fugir precipitado, |
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Render-se ao fero belga não recusa; |
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E, a cidade infeliz deixando aberta |
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Qualquer se salva donde mais o acerta. |
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;VIII |
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Entra o holandês na praça abandonada, |
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E quando de riqueza a cuidou cheia, |
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Em triste solidão desamparada, |
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E acha sem prêmio a cobiçosa idéia |
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Vingam nos templos a intenção malvada, |
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E o altar profanam com infâmia feia, |
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Tratando o pio rito e o santo culto |
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Com sacrílega mente e horrendo insulto. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/262]]== |
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<poem> |
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;IX |
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Mas não sofre da fuga o torpe medo |
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O valente fortíssimo Temudo; |
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E, tendo ao lado o intrépido Azevedo, |
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A espada empunha embaraçando o escudo. |
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Ao ser do saco no funesto enredo |
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A forma do holandês turbar-se em tudo, |
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Une alguns, que, odiando a vil fugida, |
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Dão por preço da glória a heróica vida. |
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;X |
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"Oh, disse, honra imortal do nome luso, |
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Corações valorosos, que em tal sorte |
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Fazeis da doce vida o melhor uso, |
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Comprando a glória com a invicta morte! |
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Vedes sem forma o batavo confuso, |
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Da valorosa espada exposta ao corte: |
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Corra-se às armas, que, se os não vencemos, |
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Sem a pátria vingar não morreremos." |
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;XI |
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Disse; e, empregando a fulminante espada, |
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Uma esquadra invadiu que discorria, |
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Com cálices da igreja profanada, |
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Que com insulto em derrisão metia; |
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De uns a fronte no chão deixou truncada, |
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De outros o peito com o ferro enfia, |
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De alguns, que insano acometendo freme, |
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Talhado o braço sobre a terra treme. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/263]]== |
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<poem> |
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;XII |
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Azevedo entre os mais, que no chão lança, |
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Tendo das balas empregado o impulso, |
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Com fero golpe de alabarda alcança |
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De Ruiter, que o acomete, o horrível pulso: |
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Despoja-o da arma e furioso avança, |
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Deixando-o em terra com tremor convulso, |
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Cornelisten derriba e o ferro emprega |
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Em Blá, que todo o chão com sangue rega. |
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;XIII |
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Com fúria igual e impulso destemido |
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Invade contra o batavo a caterva, |
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E, bem que a legião em corpo unido, |
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Em roda ao luso disparando ferva, |
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Resiste o português nunca rendido, |
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Enquanto a vida com vigor conserva, |
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Até que sobre 08 belgas derribados |
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Caíram mortos sim, porém vingados. |
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;XIV |
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Tem por nome Arrecife um forte posto, |
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Que um istmo separou do continente, |
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Donde o Castelo de S. Jorge oposto |
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Defende o passo ao transito iminente. |
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Ali fazia aos inimigos rosto |
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O bravo Lima, que do belga ardente, |
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Sem mais que trinta invictos defensores, |
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Trezentos sacrifica aos seus furores. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/264]]== |
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<poem> |
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;XV |
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Pasma de assombro Wandemburgo insano, |
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Nem pode crer, se o não convence a vista |
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Que com força tão pouca o lusitano |
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De dois mil belgas ao furor resista. |
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Sai com todo o poder e ocupa o plano, |
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E em forma regular tenta a conquista; |
|||
E nem assim o Lima ao fogo cede, |
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Enquanto auxilio ao general não pede. |
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;XVI |
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Recobrava-se entanto valorosa |
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Do primeiro terror a lusa gente, |
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Que. inexperta da pugna belicosa, |
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Cedera no improviso do acidente. |
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E, acompanhando em tropa numerosa |
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Do intrépido Albuquerque o ardor valente, |
|||
O belga usurpador pelas ribeiras |
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Cercaram com redutos e trincheiras. |
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;XVII |
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Plantam depois um forte acampamento, |
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Donde se insulte o batavo inimigo; |
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Nem deixavam que um só pudesse isento |
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Sair sem dano ao campo, ou sem perigo. |
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Cortam-lhe o passo, impedem-lhe o sustento, |
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Nem lhe concedem no terreno abrigo, |
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E, ocupando-lhe o giro dilatado, |
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O belga cercador deixam cercado. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/265]]== |
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<poem> |
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;XVIII |
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Dois mil dos seus guerreiros escolhidos |
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Contra Albuquerque Wandenburg avança; |
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Mas achavam os lusos prevenidos |
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Do seu valor na nobre confiança: |
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Caiam das trincheiras rebatidos |
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Do fogo os belgas, ou da espada e lança, |
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E, sem que combatendo a mais se arrojem, |
