Eneida Brazileira/I: diferenças entre revisões

Wikisource, a biblioteca livre
Giro720 (discussão | contribs)
mSem resumo de edição
Giro bot (discussão | contribs)
m Eneida Brasileira/I foi movido para Eneida Brazileira/I: Página movida por bot
(Sem diferenças)

Revisão das 05h11min de 22 de setembro de 2007

Eu, que entoava na delgada avena
Rudes canções, e egresso das florestas,
Fiz que as vizinhas lavras contentassem
A avidez do colono, empresa grata5
Aos aldeãos; de Marte ora as horriveis
Armas canto, e o varão que, lá de Troia
Prófugo, á Italia e de Lavino ás praias
Trouxe-o primeiro o fado. Em mar e em terra
Muito o agitou violenta mão suprema,10
E o lembrado rancor da seva Juno;
Muito em guerras soffreu, na Ausonia quando
Funda a cidade e lhe introduz os deuses:
Donde a nação latina e albanos padres,
E os muros vem da sublimada Roma.15
Musa, as causas me aponta, o offenso nume,
Ou por que mágoa a soberana déa
Compelliu na piedade o heroe famoso
A lances taes passar, volver taes casos.
Pois tantas iras em celestes peitos!20
Colonia tyria no ultramar, Carthago,
Do ítalo Tibre contraposta ás fozes,
Houve, possante emporio, antigo, asperrimo
N’arte da guerra; ao qual, se conta, Juno
Até pospoz a predilecta Samos:25
Lá coche, armas lá teve; e annúa o fado,
No orbe enthronal-a então já traça e tenta.
Porêm de Teucro ouvira que a progenie,
Dos Penos subvertendo as fortalezas,
Viria a ser, desmoronada a Libya,30
A’ larga rei bellipotente povo:
Que assim no fuso as Parcas o fiavam.
Saturnia o teme, e a pró dos seus Achivos
Recorda as lides que excitara em Troia;
Nem d’alma aggravos risca, dôres cruas:35
No íntimo impressa a decisão de Páris,
A injúria da belleza em menoscabo,
E a raça detestada e as honras duram
Do rapto Ganymedes. Nestes odios
Sôbre-accesa, os da Grecia e immite Achilles40
Salvos Troas, do Lacio ia alongando,
Por todo o plaino undísono atirados;
E, em derredor vagando annos e annos,
De mar em mar a sorte os repulsava.
Tam grave era plantar de Roma a gente!45
De Sicilia, amarando, mal velejam
Ledos e o cobre rompe a salsa espuma,
Juno, dentro guardada eterna chaga:
"Eu, diz comsigo, desistir vencida!
Nem vedar posso a Italia ao rei dos Teucros!50
Ah! tolhe-me o destino. A esquadra argiva
Não queimou Pallas mesma, submergindo-os
Só de um Ajax Oileu por culpa e furias?
Do Tonante o corisco ella das nuvens
Darda, os baixéis desgarra, o ponto assanha;55
Ao triste, que varado expira chammas,
N’um torvelinho em rocha aguda o crava:
E eu, que raínha marcho ante as deidades,
Mulher e irmã de Jove, tantos annos
Guerreio um povo! E a Juno ha quem adore,60
Ou súpplice inda a incense, a invoque e honre?"
No âmago isto fermenta, e a deusa á patria
De austros furentes, de chuveiros prenhe,
A’ Eolia parte. Aqui n’um antro immenso
O rei preme, encarcera, algema, enfreia65
Luctantes ventos, roncas tempestades.
Em tôrno aos claustros de indignados fremem
Com gran’rumor do monte. Em celsa roca
Sentado Eolo, arvora o sceptro, e as iras
Tempera e os amacia. Que o não faça,70
Varridos mar e terra e o céo profundo
Lá se vam pelos ares. Cauto, em negras
Furnas o omnipotente os aferrolha,
E, um cargo de montanhas sobrepondo,
Lhes deu rei, que mandado a ponto as bridas75
Suster saiba ou laxar. Dest’arte Juno
O exora humilde: "Eolo, o pae dos divos
E rei dos homens te concede as ondas
Sublevar e amainal-as; gente imiga
Me sulca as do Tyrrheno, Ilio e os domados80
Penates para Italia transportando:
Ventos açula, as pôpas mette a pique,
Ou dispersas no ponto as espedaça.
Quatorze esbeltas nymphas me cortejam,
Das quaes a mais formosa, Deiopeia,85
Prometto unir comtigo em jugo estavel;
Que em paga para sempre a ti se vote,
Meiga te procreando egregia prole."
A quem Eolo: "Que o desejes basta;
Meu, raínha, he servir-te. Quanto valho90
Tu m’o grangêas, e este sceptro e Jove;
Tu dás-me á diva mesa o recostar-me,
Ser em tufões potente e em tempestades."
