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A MENINA DO


de estimação, e mais a Excellentissima Senhora Dona Emilia, uma boneca de panno, fabricada pela preta e muito feiosa, a pobre, com seus olhos de retroz preto e as sobrancelhas tão lá em cima que é ver uma cara de bruxa.

Mas apesar disso Narizinho quer muito bem á Sra. Dona Emilia, vive a conversar com ella e nunca se deita sem primeiro accommodal-a numa rêdinha armada entre dois pés de cadeira. Fóra esta bruxa de panno, o outro encanto de Narizinho é um ribeirão que passa no fundo do pomar, de aguas tão claras que se vêem as pedras do fundo e toda a peixaria miuda.

Não se passa um dia sem que Lucia vá sentar-se á beira d'agua, na raiz de um velho ingázeiro, alli ficando horas, a ouvir o barulhinho da corrente e a dar comida aos peixes. E elles bem que a conhecem! É vir chegando a menina e todos lá vêm correndo, de longe, com as cabecinhas erguidas, numa grande famiteza. Chegam primeiro os piquiras, os guarús barrigudinhos, de olhos saltados; vêm depois os lambarys ariscos de rabo vermelho; e finalmente uma ou outra parapitinga desconfiada. E nesse divertimento fica a menina até que a tia Anastacia appareça no portãosinho do pomar e grite com a sua voz socegada: — Narizinho! Vovó está chamando!

E assim vivem aquellas tres creaturas, lá no fundo do grotoão, muito socegadas da vida, sem inquietações nem aborrecimentos.

Certa vez, estando a menina á beira do rio, com a sua boneca, sentiu os olhos pesados e uma grande lombeira pelo corpo. Estirou-se na relva e logo dormiu, embalada pelo murmurinho do ribeirão. E estava já a sonhar um