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Em desordem do campo à praça fogem. |
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;XIX |
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Com quatro companhias numa armada |
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Socorro de Lisboa recebendo, |
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Foi outra vez a tropa reforçada |
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Com gente e munições noutra de Oquendo: |
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Mil mosqueteiros, tropa exercitada, |
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No duro jogo de Mavorte horrendo, |
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S. Félice conduz mestre de guerra |
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Mas menos apto na que usava a terra. |
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;XX |
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Com socorro maior de Holanda armado |
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Contra Itamaracá corre o inimigo; |
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Duas vezes, porém, foi rechaçado |
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Com perda o belga para o noto abrigo |
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A Paraíba e Rio Grande enviado, |
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Mudava de lugar, não de perigo; |
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E, já menos bisonha a lusa topa, |
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Põe em fuga o holandês, se em campo o topa. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/266]]== |
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<poem> |
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;XXI |
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A Wandemburgo no holandês império |
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Sucedera Rimbach em guerras noto, |
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Que. estimando dos belgas vitupério |
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Ser cada dia pelos nossos roto, |
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Enquanto celebrava atento e sério |
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A páscoa o campo em procissão devoto, |
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Com todo o poder batavo acomete, |
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E o campo em confusão, batendo, mete. |
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;XXII |
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Não se interrompe a cerimônia augusta; |
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Orando o clero com o sexo pio, |
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Sai o ortodoxo conta a turma injusta, |
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Tomando por sagrado o desafio; |
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E, fundando no céu confiança justa, |
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Pelejam com tal fé, com tanto brio, |
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Que. matando Rimbach em feio estrago, |
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Deram aos belgas da blasfêmia o pago. |
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;XXIII |
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Mas o céu, que o flagelo destinava, |
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Poder tão grande aos batavos concede, |
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Que nada a Vandescop, que os moderava, |
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Depois desta campanha o curso impede. |
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Fica Itamaracá de Holanda escrava, |
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Desfaz-se o campo, a Paraíba cede, |
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Perde-se o Rio Grande, e noutra empresa |
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Rende o luso o Pontal e a Fortaleza. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/267]]== |
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<poem> |
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;XXIV |
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Salva-se o resto, da facção perdida |
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Nas Alagoas, sítio defensável, |
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Onde, de fero belga perseguida, |
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Asilo busca a turba miserável. |
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Mas foi da Espanha em breve socorrida |
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Com brava tropa em frota respeitável; |
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Rosas de Borja, a Pernambuco enviado, |
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De Albuquerque o bastão tomou deixado. |
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;XXV |
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Roxas, pronto no obrar, posto em batalha, |
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De Vandescop as tropas investia; |
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Mas o belga Arquichofe a marcha atalha |
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Com socorro que válido trazia |
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Com tenebrosa sombra os lutos talha |
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A noite, que começa, à morte impia, |
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Dispondo Roxas em defesa armado |
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Esperar o socorro convocado. |
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;XXVI |
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Mas, logo que a manhã mostrou formosa |
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Da batalha inimiga a forma unida, |
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Mais não sossega a chama generosa, |
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E investe ardente a batava partida: |
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Cobre os céus a fumaça tenebrosa, |
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Perde o hispano e o holandês na empresa a vida, |
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E nem este, nem o outro ali vencera, |
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Se o temerário Roxas não morrera. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/268]]== |
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<poem> |
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;XXVII |
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S. Félice, na guerra mestre astuto, |
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Sucede no governo ao bravo hispano, |
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E brasílico Fábio entanto luto |
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Salvou na retirada o lusitano. |
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Foi das palmas batávicas produto |
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Governar o país pernambucano |
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O conde de Nassau, que o belga envia, |
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General das conquistas que emprendia. |
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;XXVIII |
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Era Nassau nas armas celebrado, |
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Com que ilustrava o excelso nascimento, |
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Príncipe então no império respeitado, |
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Nutrindo igual ao sangue o pensamento |
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Entrou de forte armada acompanhado, |
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E, no Arrecife situado o assento, |
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Levantou fortes, e em países belos |
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Guarneceu as colônias com castelos. |
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;XXIX |
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Mas, aspirando a empresa memorável, |
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Todo o exército e armada prevenia, |
|||
E, achando Pernambuco defensável, |
|||
Invadiu no recôncavo a Bahia. |
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S. Félice com resto miserável |
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Ali novo socorro ao rei pedia, |
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Quando ao bravo Nassau dispunha a sorte |
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Um chefe nele opor prudente e forte |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/269]]== |
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<poem> |
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;XXX |
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Tudo dispunha o conde em forma e arte |
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De rebater do batavo a interpresa, |
