Horto (1910)/Ciume
Não brinques ao sol, menina!
É tão preto o teu cabelo,
Que exposto ao sol que ilumina,
Jamais, jamais quero vê-lo.
Não sabes por que, Maria?...
Do sol o brilhante açoite
Só vem à terra de dia
Porque não gosta da noite.
E eu temo que ao ver formoso
O teu cabelo, um tesouro!
O sol, que é tão invejoso,
Não queira torná-lo louro.
Louro, Maria! o repouso
Onde vacilo com a cruz,
O doce abrigo onde pouso
Meus olhos fartos de luz?
Não quero, flor de minh’alma,
Linda esperança em botão...
O dia não é que acalma
As mágoas do coração.
Quando a dor em fúria brusca
Lhe vem magoar o seio,
A treva da noite busca
Para chorar sem receio.
E a minha noite mais pura
No teu cabelo é que eu vejo;
Esqueço toda a amargura
Se a tua cabeça beijo!
E agora, santa, avalia
Que pena teria eu
Se chegasse a ver um dia
O teu cabelo, Maria,
Da cor dos astros do céu!
Nova Cruz - Novembro - 1897.