Dice; e um revez do conto a cava serra
A um lado impelle: em turbilhão, cerrados95
N’um grupo os ventos, dada a porta, ruem,
As terras varejando. Ao mar carregam,
E horrísonos revolvem-lhe as entranhas
Nôto mais Euro, e de borrascas fertil
Africo; ás praias vastas ondas rolam.100
Homens gritam, zunindo a enxarcia ringe.
Some-se ao nauta o céo, tolda-se o dia;
Pousa no pelago atra noite; os polos
Toam, o ether fuzila em crebros raios:
Tudo ameaça aos varões presente a morte.105
Frígido, arripiado, Enéas geme,
E alça as palmas e exclama: "Afortunados
Oh! tres e quatro vezes, d’Ilio ás abas,
Os que aos olhos paternos feneceram!
O’ dos Danaos fortissimo Tydides,110
A alma em Troia vertendo-me essa dextra,
Não ficar eu nos campos, onde o bravo
Heitor d’Eacide ás lançadas, onde
Sarpédon jaz magnanimo, onde o Simois
Corpos e elmos de heroes e escudos tantos115
Arrebatados na corrente volve!"
Bradava; e a sibilar ponteiro Bóreas
Rasga o panno, e a mareta aos astros joga.
Remos estalam; cruza a proa, e o bórdo
Rende; escarpado fluido monte empina-se.120
As naus já no escarcéo pendem, já descem
N’um sorvedouro á terra entre marouços:
Remoínha o esto na revôlta arêa.
Tres rouba Nôto e avexa n’uns abrolhos,
Abrolhos sob o mar, que Italos aras125
Nomêam, dorso horrendo ao lume d’agua;
Tres no parcel (que lastima!) Euro esbarra,
Encalha em vaos, de marachões rodêa.
Uma, em que Oronte fido e os Lycios vinham,
Ante Enéas, d’avante humido rôlo,130
Do maior pino desabando, em pôpa
Fere-a; do baque o prono mestre vôlto
Cahe de cabeça. O vagalhão tres vezes
Torce-a, revira, um vortice a devora.
Raros no vasto pégo a nadar surdem;135
Taboas e armas viris e alfaias troicas,
Prêa das ondas. A tormenta escala
A nau robusta de Ilioneu, de Abante,
As de Alethes grandevo e Achates forte:
Todas, frouxadas as junturas, sorvem140
A inimiga torrente, e em fendas gretam.
Mugir seu reino e o temporal desfeito,
Caixões do imo a brotar, sentiu Neptuno,
Torvo, abalado, e acode acima e exalta
A placida cabeça. A frota esparsa145
Vê sossobrando, oppressos os Troianos
Da marejada e do ruído ethereo.
De Juno irosa o dolo o irmão percebe;
Euro e Zephyro chama: "Herdastes, ventos,
Tal presumpção, que sem meu nume, ousados,150
Terra e céo confundis e equoreas brenhas?
Eu vos... Mas insta abonançar as vagas:
Caro m’o pagareis, guardo o castigo.
Ao rei vosso intimai, já já, que em sorte
Não lhe coube este imperio, que o tridente155
Fero he só meu. Tem elle enormes fragas,
Euro, vossas mansões: nessa aula ufano
Sôbre enclaustrados ventos reine Eolo."
Nem cessa, e o mar se lança, o tempo alimpa
E abre o Sol. Finca a espadoa, e com Cymóthoe160
As naus Tritão do escolho dsengasga;
Mesmo o padre as alliva com seu sceptro,
Amplas syrtes afunda, aplaca os mares,
Por cima em rodas se deslisa leves.
Como, enraivado em popular tumulto,165
Despara ignobil vulgo, e o facho e o canto
Já voa, as armas o furor ministra;
Mas, se um pio ancião preclaro assoma,
Calam, para escutar o ouvido afiam;
Elle os convence e os animos abranda:170
Assim baixa o fragor e o pégo amansa,
Quando olha o deus, que os brutos no ar sereno
Dobra, e dá loros ao ligeiro carro.
Da costa proxima em demanda, á Libya
Os cansados Eneadas aproam.175
N’um golpho alli secreto, com seus braços
Faz barra ilha fronteira, onde a mareta
Quebra e se escoa em sinuosas rugas:
Penedia em redondo, e ao céo minazes
Ha dous picos irmãos, a cujo abrigo180
Dorme diffuso o mar; de coruscantes
Selvas prolonga-se eminente scena,
Descahe de atra espessura horrida sombra;
No tôpo ha gruta em pêndulos cachopos,
Com doce fonte, e em viva rocha bancos185
Das nymphas séde: aqui não prende amarra
Nem mordaz ferro adunco as lassas quilhas.
Com sete naus ao todo arriba Enéas;
E amorosos da terra, alvoroçados
Saltando os seus, do sal tabidos membros190
Na arêa espraiam. Lume eis fere Achates,
Toma em folhas, e em roda as accendalhas,
Nutre a faisca, e em lenha a chamma atêa.