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Dispõe pela cidade em toda a parte |
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Os meios e instrumentos da defesa; |
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Faz grossas levas e esquadrões reparte, |
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E, tudo preparando à forte empresa, |
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Nada esqueceu de quanto na milícia |
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Inventa a militar sábia perícia. |
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;XXXI |
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Entrava entanto pela vasta enseada |
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Nassau, que as praias enche da Bahia |
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Com a terrível majestosa armada |
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Que com quarenta naus linha fazia; |
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E, ao som da trompa marcial tocada |
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Em gratos ecos de hórrida harmonia, |
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Enche a horrenda procela em tais ensaios |
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A enseada de trovões e o céu de raios. |
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;XXXII |
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Entanto o claro Silva, que ocupava |
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Do supremo governo o excelso mando, |
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A S. Félice o posto renunciava, |
|||
Ficando por soldado ao seu comando. |
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Heróica ação, que pela pátria obrava, |
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Maior perícia em outrem confessando, |
|||
E merecendo nela em tanta empresa |
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Da corte aclamações, do rei grandeza . |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/270]]== |
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<poem> |
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;XXXIII |
|||
Desembarca Nassau com turba ingente |
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Junto de Tapagipe, e empreende o oiteiro |
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Que nomear costuma a vulgar gente |
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Do antigo habitador Padre Ribeiro. |
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Mas S. Félice, que o anteviu prudente, |
|||
De posto o bate, que ocupou primeiro; |
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E, depois que seiscentos destro mata, |
|||
Em grande parte o belga desbarata. |
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;XXXIV |
|||
Largos dias Nassau bate a trincheira, |
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Que lhe opôs ao quartel Banholo à frente; |
|||
Mas o belga em batalha verdadeira |
|||
Por muitos dias se avançava ardente. |
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Cobre-se a terra em hórrida maneira |
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De um monte de cadáveres ingente, |
|||
Vendo os belgas cair, sem que desista |
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Nassau com tanto sangue da conquista. |
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;XXXV |
|||
E já desfeito o exército se via, |
|||
Ferido o oficial, e a gente morta, |
|||
Sem que cessasse o ardor nos da Bahia, |
|||
Que o S. Félice rege e o Silva exorta. |
|||
Pede tréguas Nassau nesta porfia, |
|||
E tudo com a tropa as naus transporta, |
|||
Fugindo do perigo o infausto efeito. |
|||
Com perda igual de gente e de conceito. |
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</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/271]]== |
|||
<poem> |
|||
;XXXVI |
|||
Dois dias na enseada por vingança |
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Bate a esquadra a cidade sem perigo, |
|||
Com balas e granadas, que em vão lança, |
|||
Parecendo mais salva que castigo. |
|||
Sobreveio ao Brasil nova esperança |
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De expugnar com mais forças o inimigo; |
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Mas foi o efeito das promessas vário, |
|||
Impedindo o socorro o mar contrário. |
|||
;XXXVII |
|||
Vi neste tempo em confusão pasmosa |
|||
A monarquia em Lísia dominante, |
|||
E a casa de Bragança gloriosa |
|||
Nos quatro impérios triunfar reinante, |
|||
A Bahia com pompa majestosa |
|||
Festejar o monarca triunfante, |
|||
E o Pernambuco, de desgraças farto, |
|||
Invocar pai da pátria D. João Quarto. |
|||
;XXXVIII |
|||
Tratava o novo rei com fé provada |
|||
A batávica paz, que sem justiça |
|||
Deixava ao mesmo tempo quebrantada |
|||
O belga injusto pela vil cobiça . |
|||
Ocupa o Maranhão batava armada, |
|||
E outra esquadra em Sergipe o incêndio atiça, |
|||
Pretendendo ocupar com falso engano |
|||
Toda África e Brasil ao lusitano. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/272]]== |
|||
<poem> |
|||
;XXXIX |
|||
Cede do seu governo de afrontado |
|||
O general Nassau, tornando à Holanda, |
|||
Tendo o conselho do Arrecife armado |
|||
Mil artifícios de calúnia infanda. |
|||
Nem contra os habitantes moderado |
|||
O duro freio no governo abranda, |
|||
Onde a plebe agravada que o experimenta |
|||
O Jugo sacudir com glória intenta. |
|||
;XL |
|||
João Fernandes Vieira foi na empresa |
|||
O instrumento da pátria liberdade, |
|||
Herói que soube usar da grã-riqueza, |
|||
Libertando o Brasil desta impiedade. |
|||
De amigos e parentes na defesa |
|||
Tentou furtivamente a sociedade, |
|||
E como a pedra a estátua de Nabuco. |
|||
O belga derribou de Pernambuco. |
|||
;XLI |
|||
Nomeou cabos, tropas, companhias, |
|||
Pediu socorros e invocou prudente, |
|||
Expondo do holandês as tiranias, |
|||
O governo brasílico potente. |
|||
Avisa sem demora Henrique Dias , |
|||
Capitão dos etíopes valente, |
|||
E o forte Camarão, que em guerra tanta |
|||
Com os seus carijós o belga espanta. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/273]]== |
|||
<poem> |
|||
;XLII |
|||
Ouse o holandês com susto o movimento; |
|||
E, querendo oprimir nascente a chama, |
|||
Com dois mil homens prevenia atento |
|||
A nova guerra que o Vieira inflama. |
|||
Deixara o luso chefe o alojamento, |
|||
E os belgas, que à cilada oculto chama, |
|||
Empenhou de um lugar nas duras rocas, |
|||
A que o monte chamaram das Tabocas. |
|||
;XLIII |
|||
Entre arbustos e canas de improviso |
|||
Dispara o luso sobre a incauta gente, |
|||
E, precedendo o dano antes do aviso, |
|||
Desbarata o holandês com fúria ardente. |
|||
Suspende a marcha o batavo indeciso, |
|||
E, sem ver o inimigo, o golpe sente, |
|||
Até que, vendo o estrago dos soldados, |
|||
Cedem o campo e fogem destroçados |
|||
;XLIV |
|||
Holanda era potente e o luso aflito, |
|||
Onde enchendo Lisboa de ameaças, |
|||
Por ter notícia do infeliz conflito, |
|||
Meditava ao Brasil novas desgraças. |
|||
Mas, por guardar os seus, o rei invicto |
|||
Dispôs piedoso nas providências lassas |
|||
Providências que à paz chamar pudessem |
|||
O tumulto em que os nossos permanecem. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/274]]== |
|||
<poem> |
|||
;XLV |
|||
Vão com dois regimentos destacados |
|||
O moreno e o negreiros da Bahia |
|||
A dar paz (se é possível) destinados |
|||
Na guerra que o Vieira então movia. |
|||
Vieram veigas e Campos abrasados, |
|||
E o colono infeliz, que perecia, |
|||
Com lastima da tropa, que observara, |
|||
Todo o estrago que o belga ali causara. |
|||
;XLVI |
|||
Avistado o Negreiros e o Vieira |
|||
"Venho (disse o primeiro) a prisão dar vos, |
|||
Por haver provocado a ira estrangeira |
|||
A uma guerra que acabe de assolar-vos." |
|||
"É justo que eu também prender-vos queira; |
|||
Mas será (disse o herói) com abraçar-vos." |
|||
E, assim dizendo, alegre move o passo, |
|||
E os dois recebe com festivo abraço. |
|||
;XLVII |
|||
Outro tanto fazia a tropa unida |
|||
Ao invicto esquadrão pernambucano; |
|||
E, aplaudindo a vitória conseguida, |
|||
Detestam do holandês o enorme engano. |
|||
Nem muito tarda a gente fementida |
|||
Que não abrase ao lusitano, |
|||
Onde embarcado pela paz chegara, |
|||
Com o batavo próprio o convidara. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/275]]== |
|||
<poem> |
|||
;XLVIII |
|||
Ouvem-se entanto os míseros clamores |
|||
De turba feminina, que invocava |
|||
O socorro dos seus libertadores |
|||
Contra o belga cruel que a cativava. |
|||
Mas não cessa o Vieira e sem rumores |
|||
O engenho, aonde incauto descansava |
|||
O belga general cercado, bate, |
|||
E, rendendo-o à prisão, vence o combate. |
|||
;XLIX |
|||
Henrique Huss, no Arrecife comandante, |
|||
Era o cabo dos belgas prisioneiro, |
|||
Blac rendido também, chefe importante, |
|||
Subalterno nas armas do primeiro. |
|||
Foge do luso o batavo arrogante, |
|||
Espalhando fuzis no grão-terreiro, |
|||
E a chama teme que no horrendo empenho |
|||
Lançara o Vieira pelo vasto engenho. |
|||
;L |
|||
Com fama de vitória tão brilhante |
|||
Toma as armas a plebe e o belga invade; |
|||
Serenhaem tomou, vila possante, |
