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Robert Helling | 99

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Um tiro no coração


A construção da estrada de ferro é uma coisa magnífica, quando se tem um bom contrato como empreiteiro, fiscais engenheiros simpáticos, sem muitas dívidas e um pouco de sorte. Mas ai de quem não tiver essas ótimas condições! Daí o empreiteiro briga, o mestre de obras xinga e os trabalhadores se revoltam, quando não recebem o seu pagamento. Nós estávamos mais ou menos nessa mesma situação desagradável. Nosso empreiteiro era um alemão, um homem maravilhoso, só que tinha quatro defeitos: em primeiro lugar, ele fora descuidado na redação do contrato; depois espalhou por toda parte que os fiscais engenheiros eram burros; em terceiro, geralmente ele não tinha nenhum dinheiro, somente dívidas, portanto seu capital de giro era imprestável, e quarto: não tinha sorte. Nós, mestres de obras, fizemos a nossa obrigação quando xingamos bastante, mas não exatamente no começo, e sim mais para o fim da infeliz história, quando o capital de giro havia sido usado na construção e a companhia criou mil dificuldades e formalmente pressionou o infeliz empreiteiro de acordo com o contrato. Pois naturalmente todos aqueles fiscais que tão generosamente haviam sido chamados de burros estavam contra ele, e além do mais o empreiteiro era, como se dizia, um alemão. A situação piorava a cada mês. Nós já não recebíamos o salário direito há oito meses, mas apesar disso não passávamos fome, pois lá havia um armazém. Era posto nesse armazém todo o dinheiro que se tinha e ainda se usava três vezes mais em crédito. Podia se comprar lá alimentos, botas, roupas e papel para cartas, ou seja, quase tudo que se precisava para viver, porém a um preço absurdo que subia sempre que o dinheiro se tornava escasso. A situação não deixava de ter uma certa graça e, quando surgiu o boato que