Mareados pães e cereaes aprestos
Já desembarca a trabalhada chusma,195
E os grãos põe-se a torrar e em pedra os pisa.
Trepa emtanto um penhasco, e ao largo Enéas
Regyra, a vêr se undívagos alcança
Antheu ou Capys, as biremes phrygias,
Ou armas de Caíco em altas pôpas.200
Baixel nenhum; avista só tres cervos
Na praia errantes; segue atrás o armento,
E enfileirado pelos valles pasta.
Retem-se, e o arco aferra e as settas ageis
Que armam Achates fido, e os guias logo,205
De arboreas pontas entonados, prostra;
Embrenha a demais turba e acossa a tiros,
Té que derriba sete ingentes corpos,
E iguala as naus. De vólta, elle os divide.
E os barris que, á partida, o heroe trinacrio210
Bom de vinho atestara, aos seus larguêa;
Dulcíloquo os mitiga: "Os males, socios,
Nada estranhamos; oh! mais agros foram:
Deus porá termo a estes. Vós de Scylla
De perto a raiva e escolhos resonantes,215
Vós cyclopeos rochedos affrontastes:
Animo! esse temor bani tristonho;
Talvez isto com gôsto inda nos lembre.
Por varios casos, transes mil, nos vamos
Ao Lacio onde o repouso os fados mostram:220
Resurgir deve alli de Troia o reino.
Tende-vos duros, da bonança á espera."
Tal discursa, e affectando um ar seguro,
N’alma inferma suffoca a dôr profunda.
Lestos á presa atiram-se: este esfola,225
Aquele desentranha, outro esposteja;
Qual trementes no espeto enrosca os lombos,
Qual fogo atiça aos caldeirões na praia.
Fartos, na relva espalham-se, refeitos
De velho baccho e veação opíma.230
Repleta a fome, e as mesas removidas,
Dubios indagam, sôbre os seus praticam
Entre medo e esperança: estam com vida?
Ou na extrema agonia ao brado surdos?
Mormente o pio rei de Amyco chora235
Ou de Lyco o desastre, o ardido Oronte,
E o forte Gyas e Cloantho forte.
Das alturas, no fim, Jove esguardando
O mar velívolo e as jacentes plagas
E amplas nações, no vertice do Olympo240
Quedo, os olhos fitou nos lybios reinos.
Quando o absorviam taes cuidados, Venus
Triste, os gentis luzeiros orvalhando:
"O’ tu, queixou-se, que os mortaes e os deuses
Reges eterno e horrísono fulminas,245
O que te fez meu filho, o que os Troianos,
Que após tragos lethaes, não só d’Italia,
Do universo os cancellos se lhes fecham?
Roma delles tirar, delles os cabos
Que, eras volvendo, restaurado o sangue250
De Teucro, o mar e a terra sofreiassem,
Nos prometteste: quem mudou-te, ó padre?
Do occaso ao menos e desgraças d’Ilio
Isto, uns fados com outros compensando,
Me consolava. Igual fortuna arrasta255
Ora os varões a riscos e a trabalhos:
Quando os findas, gran’rei? De Acheus escapo,
Entrar salvo Antenor d’Illyria o seio
E internar-se em Liburnia, e a fonte obteve
De Timavo transpôr, donde por bôcas260
Nove, a montanha a rimbombar, despenha-se
Ruidoso mar que empola e o campo alaga.
Sentou Patavio aqui, deu casa a Teucros,
Nome á gente, e os brasões fixou de Troia;
Descansa em doce paz. Nós tua estirpe,265
Nós da celeste côrte, as naus submersas,
Ah! de uma por furor, victimas somos,
Longe expulsos d’Italia? Deste modo
Se honra a piedade, os sceptros nos reservas?"
Sorrindo-se o autor de homens e numes,270
C’um gesto que a tormenta e o céo serena,
Da filha osculos liba, e assim pondera:
"Poupa esse medo, Cypria; immotos jazem
Dos teus os fados: nas lavinias tôrres
Has de revêr-te, e alar sôbre as estrellas275
Teu grande Enéas. Jupiter não muda.
O heroe na Italia (esta ancia te remorde,
Vou rasgar-te os arcanos do futuro)
Guerras tem de mover e amansar povos,
E instituir cidades e costumes,280
Ao passo que reinando o vir no Lacio
Terceiro estio, e os Rutulos domados,
Forem-se tres invernos. Posto ao leme
Ascanio, que hoje Iulo cognominam
(Ilo, em quanto florente Ilion se teve),285
Cerrando os mezes trinta largos gyros,
Ha-de, a séde lavinia trasladada,
Alba longa munir e abastecel-a.
Os Hectoreos aqui trezentos annos
Já reinarão, quando a vestal princeza290
Ilia parir a Marte gemea prole.
Da nutriz loba em fulva pelle ovante,
Romulo ha de erigir mavorcios muros,
E á recebida gente impôr seu nome.