|||
O partido comum da liberdade. |
|||
Segue Itaramaracá com fé constante, |
|||
Porto Calvo e os contornos da cidade, |
|||
Deixando no Arrecife sem remédio |
|||
Encerrado o holandês com duro assédio, |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/276]]== |
|||
<poem> |
|||
;LI |
|||
Mas não cessa na Holanda a companhia, |
|||
E ao numeroso exército que ordena, |
|||
Segismundo Van-Scop por chefe envia, |
|||
Munido em guerra de potência plena; |
|||
Do experto general, que desconfia |
|||
O prêmio valoroso, do fraco apena, |
|||
E empreendendo com forças o combate, |
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O inimigo Vieira ou prenda, ou mate. |
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;LII |
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Abordando o Arrecife então cercado, |
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A inércia dos seus chefes repreende; |
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Nem muito tarda que no campo armado |
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Não saia a Olinda, que expugnar emprende. |
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Em assalto a acomete duplicado, |
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E a brava tropa, que ao presídio atende, |
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Com tanto alento o batavo rechaça, |
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Que ferido Van-Scop se acolhe à praça. |
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;LIII |
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Sem que desista da passada instância, |
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Tenta de novo a empresa da Bahia; |
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Mas, notando nos lusos a constância, |
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Que injúria do poder lhe parecia, |
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Consome do Recôncavo a abundância |
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Com freqüentes sortidas, que emprendia, |
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E, porque cresça na cidade o tédio, |
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Ocupa Taparica e põe-lhe o assédio. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/277]]== |
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<poem> |
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;LIV |
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Teles entanto, que expulsar pretende |
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Sem igual força o batavo contrário, |
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Contra o comum conselho o ataque emprende, |
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E tudo expõe no impulso temerário |
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Mas, vendo o luso rei que a nada atende |
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O belga nos seus pactos sempre vário, |
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Manda armada ao Brasil, que poderosa |
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A batava nação dome orgulhosa. |
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;LV |
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Teme o golpe Van-Scop e desampara, |
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Por guardar o Arrecife, Taparica, |
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Antevendo que a esquadra se prepara |
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Contra a praça, que auxílio lhe suplica. |
|||
Barreto de Menezes, que chegara |
|||
De novo general patente indica, |
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E em Pernambuco sublimado ao mando |
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Com prudência e valor foi governando. |
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;LVI |
|||
Nove mil homens, tropa valorosa, |
|||
E com freqüentes palmas veterana, |
|||
Manda o batavo a empresa perigosa, |
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Que à guerra ponha fim pernambucana. |
|||
Ocupa o mar armada poderosa, |
|||
E, dominando a praia americana, |
|||
Usurpa em mar e terra alto domínio, |
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Ameaçando dos lusos o extermínio. |
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</poem> |
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==[[Página:Caramuru 1781.djvu/278]]== |
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<poem> |
|||
;LVII |
|||
Põe-se em campanha o batavo terrível, |
|||
Com sete mil de veterana tropa; |
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Vão densos bandos de gentio horrível, |
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Com destro gastador vindo da Europa; |
|||
E, estimando a potência irresistível, |
|||
Cende ao belga a Barreta e quanto topa , |
|||
Enquanto em defensiva o luso fica, |
|||
E o campo contra o belga fortifica. |
|||
;LVIII |
|||
Segismundo, porém, que os bastimentos |
|||
Em Moribeca assegurar procura, |
|||
Dispunha ali tomar alojamentos, |
|||
Estimando a vitória já segura. |
|||
Mas Barreto e Vieira a tudo atentos, |
|||
Na justiça, que a causa lhe assegura, |
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Confiam que na empresa o céu lhe valha, |
|||
E tudo vão dispondo a uma batalha. |
|||
;LIX |
|||
Nem com tanto poder Van-Scop recusa |
|||
Decidir numa ação toda a contenda, |
|||
Antevendo, se a perde a gente lusa, |
|||
Que outra força não tem que a guerra emprenda; |
|||
E já na marcha a multidão confusa |
|||
A ação começa pelo fogo horrenda, |
|||
E, turbando dos belgas toda a forma, |
|||
Combatem com valor, porém sem norma. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/279]]== |
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<poem> |
|||
;LX |
|||
Nos montes Guararapes se alojava |
|||
Formando o português, que o belga espera; |
|||
E a escaramuça, que emprendera brava, |
|||
Traz a sítio o holandês, que adverso lhe era; |
|||
Desde alto monte o luso fogo obrava, |
|||
Com ruína dos batavos tão fera, |
|||
Que, ou seja ao lado, ou na espaçosa fronte, |
|||
Se cobriu de cadáveres o monte. |
|||
;LXI |
|||
Reúne os batalhões Van-Scop irado, |
|||
E à frente com valor da linha posto |
|||
Tenta desalojar do alto ocupado |
|||
O invicto Camarão, que lhe faz rosto; |
|||
Mas, com chuva de balas rechaçado, |
|||
Perde três vezes o ganhado posto, |
|||
E já ferido com mil mortos cede, |
|||
Em vil fuga, que a noite lhe concede. |
|||
;LXII |
|||
Noventa dos seus perde o lusitano; |
|||
E enquanto o belga se retira incerto, |
|||
Descobre a aurora todo o monte e plano |
|||
De bandeiras, canhões, e armas coberto. |
|||
Muitos ali do batavo tirano, |
|||
Perdidos pela noite em campo aberto, |
|||
Deixa o dia, inexpertos nos roteiros, |
|||
Nas mãos da nossa tropa prisioneiros. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/280]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXIII |
|||
Horroriza-se Holanda, pasma Europa, |
|||
Exalta Portugal, canta a Bahia, |
|||
Vendo-se triunfar tão pouca tropa |
|||
Da terrível potência que a invadia. |
|||
Nada de humano o pensamento topa, |
|||
Que em tudo a mão de Deus clara se via, |
|||
Pois sempre elege para os seus portentos |
|||
Os mais fracos e humildes instrumentos. |
|||
;LXIV |
|||
Tinha exausta a ambição, mas não cansada |
|||
A cobiçosa Holanda em tal conquista; |
|||
E, para novo empenho aparelhada, |
|||
Escolhe os capitães e a gente alista; |
|||
Mas do Britano às armas provocada, |
|||
Sobre interesse que mais alto avista, |
|||
Suspende influxo na famosa empresa, |
|||
Deixando em Pernambuco a guerra acesa. |
|||
;LXV |
|||
Brinca este tempo, coronel valente, |
|||
Impetra de Van-Scop tropa luzida, |
|||
Com petrechos e número potente, |
|||
Que em batalha cruel toda decida. |
|||
Cinco mil homens de escolhida gente, |
|||
De canhões, e petrechos guarnecida, |
|||
Põe no campo assombrado da potência, |
|||
Igualando o valor coa diligência. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/281]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXVI |
|||
Com dois mil e seiscentos veteranos |
|||
Fez-lhe frente Barreto e o belga invade; |
|||
Correm de toda a parte os lusitanos |
|||
A sustentar a pátria liberdade. |
|||
Aloja o luso sobre os mesmos planos |
|||
Onde fora passada a mortandade; |
|||
O belga na montanha se distingue, |
|||
Um que estrago renove, outro que o vingue. |
|||
;LXVII |
|||
Mas Brinc, a tudo atento desde o cume, |
|||
Com perícia guerreira ocupa o monte, |
|||
Onde, seguindo o militar costume, |
|||
Dá forma à retaguarda e ordena à fronte; |
|||
Nem tão ousado o português presume, |
|||
Que em vantajoso posto o belga afronte, |
|||
Esperando a ocasião dali oportuna |
|||
De poder atacar com mais fortuna. |
|||
;LXV |
|||
Reconhece Barreto o sítio e forma, |
|||
E, vendo o ardor da lusitana gente, |
|||
Que, hábil no passo, da subida o informa, |
|||
Faz que o bravo Vieira ataque ardente; |
|||
E, cobrindo a invasão com sábia norma, |
|||
Com o fogo protege o assalto ingente, |
|||
Até que por mil casos duvidosos |
|||
Vê sobre o monte os campeões briosos. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/282]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXIX |
