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Robert Helling | 89

A mula estava de cabresto. Com o maior cuidado aproximou-se, agarrou o cabresto, deu uma última olhada ao acampamento, atou a ponta do cabresto na mandíbula da mula, subiu e, batendo o animal nos lados com os calcanhares mandou-o galopar pelo caminho pelo qual tinha chegado. No próximo cruzamento entrou primeiro na trilha principal, deixando vestígios bem visíveis; mas depois, aproveitando de uma parte rochosa do caminho, desceu e conduziu a mula pelo mato a uma trilha lateral. Orientando-se pelo sol, prosseguiu morro acima, morro abaixo, sem intervalo e sem sela, no duro lombo da mula, durante treze léguas[1]. Parou apenas para tomarem água e aguçar ao máximo os ouvidos a fim de distinguir sinais de perseguidores. Mas só se ouvia o canto das cigarras e os gritos graves e abafados dos bugios. Continuou sem parar; e quando por fim apareceu uma zona povoada onde estava seguro e se viu em frente de uma casa hospitaleira, o velho desceu da mula exausto. Pessoas prestativas carregaram-no para dentro. Tomou um pouco de leite, espichou-se numa cama e dormiu o sono do cansaço.

Muitas horas depois, quando acordou e conseguiu relatar sua aventura, perguntei-lhe: “O sr. me diga uma coisa: Como agüentou andar treze léguas nessa mula dura e sem sela?” Olhou-me pensativo e disse: “Pois é, não sei bem como aguentei! Provavelmente todos os meus sentidos estavam unidos nos ouvidos em alerta a possíveis perseguidores; e por isso nem notei minhas pobres nádegas. Creio que nos próximos quinze dias não vou poder sentar.”

 

  1. Equivale a 68 quilômetros. (NdT)