Métas nem tempos aos de Roma assino;295
O imperio dei sem fim. Té Juno acerba,
Que o mar ciosa e a terra e o céo fatiga,
Transmudada em melhor, tem de amparar-me
Do orbe os senhores e a nação togada.
Praz-me assim. Manem lustros, que inda a casa300
De Assaraco ha de ser de Phthia e de Argos
Senhora, e agrilhoar Mycenas clara.
D’Iulo garfo egregio, em nome e glória
Succedendo, as conquistas no oceano
Cesar teminará, nos céos a fama.305
Nos astros sim, de espolios do oriente
Onusto, o acolherás; e humanas preces
Tem de invocal-o. Então, deposta a guerra,
Se amolgue a ferrea idade; a encanecida
Fé com Vesta, os irmãos Quirino e Rhemo310
Dictem leis; Jano trave as diras portas
Com trancas e aldrabões; sôbre armas cruas
Dentro o impio Furor sentado, e roxos
Atrás os pulsos em cem nós de bronze,
Hediondo ruja com sanguinea bôca."315
Não mais; e expede o génito de Maia,
Porque a recem Carthago hospicio aos Teucros
Franquêe, nem, do fado inscia, a raínha
Os extermine. O deus pelo ar patente
De azas remando, em Libya o vôo abate;320
Fiel ás ordens, a fereza aos Penos
Despe; e Dido primeira em pró dos Phrygios
Brandos affectos placidos concebe.
Toda a noite pensoso o heroe velando,
A alma luz mal branqueja, onde arribara325
Dispõe sondar; e vendo incultas margens,
Inquirir quem as tem, se homens, se feras,
E aos seus noticial-o. As naus mettidas
N’abra de uns bosques sob cavada penha,
Entre verde espessura e negras sombras,330
Elle só, mais Achates, sahe brandindo
Duas hastes que empunha de ancho ferro.
Da selva em meio a mãe se lhe apresenta,
Virgem no trajo e aspecto, em armas virgem
Lacena; ou qual Harpálice a threícia335
Cansa os corseis e o Euro vence alífugo: 325
Pois do hombro o arco destro, á caçadora,
Pendura, e ás auras a madeixa entrega,
Dos joelhos nua e a falda em nó colhida.
Eil-a: "O’ jovens, errante aqui topastes340
Irmã minha, a gritar quiçá no encalço 340
De javali sanhudo? A cinta aljava
Tem sobre a pelle de um manchado lynce."
Isto Venus; e o filho assim responde:
"Nenhuma ouvi nem vi das irmãs tuas,345
O’... quem direi? Não tens mortal semblante 345
Nem voz de humano som; es deusa, ó virgem:
Irmã de Phebo ou nympha? As nossas penas
Tu, por quem es, minora: e nos ensina,
Pois vagueâmos sem saber por onde,350
O paiz, clima ou povo, a que arrojou-nos 350
Vento e escarcéo medonho. Hostias sem conto
Havemos de immolar nas aras tuas."
"Não mereço honras taes, replíca Venus;
Usam de aljava, e ao bucho as virgens tyrias355
Atar das pernas borzeguim purpúreo. 355
Punicos reinos e agenorios muros
Vês, nos confins da indomita e guerreira
Libyca raça. O imperio atêm-se a Dido,
Que, por fugir do irmão, fugiu de Tyro.360
He longa a injúria, tem rodeios longos; 360
Mas traçarei seu curso em breve summa.
Sicheu, Phenicio em lavras opulento,
Foi da misera espôso, e müito amado:
Com bom preságio o pae lha dera intacta.365
Pygmalion, façanhoso entre os malvados, 365
Barbaro irmão, do estado se empossara.
Interveio o furor: de fome de ouro
Cego, e á paixão fraterna sem respeito,
Perfido, impio, a Sicheu nas aras mata;370
O facto encobre, e a credula esperança 370
Da amante afflicta largo espaço illude
Com mil simulações. Mas do inhumado
Consorte, com esgares espantosos,
Pallida em sonhos lhe apparece a imagem:375
Da casa o crime e trama desenleia; 375
A ara homecida, os retalhados peitos
Desnuda, e á patria intíma-lhe que fuja:
Prata immensa e ouro velho, soterrados,
Para o exilio descobre. Ella, inquieta,380
Apressa a fuga, e attrahe os descontentes 380
Que ou rancor ao tyranno ou medo instiga;
Acaso prestes naus, manda assaltal-as;
Dos thesouros do avaro carregadas
Empégam-se: a mulher conduz a empresa!385
Chegam d’alta Carthago onde o castello 385
Verás medrando agora e ingentes muros:
Mercam solo (do feito o alcunham Byrsa)
Quanto um coiro taurino abranja em tiras.
Mas vós-outros quem sois? donde he que vindes?390
Que regiões buscais?" Elle ás perguntas 390
Esta resposta suspirando arranca:
"O’ déa, se recorro á prima origem,
E annaes de angústias não te pejam, Vesper
No Olympo encerra o dia antesque eu finde.395
Da antiga Troia (se has notícia della), 395
Vagos no equoreo campo, arremessou-nos
Casual tempestade ás libyas costas.
