Espumas Flutuantes (1913)/O Fantasma e a Canção: diferenças entre revisões
mSem resumo de edição |
m ajustes (AWB) |
||
Linha 1: | Linha 1: | ||
{{navegar |
{{navegar |
||
|obra= |
|obra=O Fantasma e a Canção |
||
|autor=Castro Alves |
|autor=Castro Alves |
||
|notas={{integra|poema=[[Espumas Flutuantes]]}} |
|||
}} |
|||
}}<poem> |
|||
[[Categoria:Castro Alves]] |
|||
{{d|''Orgulho! desce os olhos dos céus'' |
|||
[[Categoria:Poesia brasileira]] |
|||
''sobre ti mesmo, e vê como os nomes'' |
|||
''mais poderosos vão se refugiar numa'' |
|||
''canção.'' |
|||
[[Autor:Lord Byron|BYRON.]]}} |
|||
— Quem bate? — "A noite é sombrio!" |
|||
— Quem bate?-"É rijo o tufão!... |
|||
Não ouvis? a ventania |
|||
<BR>''Orgulho! desce os olhos dos céus'' |
|||
Ladra à lua como um cão. |
|||
" — Quem bate?-"O nome qu'importa? |
|||
<BR>''mais poderosos vão se refugiar numa'' |
|||
Chamo-me dor... abre a porta! |
|||
<BR>''canção.'' |
|||
Chamo-me frio... abre o lar! |
|||
<BR>[[Autor:Lord Byron|BYRON.]] |
|||
Dá-me pão... chamo-me fome! |
|||
<BR> |
|||
<BR>- Quem bate? -"A noite é sombrio!" |
|||
<BR>-Quem bate?-"É rijo o tufão!... |
|||
Necessidade é o meu nome!" |
|||
<BR>Não ouvis? a ventania |
|||
— Mendigo! podes passar! |
|||
<BR>Ladra à lua como um cão. |
|||
"Mulher, se eu falar, prometes |
|||
<BR>" -Quem bate?-"O nome qu'importa? |
|||
A porta abrir-me?"-Talvez. |
|||
<BR>Chamo-me dor... abre a porta! |
|||
— "Olha... Nas cãs deste velho |
|||
<BR>Chamo-me frio... abre o lar! |
|||
Verás fanados lauréis |
|||
<BR>Dá-me pão... chamo-me fome! |
|||
Há no meu crânio enrugado |
|||
<BR>Necessidade é o meu nome!" |
|||
O fundo sulco traçado |
|||
<BR>- Mendigo! podes passar! |
|||
Pela c'roa imperial. |
|||
<BR>"Mulher, se eu falar, prometes |
|||
Foragido, errante espectro, |
|||
<BR>A porta abrir-me?"-Talvez. |
|||
Meu cajado — já foi cetro! |
|||
<BR>-"Olha... Nas cãs deste velho |
|||
Meus trapos — manto real!" |
|||
<BR>Verás fanados lauréis |
|||
— Senhor, minha casa é pobre... |
|||
<BR>Há no meu crânio enrugado |
|||
Ide bater a um solar! |
|||
<BR>O fundo sulco traçado |
|||
— "De lá venho... O Rei-fantasma |
|||
<BR>Pela c'roa imperial. |
|||
Baniram do próprio lar. |
|||
<BR>Foragido, errante espectro, |
|||
Nas largas escadarias, |
|||
<BR>Meu cajado -já foi cetro! |
|||
Nas vetustas galerias, |
|||
<BR>Meus trapos - manto real!" |
|||
Os pajens e as cortesãs |
|||
<BR>-Senhor, minha casa é pobre... |
|||
Cantavam!... Reinava a orgia!... |
|||
<BR>Ide bater a um solar! |
|||
<BR>-"De lá venho... O Rei-fantasma |
|||
Festa' Festa! E ninguém via |
|||
<BR>Baniram do próprio lar. |
|||
O Rei coberto de cãs!" |
|||
<BR>Nas largas escadarias, |
|||
— Fantasmas! Aos grandes, que tombam, |
|||
<BR>Nas vetustas galerias, |
|||
É palácio o mausoléu! |
|||
<BR>Os pajens e as cortesãs |
|||
— "Silêncio! De longe eu venho... |
|||
<BR>Cantavam!... Reinava a orgia!... |
|||
Também meu túmulo morreu. |
|||
<BR> |
|||
O séc'lo-traça que medra |
|||
<BR>Festa' Festa! E ninguém via |
|||
Nos livros feitos de pedra — |
|||
<BR>O Rei coberto de cãs!" |
|||
Rói o mármore, cruel. |
|||
<BR>-Fantasmas! Aos grandes, que tombam, |
|||
O tempo, Átila terrível |
|||
<BR>É palácio o mausoléu! |
|||
Quebra cota pata invisível |
|||
<BR>-"Silêncio! De longe eu venho. . . |
|||
Sarcófago e capitel. |
|||
<BR>Também meu túmulo morreu. |
|||
"Desgraça então para o espectro, |
|||
<BR>O séc'lo-traça que medra |
|||
Quer seja Homero ou Sólon, |
|||
<BR>Nos livros feitos de pedra - |
|||
Se, medindo a treva imensa |
|||
<BR>Rói o mármore, cruel. |
|||
Vai bater ao Panteon... |
|||
<BR>O tempo, Átila terrível |
|||
O motim — Nero profano— |
|||
<BR>Quebra cota pata invisível |
|||
No ventre da cova insano |
|||
<BR>Sarcófago e capitel. |
|||
Mergulha os dedos cruéis. |
|||
<BR>"Desgraça então para o espectro, |
|||
Da guerra nos paroxismos |
|||
<BR>Quer seja Homero ou Sólon, |
|||
Se abismam mesmo os abismos |