|||
Nova batalha ali com fogo vivo |
|||
Move impávido o belga e firme insiste; |
|||
E, por mais que o Vieira invada ativo, |
|||
Onde um corpo vacila, outro resiste. |
|||
Tal há que ainda combate semi-vivo; |
|||
Tal que, cadáver já na morte triste, |
|||
A terra morde e em raiva enfurecida, |
|||
Blasfemando do céu, despede a vida. |
|||
;LXX |
|||
A toda a parte voa o grão-Barreto, |
|||
E um anima, outro ajuda, outros exorta; |
|||
E, excitando no luso o pátrio afeto, |
|||
Incita o fone, o inválido conforta. |
|||
Bramava o fero Brinc em sangue infecto, |
|||
Entre a batava turba opressa e morta; |
|||
Assalta horrendo um batalhão potente, |
|||
E outros reprime com ferócia ardente. |
|||
;LXXI |
|||
Mas o invencível Camarão, que o nota, |
|||
Um forte troço da reserva abala; |
|||
E, suspendendo a misera derrota, |
|||
Lança o belga por terra de uma bala. |
|||
Logo o almirante da soberba frota, |
|||
Vendo invadido Brinc cair sem fala, |
|||
Ocupa o mando, que já vago estima, |
|||
E o batavo à peleja altivo anima. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/283]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXXII |
|||
Não sofre Henrique Dias, que observava |
|||
Do novo chefe a intimação constante; |
|||
E de um tiro, que fero lhe apontava, |
|||
Derriba morto o intrépido almirante. |
|||
Sem comandante, o belga trepidava, |
|||
E, de um e de outro lado vacilante, |
|||
Uma vil fuga tímido declara, |
|||
E o campo com desordem desampara. |
|||
;LXXIII |
|||
O estandarte soberbo dos Estados, |
|||
Tendas, peças, bandeiras numerosas, |
|||
Mil e trezentos mortos numerados, |
|||
Prisioneiros, bagagens preciosas, |
|||
Muitos centos na fuga degolados, |
|||
A caixa militar, armas custosas, |
|||
Foram, nesta ocasião, de tanta glória, |
|||
O merecido prêmio da vitória. |
|||
;LXXIV |
|||
Cinge o Arrecife de um assédio estreito |
|||
Com pronta cura o chefe lusitano; |
|||
Mas, tendo longa guerra o belga feito, |
|||
Era contínuo sim, mas mútuo o dano; |
|||
Até que Jacques ao comando eleito |
|||
No campo se avistou pernambucano. |
|||
Conduzindo em fortuita derrota |
|||
Para o luso comércio a usada frota. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/284]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXXV |
|||
Por mar e terra sitiada a praça, |
|||
Depois do longo assédio de nove anos, |
|||
Com mil desastres fatigada e lassa, |
|||
Cedeu todo o Brasil aos lusitanos: |
|||
Mercê clara do céu, patente graça, |
|||
Que a tão poucos e míseros paisanos |
|||
Cedesse uma nação que enchia em guerra |
|||
De armadas todo o mar, de espanto a terra. |
|||
;LXXVI |
|||
Assim modera o Padre Onipotente |
|||
Do ignorante mortal a incerta sorte, |
|||
Por fazer com tais casos evidente |
|||
Que não é quem mais pode o que é mais forte. |
|||
Tudo rege na terra a mão potente; |
|||
Dele a vitória pende, a vida, a morte; |
|||
E, sem o seu favor, que o distribui, |
|||
Todo o humano poder nada conclui. |
|||
;LXXVII |
|||
Triunfou Portugal; mas, castigado, |
|||
Teve em tal permissão severo ensino, |
|||
Que só se logrará feliz reinado, |
|||
Honrando os reis da terra ao rei divino; |
|||
E que o Brasil aos lusos confiado |
|||
Será, cumprindo os fins do alto destino, |
|||
Instrumento talvez neste hemisfério |
|||
De recobrar no mundo o antigo império. |
|||
</poem> |
|||
==[[Página:Caramuru 1781.djvu/285]]== |
|||
<poem> |
|||
;LXXVIII |
|||
Vi ne sonho mil casos diferentes, |
|||
Que no curso virão de outras idades. |
|||
Vi províncias notáveis e potentes, |
|||
Vi nascer no Brasil áureas cidades; |
|||
Famosos vice-reis e ilustres gentes, |
|||
Tantos sucessos, tantas variedades, |
|||
Que somente pintado, como em sombra, |
|||
Confunde o pensamento, a vista assombra. |
|||
;LXXIX |
|||
Prelados vi de excelsa jerarquia, |
|||
E entre outros da maior celebridade |
|||
O claro Lemos, que enriqueça um dia |
|||
De novas ciências a universidade: |
|||
Ele ornará depois a academia |
|||
Com construções de excelsa majestade, |
|||
E em doutrina a fará com sábio modo |
|||
O Ateneu mais famoso do orbe todo." |
|||
;LXXXX |
|||
Deu Catarina fim, e arrebatada |
|||
Num êxtase ficou, vibrando ardores; |
|||
Corriam pela face em luz banhada |
|||
Lágrimas belas, como orvalho em flores. |
|||
Fica a pia assembléia esperançada |
|||
De outros sucessos escutar maiores; |
|||
E, dando tempo ao sono milagroso, |
|||
No abraço a deixam do celeste esposo. |
|||
</poem> |
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[[Categoria:Caramuru]] |
Revisão das 15h25min de 2 de janeiro de 2016
- I
Depois que o tempo torna bonançoso
E a noite vem tranqüila em branda calma,
De ouvir o mais do sonho portentoso
Se acende a todos o desejo n'alma;
E no empenho do belga belicoso,
Desejando escutar quem teve a palma,
Suplicam Catarina que prossiga
Na narração do sonho e tudo diga.
- II
"Vi (prossegue a matrona) em Marte duro
Confundir-se o Brasil, vagar potente
O batavo feroz, e o reino escuro
Encher Plutão da desditosa gente.
Vi descendo as milícias do céu puro
A plebe inerme com o zelo ardente
Infundir valor tal, que conte a história
Por milagre do céu cada vitória
- III
Petrid e Íolo, raios da marinha,
Com esquadra do pélago senhoras,
Qualquer do lado seu queimado tinha
Com chamas o Brasil desoladoras;
Petrid a frota que das Índias vinha
Com procelas de fogo abrasadoras,
E nas naus lavra, de tesouros cheias,
Ao infausto Brasil novas cadeias.
- IV
Máquina move o belga ambiciosas,
Suprindo os gastos com a imensa prata;
E, armando em guerra esquadras numerosas,
Ocupar Pernambuco ao luso trata:
Nem As forças da Holanda poderosas
Opõe o hispano, com a nova ingrata,
Tal socorro que a praça na contenda
Do grão-poder dos batavos defenda.
- V
Rege de Pernambuco a terra extensa
O intrépido Albuquerque, a tudo atento.
Guarnece a praça, os esquadrões condensa,
Dispõe ao fogo o bélico instrumento,
Quando à maneira de floresta densa
Se viu coberto o liquido elemento,
Onde proas setenta o mar rompiam,
E o Wandemburgo general seguiam.
- VI
Chamam Pau amarelo um sitio ao lado
Da cidade que a frota acometia.
Cômodo ao desembarque e mal guardado
De Albuquerque, que as praias defendia:
Ali, com quatro legiões formado,
A bela Olinda o batavo se envia
Onde com turmas de inexperta gente
E opôs o luso chefe ao belga ardente.
- VII
Nem muito dura ao fogo desusado
O tímido esquadrão da gente lusa,
Que, do insólito horror preocupado,
A fuga empreende em multidão confusa:
Um sobre outro, ao fugir precipitado,
Render-se ao fero belga não recusa;
E, a cidade infeliz deixando aberta
Qualquer se salva donde mais o acerta.
- VIII
Entra o holandês na praça abandonada,
E quando de riqueza a cuidou cheia,
Em triste solidão desamparada,
E acha sem prêmio a cobiçosa idéia
Vingam nos templos a intenção malvada,
E o altar profanam com infâmia feia,
Tratando o pio rito e o santo culto
Com sacrílega mente e horrendo insulto.
- IX
Mas não sofre da fuga o torpe medo
O valente fortíssimo Temudo;
E, tendo ao lado o intrépido Azevedo,
A espada empunha embaraçando o escudo.
Ao ser do saco no funesto enredo
A forma do holandês turbar-se em tudo,
Une alguns, que, odiando a vil fugida,
Dão por preço da glória a heróica vida.
- X
"Oh, disse, honra imortal do nome luso,
Corações valorosos, que em tal sorte
Fazeis da doce vida o melhor uso,
Comprando a glória com a invicta morte!
Vedes sem forma o batavo confuso,
Da valorosa espada exposta ao corte:
Corra-se às armas, que, se os não vencemos,
Sem a pátria vingar não morreremos."
- XI
Disse; e, empregando a fulminante espada,
Uma esquadra invadiu que discorria,
Com cálices da igreja profanada,
Que com insulto em derrisão metia;
De uns a fronte no chão deixou truncada,
De outros o peito com o ferro enfia,
De alguns, que insano acometendo freme,
Talhado o braço sobre a terra treme.
- XII
Azevedo entre os mais, que no chão lança,
Tendo das balas empregado o impulso,
Com fero golpe de alabarda alcança
De Ruiter, que o acomete, o horrível pulso:
Despoja-o da arma e furioso avança,
Deixando-o em terra com tremor convulso,
Cornelisten derriba e o ferro emprega
Em Blá, que todo o chão com sangue rega.
- XIII
Com fúria igual e impulso destemido
Invade contra o batavo a caterva,
E, bem que a legião em corpo unido,
Em roda ao luso disparando ferva,
Resiste o português nunca rendido,
Enquanto a vida com vigor conserva,
Até que sobre 08 belgas derribados
Caíram mortos sim, porém vingados.
- XIV
Tem por nome Arrecife um forte posto,
Que um istmo separou do continente,
Donde o Castelo de S. Jorge oposto
Defende o passo ao transito iminente.
Ali fazia aos inimigos rosto
O bravo Lima, que do belga ardente,
Sem mais que trinta invictos defensores,
Trezentos sacrifica aos seus furores.
- XV
Pasma de assombro Wandemburgo insano,
Nem pode crer, se o não convence a vista
Que com força tão pouca o lusitano
De dois mil belgas ao furor resista.
Sai com todo o poder e ocupa o plano,
E em forma regular tenta a conquista;
E nem assim o Lima ao fogo cede,
Enquanto auxilio ao general não pede.
- XVI
Recobrava-se entanto valorosa
Do primeiro terror a lusa gente,
Que. inexperta da pugna belicosa,
Cedera no improviso do acidente.
E, acompanhando em tropa numerosa
Do intrépido Albuquerque o ardor valente,
O belga usurpador pelas ribeiras
Cercaram com redutos e trincheiras.