Enéas sou, com fama alèm dos astros,
Que livrei de hostil garra os meus penates,400
E piedoso os transporto á patria Ausonia; 400
Do summo Jove a geração procuro.
Por guia a deusa mãe, submisso aos fados,
Em vinte naus commetto o phrygio ponto;
Rôtas do Euro e das ondas, restam sete.405
Pobre, ignoto, percorro africos ermos, 405
D’Asia e d’Europa excluso..." Nem mais Venus
Lamentos comportou, na dôr o atalha:
"Quem sejas, creio, não do céo malquisto,
Gozas d’aura vital, que a Tyro aportas.410
Eia, ao regio palacio te encaminha. 410
Sem risco os socios, ancorada a frota,
Com o rondar dos áquilos, te auguro,
Se em arte vã meus paes não me instruiram.
Attenta cysnes doze em bando alegres:415
No espaço, o ether fendendo, os perseguia 415
A ave de Jove; n’um cordão agora
Ou tem no pouso a mira, ou vam pousando;
Juntos batendo as estridentes azas,
Brincam cingindo o pólo, a salvo cantam:420
Bem como os teus as pôpas atracaram, 420
Ou de véla enfunada a foz embocam.
Sus, alli te dirige, a estrada he esta."
Dá costas, e a cerviz rosada fulge,
De ambrosia odor celeste a coma expira;425
A veste escoa aos pés; no andar se ostenta 425
Vera deusa. Elle atrás da mãe fuginte,
Reconhecendo-a, brada: "Porque o filho
Com taes ficções, cruel, enganas tanto?
Ligar dextra com dextra, ouvir-te ás claras,430
Conversar-te em pessoa me he defeso?" 430
Tal a argúe, e ás muralhas se endereça.
Ella porêm de ar fusco os viandantes
Tapa e os embuça em nevoa, que enxergal-os
Ou tocar ninguem possa, nem detel-os435
Ou da vinda informar-se. A deusa a Paphos 435
Remonta, a espairecer no sítio ameno
Onde o sabeu perfume arde em cem aras,
E recentes festões seu templo aromam.
Eis da azinhaga pela trilha cortam,440
E um teso galgam já, que olha imminente 440
A fronteira torrígera cidade.
Palhaes d’antes, a mole admira Enéas,
Admira o estrondo e as portas e as calçadas.
Tyro aferventa-se, a lançar os muros,445
A avultar o castello, e a rolar pedras. 445
Parte com sulcos marca os edificios;
Santo augusto senado, e o foro e a curia,
Se cria e elege: aqui se escavam portos;
Fundam-se alli magnificos theatros,450
De marmor collossaes talham columnas, 450
Pompa e decoro das futuras scenas.
Quaes abelhas ao sol por floreos prados
Lidam na primavera, quando ensaiam
O adulto enxame; ou doce fluido espessam,455
Do nectar flavo retesando as cellas; 455
Ou quando a carga das que vem recebem;
Ou em batalha expulsam da colmêa
Os zangãos, gente ignava. A obra ferve,
E a tomilho recende o mel fragrante.460
"Ditoso quem seus tectos já levanta!" 460
Exclama o heroe, e os coruchéos contempla.
Na cidade não visto, oh maravilha!
Se mistura ennublado. Em meio havia
Luco umbroso e fresquissimo, onde os Penos,465
De ondas jogados e tufões, cavaram 465
O tésto de um corsel, de Juno régia
Mostra e penhor que o povo, asado á glória,
Pugnaz e duro, insultaria os evos:
Lá punha Dido a Juno insigne templo,470
Que dons e a rica effigie realçavam: 470
No bronzeo limiar da[1] bronzea escada,
Craveja o bronze as traves, e a couceira
Range em portões de bronze. Um novo objeto
N’este bosque a lenir entra os receios;475
Aqui primeiro ousou fiar-se Enéas 475
E prometter-se allívio em seus pezares:
Pois quando, á espera da raínha, o templo
Nota peça por peça, quando o enlevam
De Carthago a fortuna, o gôsto fino,480
O artificio, o primor, acha em pintura 480
A fio as guerras d’Ilion, pelo orbe
Já soadas; o Atrida, o rei troiano,
E terror de ambos sebresahe[2] Achilles.
Pára, e em lagrimas diz: "Que sítio ou clima485
Cheio, Achates, não he dos nossos males? 485
Eis Priamo! o louvor tem cá seus premios,
Doe mágoa alheia, e remanece o pranto.
Coragem! que em teu bem conspira a fama."
Dice, e em vãos quadros se apascenta, e as faces490
Gemebundo humedece em largo arroio. 490
Vê de Pérgamo em roda a hoste graia
Do phrygio ardor fugir, fugir a teucra
Do instante carro do emplumado Achilles.