|||
<BR>Se, medindo a treva imensa |
|||
E o morto morre outra vez! |
|||
<BR>Vai bater ao Panteon... |
|||
'Então, nas sombras infindas, |
|||
<BR>O motim -Nero profano- |
|||
S'esbarram em confusão |
|||
<BR>No ventre da cova insano |
|||
Os fantasmas sem abrigo |
|||
<BR>Mergulha os dedos cruéis. |
|||
Nem no espaço, nem no chão... |
|||
<BR>Da guerra nos paroxismos |
|||
As almas angustiadas, |
|||
<BR>Se abismam mesmo os abismos |
|||
Como águias desaninhadas, |
|||
<BR>E o morto morre outra vez! |
|||
Gemendo voam no ar. |
|||
<BR>'Então, nas sombras infindas, |
|||
E enchem de vagos lamentos |
|||
<BR>S'esbarram em confusão |
|||
As vagas negras dos ventos, |
|||
<BR>Os fantasmas sem abrigo |
|||
Os ventos do negro mar! |
|||
<BR>Nem no espaço, nem no chão... |
|||
"Bati a todas as portas |
|||
<BR>As almas angustiadas, |
|||
Nem uma só me acolheu!... |
|||
<BR>Como águias desaninhadas, |
|||
— "Entra!: Uma voz argentina |
|||
<BR>Gemendo voam no ar. |
|||
Dentro do lar respondeu. |
|||
<BR>E enchem de vagos lamentos |
|||
— "Entra, pois! Sombra exilada, |
|||
<BR>As vagas negras dos ventos, |
|||
Entra! O verso é uma pousada |
|||
<BR>Os ventos do negro mar! |
|||
Aos reis que perdidos vão. |
|||
<BR>"Bati a todas as portas |
|||
A estrofe: é a púrpura extrema, |
|||
<BR>Nem uma só me acolheu!... |
|||
Último trono: é o poema! |
|||
<BR>-"Entra!: Uma voz argentina |
|||
Último asilo: a Canção!..." |
|||
<BR>Dentro do lar respondeu. |
|||
</poem> |
|||
<BR>-"Entra, pois! Sombra exilada, |
|||
<BR>Entra! O verso é uma pousada |
|||
<BR>Aos reis que perdidos vão. |
|||
[[Categoria:Castro Alves]] |
|||
<BR>A estrofe: é a púrpura extrema, |
|||
[[Categoria:Espumas Flutuantes]] |
|||
<BR>Último trono: é o poema! |
|||
[[Categoria:Poesia brasileira]] |
|||
<BR>Último asilo: a Canção!..." |
|||
[[Categoria:Romantismo brasileiro]] |
|||
''([[Espumas Flutuantes]], 9)'' |
Revisão das 05h32min de 25 de março de 2007
Orgulho! desce os olhos dos céus
sobre ti mesmo, e vê como os nomes
mais poderosos vão se refugiar numa
canção.
BYRON.
— Quem bate? — "A noite é sombrio!"
— Quem bate?-"É rijo o tufão!...
Não ouvis? a ventania
Ladra à lua como um cão.
" — Quem bate?-"O nome qu'importa?
Chamo-me dor... abre a porta!
Chamo-me frio... abre o lar!
Dá-me pão... chamo-me fome!
Necessidade é o meu nome!"
— Mendigo! podes passar!
"Mulher, se eu falar, prometes
A porta abrir-me?"-Talvez.
— "Olha... Nas cãs deste velho
Verás fanados lauréis
Há no meu crânio enrugado
O fundo sulco traçado
Pela c'roa imperial.
Foragido, errante espectro,
Meu cajado — já foi cetro!
Meus trapos — manto real!"
— Senhor, minha casa é pobre...
Ide bater a um solar!
— "De lá venho... O Rei-fantasma
Baniram do próprio lar.
Nas largas escadarias,
Nas vetustas galerias,
Os pajens e as cortesãs
Cantavam!... Reinava a orgia!...
Festa' Festa! E ninguém via
O Rei coberto de cãs!"
— Fantasmas! Aos grandes, que tombam,
É palácio o mausoléu!
— "Silêncio! De longe eu venho...
Também meu túmulo morreu.
O séc'lo-traça que medra
Nos livros feitos de pedra —
Rói o mármore, cruel.
O tempo, Átila terrível
Quebra cota pata invisível
Sarcófago e capitel.
"Desgraça então para o espectro,
Quer seja Homero ou Sólon,
Se, medindo a treva imensa
Vai bater ao Panteon...
O motim — Nero profano—
No ventre da cova insano
Mergulha os dedos cruéis.
Da guerra nos paroxismos
Se abismam mesmo os abismos
E o morto morre outra vez!
'Então, nas sombras infindas,
S'esbarram em confusão
Os fantasmas sem abrigo
Nem no espaço, nem no chão...
As almas angustiadas,
Como águias desaninhadas,
Gemendo voam no ar.
E enchem de vagos lamentos
As vagas negras dos ventos,
Os ventos do negro mar!
"Bati a todas as portas
Nem uma só me acolheu!...
— "Entra!: Uma voz argentina
Dentro do lar respondeu.
— "Entra, pois! Sombra exilada,
Entra! O verso é uma pousada
Aos reis que perdidos vão.
A estrofe: é a púrpura extrema,
Último trono: é o poema!
Último asilo: a Canção!..."