- XVII
Plantam depois um forte acampamento,
Donde se insulte o batavo inimigo;
Nem deixavam que um só pudesse isento
Sair sem dano ao campo, ou sem perigo.
Cortam-lhe o passo, impedem-lhe o sustento,
Nem lhe concedem no terreno abrigo,
E, ocupando-lhe o giro dilatado,
O belga cercador deixam cercado.
- XVIII
Dois mil dos seus guerreiros escolhidos
Contra Albuquerque Wandenburg avança;
Mas achavam os lusos prevenidos
Do seu valor na nobre confiança:
Caiam das trincheiras rebatidos
Do fogo os belgas, ou da espada e lança,
E, sem que combatendo a mais se arrojem,
Em desordem do campo à praça fogem.
- XIX
Com quatro companhias numa armada
Socorro de Lisboa recebendo,
Foi outra vez a tropa reforçada
Com gente e munições noutra de Oquendo:
Mil mosqueteiros, tropa exercitada,
No duro jogo de Mavorte horrendo,
S. Félice conduz mestre de guerra
Mas menos apto na que usava a terra.
- XX
Com socorro maior de Holanda armado
Contra Itamaracá corre o inimigo;
Duas vezes, porém, foi rechaçado
Com perda o belga para o noto abrigo
A Paraíba e Rio Grande enviado,
Mudava de lugar, não de perigo;
E, já menos bisonha a lusa topa,
Põe em fuga o holandês, se em campo o topa.
- XXI
A Wandemburgo no holandês império
Sucedera Rimbach em guerras noto,
Que. estimando dos belgas vitupério
Ser cada dia pelos nossos roto,
Enquanto celebrava atento e sério
A páscoa o campo em procissão devoto,
Com todo o poder batavo acomete,
E o campo em confusão, batendo, mete.
- XXII
Não se interrompe a cerimônia augusta;
Orando o clero com o sexo pio,
Sai o ortodoxo conta a turma injusta,
Tomando por sagrado o desafio;
E, fundando no céu confiança justa,
Pelejam com tal fé, com tanto brio,
Que. matando Rimbach em feio estrago,
Deram aos belgas da blasfêmia o pago.
- XXIII
Mas o céu, que o flagelo destinava,
Poder tão grande aos batavos concede,
Que nada a Vandescop, que os moderava,
Depois desta campanha o curso impede.
Fica Itamaracá de Holanda escrava,
Desfaz-se o campo, a Paraíba cede,
Perde-se o Rio Grande, e noutra empresa
Rende o luso o Pontal e a Fortaleza.
- XXIV
Salva-se o resto, da facção perdida
Nas Alagoas, sítio defensável,
Onde, de fero belga perseguida,
Asilo busca a turba miserável.
Mas foi da Espanha em breve socorrida
Com brava tropa em frota respeitável;
Rosas de Borja, a Pernambuco enviado,
De Albuquerque o bastão tomou deixado.
- XXV
Roxas, pronto no obrar, posto em batalha,
De Vandescop as tropas investia;
Mas o belga Arquichofe a marcha atalha
Com socorro que válido trazia
Com tenebrosa sombra os lutos talha
A noite, que começa, à morte impia,
Dispondo Roxas em defesa armado
Esperar o socorro convocado.
- XXVI
Mas, logo que a manhã mostrou formosa
Da batalha inimiga a forma unida,
Mais não sossega a chama generosa,
E investe ardente a batava partida:
Cobre os céus a fumaça tenebrosa,
Perde o hispano e o holandês na empresa a vida,
E nem este, nem o outro ali vencera,
Se o temerário Roxas não morrera.
- XXVII
S. Félice, na guerra mestre astuto,
Sucede no governo ao bravo hispano,
E brasílico Fábio entanto luto
Salvou na retirada o lusitano.
Foi das palmas batávicas produto
Governar o país pernambucano
O conde de Nassau, que o belga envia,
General das conquistas que emprendia.
- XXVIII
Era Nassau nas armas celebrado,
Com que ilustrava o excelso nascimento,
Príncipe então no império respeitado,
Nutrindo igual ao sangue o pensamento
Entrou de forte armada acompanhado,
E, no Arrecife situado o assento,
Levantou fortes, e em países belos
Guarneceu as colônias com castelos.
- XXIX
Mas, aspirando a empresa memorável,
Todo o exército e armada prevenia,
E, achando Pernambuco defensável,
Invadiu no recôncavo a Bahia.
S. Félice com resto miserável
Ali novo socorro ao rei pedia,
Quando ao bravo Nassau dispunha a sorte
Um chefe nele opor prudente e forte
- XXX
Tudo dispunha o conde em forma e arte
De rebater do batavo a interpresa,
Dispõe pela cidade em toda a parte
Os meios e instrumentos da defesa;
Faz grossas levas e esquadrões reparte,
E, tudo preparando à forte empresa,
Nada esqueceu de quanto na milícia
Inventa a militar sábia perícia.
- XXXI
Entrava entanto pela vasta enseada
Nassau, que as praias enche da Bahia
Com a terrível majestosa armada
Que com quarenta naus linha fazia;
E, ao som da trompa marcial tocada
Em gratos ecos de hórrida harmonia,
Enche a horrenda procela em tais ensaios
A enseada de trovões e o céu de raios.
- XXXII
Entanto o claro Silva, que ocupava
Do supremo governo o excelso mando,
A S. Félice o posto renunciava,
Ficando por soldado ao seu comando.
Heróica ação, que pela pátria obrava,
Maior perícia em outrem confessando,
E merecendo nela em tanta empresa
Da corte aclamações, do rei grandeza .
- XXXIII
Desembarca Nassau com turba ingente
Junto de Tapagipe, e empreende o oiteiro
Que nomear costuma a vulgar gente
Do antigo habitador Padre Ribeiro.
Mas S. Félice, que o anteviu prudente,
De posto o bate, que ocupou primeiro;
E, depois que seiscentos destro mata,
Em grande parte o belga desbarata.
- XXXIV
Largos dias Nassau bate a trincheira,
Que lhe opôs ao quartel Banholo à frente;
Mas o belga em batalha verdadeira
Por muitos dias se avançava ardente.
Cobre-se a terra em hórrida maneira
De um monte de cadáveres ingente,
Vendo os belgas cair, sem que desista
Nassau com tanto sangue da conquista.
- XXXV
E já desfeito o exército se via,
Ferido o oficial, e a gente morta,
Sem que cessasse o ardor nos da Bahia,
Que o S. Félice rege e o Silva exorta.
Pede tréguas Nassau nesta porfia,
E tudo com a tropa as naus transporta,
Fugindo do perigo o infausto efeito.
Com perda igual de gente e de conceito.
- XXXVI
Dois dias na enseada por vingança
Bate a esquadra a cidade sem perigo,
Com balas e granadas, que em vão lança,
Parecendo mais salva que castigo.
Sobreveio ao Brasil nova esperança
De expugnar com mais forças o inimigo;
Mas foi o efeito das promessas vário,
Impedindo o socorro o mar contrário.
- XXXVII
Vi neste tempo em confusão pasmosa
A monarquia em Lísia dominante,
E a casa de Bragança gloriosa
Nos quatro impérios triunfar reinante,
A Bahia com pompa majestosa
Festejar o monarca triunfante,
E o Pernambuco, de desgraças farto,
Invocar pai da pátria D. João Quarto.