Ai! perto a Rheso por traição Tydides,495
No primo somno, arrasa as niveas tendas, 495
De carnagem cruento; e os acres brutos
Volve ao seu campo, sem gostado haverem
De Troia os pastos, nem bebido o Xantho.
Triste! as armas perdendo, alêm, Troílo,500
Que arrostou-se menino ao proprio Achilles, 500
He dos corséis tirado, e resupino,
Mas tendo os loros, do vazio carro
Pende; e a cerviz no pó, de rojo a coma,
Virada a lança hostil na arêa escreve.505
Em cabello, as Iliades afflictas 505
Ao templo iam tambem da iniqua Pallas,
O peplo humildes offertando, e os peitos
Com punhadas ferindo: aversa a déa
Olhos no chão pregava. A Heitor Pelides510
Tres vezes arrastara em tôrno aos muros, 510
De ouro a pêso vendia-lhe o cadaver.
Do imo um gemido grande Enéas sólta,
No olhar o espólio, o coche, o amigo exanime,
E a Priamo estendendo as mãos inermes.515
A si se reconhece entre os mais chefes. 515
Do negro rei do eôo a turma e as armas
A’ testa de milhares de Amazonas
Com lunados broquéis, Penthesiléa
Se abraza em furia, bellicosa atando520
Sob a despida mama um cinto de ouro, 520
E virgem com varões brigar se atreve.
Quando extatico o heroe se embebe e enleia,
Ao templo a formosissima raínha
Marcha, de jovens com loução cortejo.525
Qual nas ribas do Eurotas ou do Cyntho 525
Pelos serros Diana exerce os coros,
E, de infindas Oreadas seguida,
Carcaz ao hombro, em garbo as sobreleva;
Rega-se em gôzo tacito Latona:530
Tal era Dido, airosa e prazenteira, 530
Do seu reino a grandeza apressurando.
No adyto sacro, em meio do zimborio,
De armas cercada, em solio majestoso
Senta-se. Os pleitos julga e leis prescreve,535
Regra ou sortêa os publicos trabalhos. 535
Subito Enéas no tropel devisa
A Cloantho brioso, Antheu, Sergesto,
E os mais que atra borrasca a longes costas
Remessara dispersos. Elle e Achates540
Varados ficam de alegria e susto, 540
Avidos ardem por travar as dextras;
Fôrça ignota os perturba. Dissimulam;
Qual a sorte dos seus do encêrro espreitam
Nebuloso, e onde surta a frota seja,545
E com que fim das naus os mais conspicuos 545
Clamando, a pedir venia, ao templo acodem.
Introduzidos, quando a vez tiveram,
Rompe o idoso Ilioneu, facundo e grave:
"Raínha, ó tu que por favor supremo550
Ergues nova cidade, e justa enfreias 550
Suberbas gentes, os Troianos ouve,
Que, dos ventos ludíbrio, os mares cruzam:
Livra do infando incendio a pia armada,
Poupa innocentes, nossa causa attende.555
Nem vimos nós talar com ferro e fogo, 555
Nem saquear os lybicos penates:
A vencidos não cabe audacia tanta.
Paíz antigo existe, em grego Hesperia,
Armipotente e uberrimo, colonia560
Já de enotrios varões; agora he fama 560
Que, de um seu capitão, se diz Italia:
Esta era a nossa róta; eis que em vaos cegos
Deu comnosco de salto Orion chuvoso,
E, em sanha o pelago e os protervos austros,565
Nos derramou por ondas e ínvias fragas: 565
Poucos ganhámos pé nas vossas praias.
Patria e raça feroz! barbara usança!
Pisar em terra mãos hostis vedam;
Da arêa o asylo a náufragos prohibem.570
Se as armas desprezais e as leis humanas, 570
O céo mede as acções, premeia e pune.
Rei nosso Enéas he, que a ninguem cede,
Pio e inteiro, valente e bellicoso:
Se aura ethérea o sustenta e o guarda o fado,575
Se os manes o não tem, sem medo somos, 575
De o penhorar primeira não te pezes.
Cidades em Sicilia e campos temos,
E do sangue troiano o claro Acestes.
Amarrar nos permitte a lassa frota,580
Mastros, remos cortar, falcar antenas; 580
Com que ledos, se Italia nos espera,
Os socios e o rei salvo, ao Lacio vamos:
Mas, se te ha consumido o lybio pégo,
Optimo pae dos Teucros, nem d’Iulo585
Nos resta a segurança, ao pôrto embora, 585
Donde arribámos, a lograr voltemos
A apercebida sicula hospedagem,
E o regio amparo." O Dárdano termina:
Lavra entre os seus approvador sussurro.590
O rosto abaixa Dido, e foi succinta: 590
"Sus, Teucros, esforçai. Recente o estado
Ao rigor me constrange, e a defender-nos
Guarnecendo as fronteiras. Quem de Enéas
Desconhece a prosapia, e as guerras d’Ilio,595
Seu valor, seus heroes, seu vasto incendio? 595
Nem somos nós tam broncos, nem de Tyro
Tam desviado o Sol junge os cavallos.
