Página:A Viuva Simões.djvu/10

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um focinho de fuinha e olhos pequenos, perspicazes e terríveis.

Não era fácil dirigir pessoal tão diferente em raças e em educação. A viúva; modesta, e um pouco indolente para os deveres exteriores, consumia ali, dentro das suas paredes, toda a sua atividade.

Em vida do marido freqüentara algum tanto a sociedade; mas depois que ele partiu sozinho para o outro mundo, ela encolheu-se com medo que se discutisse lá fora a sua reputação, coisa em que pensava numa obsessão quase nevrótica.

Adquirira fama de menagère exemplar; e então levava o escrúpulo a um ponto elevadíssimo para não desmerecer nunca do conceito de boa dona de casa. Levantava-se cedo; percorria o jardim, a horta, o pomar, o galinheiro; censurava o hortelão pelo menor descuido; via bem até as mais insignificantes ninharias: a grama precisava ser aparada... As roseiras careciam de poda; porque não se enxertavam estes ou aqueles pés de fruta? O homem respondia que já tinha deliberado aquilo mesmo, e ela passava adiante, sempre com perguntas ou ordens.

No interior era um chuveiro de recriminações. A cozinha tomava-lhe horas. Passava os dedos nas panelas e nos ferros do fogo, a ver se estavam limpos; cheirava as caçarolas; obrigava a Benedita a arear de novo tachos e grelhas, a lavar a tábua dos bifes e o mármore das pias e da mesa.