- XXXVIII
Tratava o novo rei com fé provada
A batávica paz, que sem justiça
Deixava ao mesmo tempo quebrantada
O belga injusto pela vil cobiça .
Ocupa o Maranhão batava armada,
E outra esquadra em Sergipe o incêndio atiça,
Pretendendo ocupar com falso engano
Toda África e Brasil ao lusitano.
- XXXIX
Cede do seu governo de afrontado
O general Nassau, tornando à Holanda,
Tendo o conselho do Arrecife armado
Mil artifícios de calúnia infanda.
Nem contra os habitantes moderado
O duro freio no governo abranda,
Onde a plebe agravada que o experimenta
O Jugo sacudir com glória intenta.
- XL
João Fernandes Vieira foi na empresa
O instrumento da pátria liberdade,
Herói que soube usar da grã-riqueza,
Libertando o Brasil desta impiedade.
De amigos e parentes na defesa
Tentou furtivamente a sociedade,
E como a pedra a estátua de Nabuco.
O belga derribou de Pernambuco.
- XLI
Nomeou cabos, tropas, companhias,
Pediu socorros e invocou prudente,
Expondo do holandês as tiranias,
O governo brasílico potente.
Avisa sem demora Henrique Dias ,
Capitão dos etíopes valente,
E o forte Camarão, que em guerra tanta
Com os seus carijós o belga espanta.
- XLII
Ouse o holandês com susto o movimento;
E, querendo oprimir nascente a chama,
Com dois mil homens prevenia atento
A nova guerra que o Vieira inflama.
Deixara o luso chefe o alojamento,
E os belgas, que à cilada oculto chama,
Empenhou de um lugar nas duras rocas,
A que o monte chamaram das Tabocas.
- XLIII
Entre arbustos e canas de improviso
Dispara o luso sobre a incauta gente,
E, precedendo o dano antes do aviso,
Desbarata o holandês com fúria ardente.
Suspende a marcha o batavo indeciso,
E, sem ver o inimigo, o golpe sente,
Até que, vendo o estrago dos soldados,
Cedem o campo e fogem destroçados
- XLIV
Holanda era potente e o luso aflito,
Onde enchendo Lisboa de ameaças,
Por ter notícia do infeliz conflito,
Meditava ao Brasil novas desgraças.
Mas, por guardar os seus, o rei invicto
Dispôs piedoso nas providências lassas
Providências que à paz chamar pudessem
O tumulto em que os nossos permanecem.
- XLV
Vão com dois regimentos destacados
O moreno e o negreiros da Bahia
A dar paz (se é possível) destinados
Na guerra que o Vieira então movia.
Vieram veigas e Campos abrasados,
E o colono infeliz, que perecia,
Com lastima da tropa, que observara,
Todo o estrago que o belga ali causara.
- XLVI
Avistado o Negreiros e o Vieira
"Venho (disse o primeiro) a prisão dar vos,
Por haver provocado a ira estrangeira
A uma guerra que acabe de assolar-vos."
"É justo que eu também prender-vos queira;
Mas será (disse o herói) com abraçar-vos."
E, assim dizendo, alegre move o passo,
E os dois recebe com festivo abraço.
- XLVII
Outro tanto fazia a tropa unida
Ao invicto esquadrão pernambucano;
E, aplaudindo a vitória conseguida,
Detestam do holandês o enorme engano.
Nem muito tarda a gente fementida
Que não abrase ao lusitano,
Onde embarcado pela paz chegara,
Com o batavo próprio o convidara.
- XLVIII
Ouvem-se entanto os míseros clamores
De turba feminina, que invocava
O socorro dos seus libertadores
Contra o belga cruel que a cativava.
Mas não cessa o Vieira e sem rumores
O engenho, aonde incauto descansava
O belga general cercado, bate,
E, rendendo-o à prisão, vence o combate.
- XLIX
Henrique Huss, no Arrecife comandante,
Era o cabo dos belgas prisioneiro,
Blac rendido também, chefe importante,
Subalterno nas armas do primeiro.
Foge do luso o batavo arrogante,
Espalhando fuzis no grão-terreiro,
E a chama teme que no horrendo empenho
Lançara o Vieira pelo vasto engenho.
- L
Com fama de vitória tão brilhante
Toma as armas a plebe e o belga invade;
Serenhaem tomou, vila possante,
O partido comum da liberdade.
Segue Itaramaracá com fé constante,
Porto Calvo e os contornos da cidade,
Deixando no Arrecife sem remédio
Encerrado o holandês com duro assédio,
- LI
Mas não cessa na Holanda a companhia,
E ao numeroso exército que ordena,
Segismundo Van-Scop por chefe envia,
Munido em guerra de potência plena;
Do experto general, que desconfia
O prêmio valoroso, do fraco apena,
E empreendendo com forças o combate,
O inimigo Vieira ou prenda, ou mate.
- LII
Abordando o Arrecife então cercado,
A inércia dos seus chefes repreende;
Nem muito tarda que no campo armado
Não saia a Olinda, que expugnar emprende.
Em assalto a acomete duplicado,
E a brava tropa, que ao presídio atende,
Com tanto alento o batavo rechaça,
Que ferido Van-Scop se acolhe à praça.
- LIII
Sem que desista da passada instância,
Tenta de novo a empresa da Bahia;
Mas, notando nos lusos a constância,
Que injúria do poder lhe parecia,
Consome do Recôncavo a abundância
Com freqüentes sortidas, que emprendia,
E, porque cresça na cidade o tédio,
Ocupa Taparica e põe-lhe o assédio.
- LIV
Teles entanto, que expulsar pretende
Sem igual força o batavo contrário,
Contra o comum conselho o ataque emprende,
E tudo expõe no impulso temerário
Mas, vendo o luso rei que a nada atende
O belga nos seus pactos sempre vário,
Manda armada ao Brasil, que poderosa
A batava nação dome orgulhosa.
- LV
Teme o golpe Van-Scop e desampara,
Por guardar o Arrecife, Taparica,
Antevendo que a esquadra se prepara
Contra a praça, que auxílio lhe suplica.
Barreto de Menezes, que chegara
De novo general patente indica,
E em Pernambuco sublimado ao mando
Com prudência e valor foi governando.
- LVI
Nove mil homens, tropa valorosa,
E com freqüentes palmas veterana,
Manda o batavo a empresa perigosa,
Que à guerra ponha fim pernambucana.
Ocupa o mar armada poderosa,
E, dominando a praia americana,
Usurpa em mar e terra alto domínio,
Ameaçando dos lusos o extermínio.
- LVII
Põe-se em campanha o batavo terrível,
Com sete mil de veterana tropa;
Vão densos bandos de gentio horrível,
Com destro gastador vindo da Europa;
E, estimando a potência irresistível,
Cende ao belga a Barreta e quanto topa ,
Enquanto em defensiva o luso fica,
E o campo contra o belga fortifica.
- LVIII
Segismundo, porém, que os bastimentos
Em Moribeca assegurar procura,
Dispunha ali tomar alojamentos,
Estimando a vitória já segura.
Mas Barreto e Vieira a tudo atentos,
Na justiça, que a causa lhe assegura,
Confiam que na empresa o céu lhe valha,
E tudo vão dispondo a uma batalha.
- LIX
Nem com tanto poder Van-Scop recusa
Decidir numa ação toda a contenda,
Antevendo, se a perde a gente lusa,
Que outra força não tem que a guerra emprenda;
E já na marcha a multidão confusa
A ação começa pelo fogo horrenda,
E, turbando dos belgas toda a forma,
Combatem com valor, porém sem norma.