Quer da saturnia Hesperia, quer as margens
D’Erix opteis, em que domina Acestes,600
Contai com meu auxílio e salvaguarda. 600
Folgais de aqui ficar? Esta cidade
Que erijo, he vossa; as naus que se approximem:
Não farei destincção de Phrygio a Peno.
Fôsse o rei vosso á Libya compellido605
Do mesmo Nôto! O litoral já mando 605
E os sertões perlustrar; se he que o naufragio
Em povoado ou brenha o traz perdido."
Ambos álerta, o padre e o companheiro
Ha müito almejam por quebrar a nuvem.610
A Enéas se antecipa o forte Achates: 610
"Nado de Venus, que tenção meditas?
Tens a frota em seguro, os teus bemquistos;
Um só que falta, sossobrar o vimos:
Ao que a mãe te esboçou quadra o mais tudo."615
Mal acabava, a nuvem circumfusa 615
Se rompe e funde nos delgados ares.
Um deus na espalda e vulto, á claridade
Resplende Enéas; que n’um sôpro a deusa
Ao filho a cabelleira em fulgor banha,620
Em luz purpúrea o juvenil semblante, 620
Em vivo terno agrado os olhos bellos:
Qual, pela indústria, com entalhos de ouro
Pário marmore, ou prata, ou marfim brilha.
De improviso á raínha e a todos clama:625
"Eis quem buscais, dos libyos vaos escapo, 625
Enéas sou. O’ tu que só tens mágoa
De tanto horror, que a nós de Troia restos,
Da Grecia escarneo, em terra e mar batidos,
Falhos de tudo, exhaustos, em teu reino,630
Em casa, nos recolhes e associas! 630
Nem pagar-te as finezas dignamente
Podêmos, Dido, nem os Phrygios todos
Quantos pelo universo peregrinam.
Se para os bons ha numes, he justiça,635
Pague-te o céo e a propria consciencia. 635
Que seculo feliz, que paes ditosos
Te houveram filha? Em quanto os vagos rios
Forem-se ao mar, em quanto em gyro a sombra
Vier do monte ao valle, em quanto o pólo640
Pascer os astros, onde quer que eu viva 640
Vivirá com louvor teu nome e fama."
Dice; a dextra offerece ao velho amigo,
A sinistra a Seresto, e uns após outros,
A Gyas, a Cloantho, e aos mais guerreiros.645
Da presença do heroe pasma a Phenissa, 645
Tal successo a commove, e assim se exprime:
"Que fado te urge, ó filho da alma Venus,
A arduos perigos e a bravias plagas?
Es o Enéas que a deusa ao nobre Anchises650
Gerou de Simoente ás phrygias margens? 650
Bem me lembra que Teucro, expatriado,
Veio a Sidonia, para um novo assento,
Pedir a Belo ajuda: a opima Chypre
Já vencedor meu pae vastara e tinha.655
De Troia os casos desde então conheço, 655
Teu nome, e os rêis pelasgos. Sempre ufano
Da anciã linhagem teucra, elle ofendido
Com enthusiasmo elogiava os Teucros.
Eia, á minha morada, ó moços, vinde.660
Por transes mil trazida, iguaes destinos 660
Cá me fixaram. Não do mal ignara
A socorrer os miseros aprendo."
Isto a Enéas memora, e o guia aos paços,
E em solemne festejo occupa as aras.665
Nem de enviar aos nautas se descuida 665
Touros vinte, co’as mães cem gordos anhos,
Cem corpulentos sedeúdos porcos,
E o doce mimo do jocoso Bromio.
Luxo esplende real no interno alcaçar,670
E opiparos banquetes se adereçam: 670
Primoroso o tapiz, de ostro suberbo;
Nas mesas prataria; em ouro a historia
Patria esculpida, successão longuissima
De uns a outros varões desde alta origem.675
Saudoso, impaciente, o pae de Ascanio 675
Todo em seu filho está; para informal-o
E o conduzir de bórdo, expede Achates.
De troico exicio as preservadas prendas
Venham tambem: de escamas de ouro um manto680
Brocado, um véo com orlas e recamos 680
De croceo acantho, ornatos peregrinos.
Dons maternos de Leda á bella Argiva,
Que a Pérgamo os trouxera de Mycenas
A’ incasta boda; e o sceptro que Ilione,685
Filha a maior de Priamo, hastiava, 685
E engranzado collar de perlas finas,
E aurea coroa de engastadas gemmas.
Executivo ás naus caminha Achates.
Nova traça urde a Cypria, alvitres novos;690
Que Amor, no meigo Iulo transformado, 690
Com os dons nos ossos á raínha infiltre
Insano fogo. A estancia ambigua, os Tyrios
Bilingues teme; Juno atroz a inflamma;
Tresnoitada a pensar, por fim conjura695
O alígero Cupido: "O’ filho, esteio 695
Unico e meu poder, filho, que em pouco
Tens as typhéas soberanas armas,
Es meu refúgio, teu socorro imploro.
