Fausto (traduzido por António Feliciano de Castilho)/Quadro XXII: diferenças entre revisões

Wikisource, a biblioteca livre
Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
Ozymandias (discussão | contribs)
nova página: {{navegar |obra=Fausto |autor=Goethe |tradutor=António Feliciano de Castilho |anterior=Fausto (traduzi...
 
m →‎top: clean up utilizando AWB
 
Linha 1: Linha 1:
{{navegar
{{navegar
|obra=[[Fausto (traduzido por António Feliciano de Castilho)|Fausto]]
|obra=[[../|Fausto]]
|autor=Goethe
|autor=Goethe
|tradutor=António Feliciano de Castilho
|tradutor=António Feliciano de Castilho
|anterior=[[Fausto (traduzido por António Feliciano de Castilho)/Áureas Núpcias|Áureas Núpcias]]
|anterior=[[../Áureas Núpcias|Áureas Núpcias]]
|posterior=[[Fausto (traduzido por António Feliciano de Castilho)/Quadro XXIII|Quadro XXIII]]
|posterior=[[../Quadro XXIII|Quadro XXIII]]
|seção=Quadro XXII
|seção=Quadro XXII
}}
}}

Edição atual desde as 02h45min de 20 de maio de 2020

Campo. Dia enuviado.

Cena única[editar]

FAUSTO e MEFISTÓFELES

FAUSTO
Penúria, desconforto a vida inteira,
e um cárcere afinal.
Quem to diria,
bela inocente! como ré fadada
a cruz tormentos! Tanto pôde a sina!
E este infame traidor a ter-mo oculto
Ousa ainda encarar-me! Anda, dardeja-me
as áscuas desse olhar. Se te parece,
exaure-me de todo a paciência
a arrostares-me em face!

Encarcerada,
falta de tudo, obsessa de demónios,
em garras de juizes desalmados,
e eu no entanto em mil frívolos recreios
engodado por ti, seus ais não oiço,
não na arranco do abismo onde a recalcas.

MEFISTÓFELES
Já não é a primeira.

FAUSTO
Ah perro! há monstro!
Retorna-o, Senhor Deus, que podes tudo,
ao ser canino com que o vi rojar-se
aos meus pés, com que fila atraiçoado
ao viandante incauto, e salta às costas
do homem caído! ou torne à costumada
forma de cobra, arraste-se na terra,
e eu que pise, que esmague o miserável!
Já não é a primeira!! Onde há ’í peito,
que abranja horror tamanho! Haver mais de uma,
que se tenha afogado em tal miséria!
Não terem logo os transes da primeira
por todas pago e resgatado a todas!

Eu só de imaginar as penas desta
sinto infernos cá dentro!... ele, impassível,
mencionando as sem conto amostra os dentes!

MEFISTÓFELES
E quer isto connosco associar-se!
Onde a ciência em nós começa apenas,
a de homens deu em seco.
Ambicionaras
seguir-me o voo, e mal batemos asas,
já se te oira o juízo e cais.
Busquei-te,
ou buscaste-me tu?

FAUSTO
Não me arreganhes
a dentuça roaz! metes-me nojo!
Espírito sublime, oh tu, que observas
meu sentir e pensar, como te aprouve
jungir-me escravo ao mais feroz dos génios,
para o qual dor alheia é pasto, é glória!

MEFISTÓFELES
Findou?

FAUSTO
Salvá-la!... ou mal por ti, que voto
com tal imprecação assoberbar-te,
que te há-de durar séculos.

MEFISTÓFELES
Não cabe
na minha alçada espedaçar os ferros
da pública vindicta. Acho-te pilhas
no teu Salvá-la! Quem pregou com ela
nesse abismo? eu ou tu?
Vá lá. Fulmina-me!
(Inda foi providência o não ser de homens
o jus do raio.) Usual nos tiranetes
foi sempre, onde inocentes se desculpam,
tapar-lhe a boca, por livrar de empachos.

FAUSTO
Leva-me a ela: vou soltá-la.

MEFISTÓFELES
E os riscos?
Lá na cidade o crime de homicida
acha-se inda em aberto... Inda revoam
sobre os terrões do morto espiritinhos
vingadores, à espera do homicida.

FAUSTO
Outra das tuas. Maldições sem termo
sobre ti, monstro! Já to disse; mando
que lá me ponhas, e ma salves.

MEFISTÓFELES
Pronto,
quanto ao levar-te; agora omnipotência
confesso que a não tenho. O que eu só posso
é sepultar em sono o carcereiro.
O mais não me pertence: há-de ser de homem
a mão que furte a chave e solte a presa.
Eu fico de vigia. Tenho prestes
os nossos palafrens enfeitiçados;
montam, ponho-os em salvo. O que prometo
é isto, e hei-de cumpri-lo.

FAUSTO
Andar! Corramos!