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100 | 40 anos no interior do Brasil: aventuras de um engenheiro ferroviário

o tesoureiro tinha alguns mil-réis no caixa, tudo virou uma bagunça por lá; cada um andava sempre com seus recibos prontos e assinados. Eu me lembro que certa vez andei por uma semana com um recibo de trinta mil-réis, cerca de quinze marcos e tentei diversos ataques contra o caixa fechado, sem receber um mil-réis.

Como às vezes as pessoas precisavam de dinheiro vivo, surgiram então espertalhões com a ideia de tirar alguns sacos de açúcar ou algumas mercadorias do armazém e ir com o roubo até a cidade, para lá vender pela metade do preço. Mas isso funcionou apenas algumas vezes, depois calcularam quanto uma família de mais ou menos quatro pessoas poderia comer, mesmo que comessem muito, e a coisa terminou por aí. Foi muito emocionante! Às vezes acontecia do nosso chefe da contabilidade pedir um empréstimo para a firma. Eu nunca tinha visto um gênio das finanças como esse. Por vezes, vinha carregado com cinco ou dez contos de réis e aí era uma festa particular, quando se via novamente uma nota de cem mil-réis cara a cara, mas se tratava de um efêmero raio de luz no lado cinzento da vida. Cada um de nós e uma grande parte dos trabalhadores tinham alguns milhares de réis para exigir e o empreiteiro muito mais. No entanto, ninguém recebia nada. Ninguém podia desejar que os empregados trabalhassem com muita vontade e amor sob estas circunstâncias. Às vezes iam para o trabalho, às vezes não; e quando iam, trabalhavam tão mal que não dava para aguentar. Finalmente eu fiquei farto dessa coisa, fui ao chefe e pedi-lhe minhas contas; pois no fundo nós tínhamos pouco ou nada mais para fazer, nem no escritório nem no trajeto. Como eu sabia que a as coisas estavam ruins, pedi-lhe dinheiro suficiente para que pudesse viver um mês com minha família e deixei a cidade.[1]

Porém, um amigo meu permaneceu lá, um outro alemão, da Vestfália, um homem grande, trabalhava como uma mula, era cuidadoso e bom. Este mestre de obras aos poucos estava ascendendo à direção geral, pois o empreiteiro raramente estava presente, ficava um pouco na capital do

 

  1. Esse é o único trecho em que Hellig refere-se a sua família, não tratando diretamente de esposa e filhos em nenhuma parte da narrativa. (NdH)