Sabes que a teu irmão de praia em praia700
Fluctívago arremessa a iniqua Juno, 700
E doe-te a nossa dôr. Com mil caricias
Tem-no a Sidonia Dido; e o paradeiro
Dos junonios hospicios mal enxergo:
O ensejo he de tental-a. Eu receosa705
Previno os dolos, accender projecto 705
A raínha; que um nume a não trastorne,
Mas firme, quanto eu mesma, a Enéas ame.
Ouve o como ha de ser. O infante regio,
Desvelo meu, do genitor chamado,710
Levar a Byrsa as dadivas propõe-se, 710
Das vagas restos e das teucras chammas.
Sopito em somno o esconderei no idalio
Jardim sacro, ou nos bosques de Cythera,
Porque os ardis não turbe inopinado.715
Tu nelle te disfarça uma só noite, 715
Do menino as feições veste menino;
E, entre o lieu licor e as reaes mesas,
Quando em seu gremio Dido, em cabo leda,
Amplexos te imprimir e doces beijos,720
Fogo lhe inspires e subtil veneno." 720
A’ voz da cara mãe depondo azas,
Finge gozoso Amor de Iulo o porte.
Ella em somno abebera o neto amado;
No collo amima e o sobe ao luco idalio,725
Onde molle e suave mangerona, 725
Entre flores o abraça e fresca sombra.
E obediente os regios dons Cupido
Leva aos Tyrios, folgando após Achates.
Já d’aurea tela em sumptuoso leito730
Acha a Dido, bizarra entre os magnatas. 730
Com sequito luzido o heroe concorre;
Tomam seu posto em purpura excellente.
Dá-se agua ás mãos, em canistréis vem Ceres,
Toalhas servem de tosada felpa.735
Cincoenta moças frutas e viandas 735
Arrumam dentro, aos divos thurificam;
Cem outras e iguaes moços põem nas mesas
A baixella, a bebida e as iguarias.
Em mó nas salas festivaes, os Tyrios740
De ordem recostam-se em coxins lavrados. 740
O padre, o falso Ascanio, o vulto admiram
Flagrante e a voz do deus; o manto, as joias,
De croceo acantho o véo. Não farta a mente
A misera Phenissa, á mortal peste745
Votada, e mais e mais se abraza olhando 745
O menino e seus dons. Do pae fingido
Elle nos braços, do pescoço appenso,
Mal sacia-lhe o amor, vai-se á raínha.
Com olhos e alma se lhe apega Dido,750
No collo o assenta, sem saber, coitada! 750
Que deus afaga. O alumno de Acidalia
Sicheu aos poucos remover começa,
E intenso ardor insinuar procura
N’um coração já frio e ha müito esquivo.755
A primeira coberta alçada, os vinhos 755
Bolham, coroados, em bojudas copas.
Retumba o tecto, o estrepito por amplos
Atrios reboa; de aureas architraves
Pendentes lustres e os brandões accesos760
A noite vencem. Grave de ouro e gemmas 760
Pede-a logo a raínha, e do mais puro
Enche a taça, que desde Belo usaram
Seus avós. Nos salões tudo em silencio:
"Jupiter, se he que aos hóspedes legislas,765
Tam fausto alegre dia aos meus e aos Phrygios 765
Faze aos vindouros memoravel: Baccho
Porta-jubilo assista, e a boa Juno;
Vós o convite celebrai-me, ó Tyrios."
Em honra então na mesa o vinho entorna,770
Com seus labios o toca, e o dá libado 770
A Bycias provocando: elle aguçoso
Empina a espumea taça, em transbordante
Ouro se ensopa: toda a côrte o imita.
Logo entoa as lições do sabio Atlante775
Em aurea cithara o crinito Iopas: 775
Canta a solar fadiga, a Lua instavel;
Donde homens e animaes, bulcões e raios;
Donde o nimboso Arcturo, e os Triões gemeos
E as Hyadas provêm; como apressados780
Se tingem no aceano os soes hybernos, 780
Ou que demora estorva as tardas noites.
Penos e Troas á porfia o applaudem.
O serão entretida ia estirando
A infeliz Dido, e longo o amor bebia,785
Müito de Priamo, inquirindo müito 785
De Heitor; que armas da Aurora o filho tinha,
Diomedes que frisões; que jando Achilles.
"Do princípio antes, hóspede, as insidias
Graias, dice, nos conta, e o patrio excidio,790
E errores teus; que já seteno estio 790
De praia em praia todo o mar voltêas."[3]

Notas

  1. No original, consta .
  2. 'Sebresahe está por sobresahe, erro tipográfico corrigido na segunda edição.
  3. No original de Odorico, faltam estas aspas, óbvio erro tipográfico.