- LX
Nos montes Guararapes se alojava
Formando o português, que o belga espera;
E a escaramuça, que emprendera brava,
Traz a sítio o holandês, que adverso lhe era;
Desde alto monte o luso fogo obrava,
Com ruína dos batavos tão fera,
Que, ou seja ao lado, ou na espaçosa fronte,
Se cobriu de cadáveres o monte.
- LXI
Reúne os batalhões Van-Scop irado,
E à frente com valor da linha posto
Tenta desalojar do alto ocupado
O invicto Camarão, que lhe faz rosto;
Mas, com chuva de balas rechaçado,
Perde três vezes o ganhado posto,
E já ferido com mil mortos cede,
Em vil fuga, que a noite lhe concede.
- LXII
Noventa dos seus perde o lusitano;
E enquanto o belga se retira incerto,
Descobre a aurora todo o monte e plano
De bandeiras, canhões, e armas coberto.
Muitos ali do batavo tirano,
Perdidos pela noite em campo aberto,
Deixa o dia, inexpertos nos roteiros,
Nas mãos da nossa tropa prisioneiros.
- LXIII
Horroriza-se Holanda, pasma Europa,
Exalta Portugal, canta a Bahia,
Vendo-se triunfar tão pouca tropa
Da terrível potência que a invadia.
Nada de humano o pensamento topa,
Que em tudo a mão de Deus clara se via,
Pois sempre elege para os seus portentos
Os mais fracos e humildes instrumentos.
- LXIV
Tinha exausta a ambição, mas não cansada
A cobiçosa Holanda em tal conquista;
E, para novo empenho aparelhada,
Escolhe os capitães e a gente alista;
Mas do Britano às armas provocada,
Sobre interesse que mais alto avista,
Suspende influxo na famosa empresa,
Deixando em Pernambuco a guerra acesa.
- LXV
Brinca este tempo, coronel valente,
Impetra de Van-Scop tropa luzida,
Com petrechos e número potente,
Que em batalha cruel toda decida.
Cinco mil homens de escolhida gente,
De canhões, e petrechos guarnecida,
Põe no campo assombrado da potência,
Igualando o valor coa diligência.
- LXVI
Com dois mil e seiscentos veteranos
Fez-lhe frente Barreto e o belga invade;
Correm de toda a parte os lusitanos
A sustentar a pátria liberdade.
Aloja o luso sobre os mesmos planos
Onde fora passada a mortandade;
O belga na montanha se distingue,
Um que estrago renove, outro que o vingue.
- LXVII
Mas Brinc, a tudo atento desde o cume,
Com perícia guerreira ocupa o monte,
Onde, seguindo o militar costume,
Dá forma à retaguarda e ordena à fronte;
Nem tão ousado o português presume,
Que em vantajoso posto o belga afronte,
Esperando a ocasião dali oportuna
De poder atacar com mais fortuna.
- LXV
Reconhece Barreto o sítio e forma,
E, vendo o ardor da lusitana gente,
Que, hábil no passo, da subida o informa,
Faz que o bravo Vieira ataque ardente;
E, cobrindo a invasão com sábia norma,
Com o fogo protege o assalto ingente,
Até que por mil casos duvidosos
Vê sobre o monte os campeões briosos.
- LXIX
Nova batalha ali com fogo vivo
Move impávido o belga e firme insiste;
E, por mais que o Vieira invada ativo,
Onde um corpo vacila, outro resiste.
Tal há que ainda combate semi-vivo;
Tal que, cadáver já na morte triste,
A terra morde e em raiva enfurecida,
Blasfemando do céu, despede a vida.
- LXX
A toda a parte voa o grão-Barreto,
E um anima, outro ajuda, outros exorta;
E, excitando no luso o pátrio afeto,
Incita o fone, o inválido conforta.
Bramava o fero Brinc em sangue infecto,
Entre a batava turba opressa e morta;
Assalta horrendo um batalhão potente,
E outros reprime com ferócia ardente.
- LXXI
Mas o invencível Camarão, que o nota,
Um forte troço da reserva abala;
E, suspendendo a misera derrota,
Lança o belga por terra de uma bala.
Logo o almirante da soberba frota,
Vendo invadido Brinc cair sem fala,
Ocupa o mando, que já vago estima,
E o batavo à peleja altivo anima.
- LXXII
Não sofre Henrique Dias, que observava
Do novo chefe a intimação constante;
E de um tiro, que fero lhe apontava,
Derriba morto o intrépido almirante.
Sem comandante, o belga trepidava,
E, de um e de outro lado vacilante,
Uma vil fuga tímido declara,
E o campo com desordem desampara.
- LXXIII
O estandarte soberbo dos Estados,
Tendas, peças, bandeiras numerosas,
Mil e trezentos mortos numerados,
Prisioneiros, bagagens preciosas,
Muitos centos na fuga degolados,
A caixa militar, armas custosas,
Foram, nesta ocasião, de tanta glória,
O merecido prêmio da vitória.
- LXXIV
Cinge o Arrecife de um assédio estreito
Com pronta cura o chefe lusitano;
Mas, tendo longa guerra o belga feito,
Era contínuo sim, mas mútuo o dano;
Até que Jacques ao comando eleito
No campo se avistou pernambucano.
Conduzindo em fortuita derrota
Para o luso comércio a usada frota.
- LXXV
Por mar e terra sitiada a praça,
Depois do longo assédio de nove anos,
Com mil desastres fatigada e lassa,
Cedeu todo o Brasil aos lusitanos:
Mercê clara do céu, patente graça,
Que a tão poucos e míseros paisanos
Cedesse uma nação que enchia em guerra
De armadas todo o mar, de espanto a terra.
- LXXVI
Assim modera o Padre Onipotente
Do ignorante mortal a incerta sorte,
Por fazer com tais casos evidente
Que não é quem mais pode o que é mais forte.
Tudo rege na terra a mão potente;
Dele a vitória pende, a vida, a morte;
E, sem o seu favor, que o distribui,
Todo o humano poder nada conclui.
- LXXVII
Triunfou Portugal; mas, castigado,
Teve em tal permissão severo ensino,
Que só se logrará feliz reinado,
Honrando os reis da terra ao rei divino;
E que o Brasil aos lusos confiado
Será, cumprindo os fins do alto destino,
Instrumento talvez neste hemisfério
De recobrar no mundo o antigo império.
- LXXVIII
Vi ne sonho mil casos diferentes,
Que no curso virão de outras idades.
Vi províncias notáveis e potentes,
Vi nascer no Brasil áureas cidades;
Famosos vice-reis e ilustres gentes,
Tantos sucessos, tantas variedades,
Que somente pintado, como em sombra,
Confunde o pensamento, a vista assombra.
- LXXIX
Prelados vi de excelsa jerarquia,
E entre outros da maior celebridade
O claro Lemos, que enriqueça um dia
De novas ciências a universidade:
Ele ornará depois a academia
Com construções de excelsa majestade,
E em doutrina a fará com sábio modo
O Ateneu mais famoso do orbe todo."
- LXXXX
Deu Catarina fim, e arrebatada
Num êxtase ficou, vibrando ardores;
Corriam pela face em luz banhada
Lágrimas belas, como orvalho em flores.
Fica a pia assembléia esperançada
De outros sucessos escutar maiores;
E, dando tempo ao sono milagroso,
No abraço a deixam do celeste esposo.