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Há já alguns meses mesmo, uma banda alemã, com instrumentos, estantes e desafinações, atormenta as grandes praças, e eu lobriguei outro dia ainda um bicho lendário por mim julgado tão desaparecido como o megatério – o homem dos sete instrumentos! E esse homem, cheio de instrumentos, ia por aí fora, satisfeito e corado, como se tivesse realizado uma agradável receita.

Os músicos vieram todos! Não perde a cidade os seus foros de musical – o Rio, onde tudo é música, desde a poética música dos beijos à decisiva música de pancadaria.

Novamente à beira das calçadas a Valsa dos Sinos e O Guarani se desarticulam em velhos pianos; novamente sujeitos, que parecem cegos, rodam a manivela dos realejos, estendendo a mão súplice, numa ânsia de miséria; novamente, depois de alguns trechos da sonante Boêmia, um piresinho de metal se vos oferecerá, desejoso de níqueis. E todos vós, que sois bons, e todos vós, que gostais de música, haveis de deplorar os coitados que alegram os outros para viver na miséria, com a alma varada de dor, e todos vós sofrereis a crise de harmonia. Oh! a música!

Elle mouille comme la pluie, Elle brûle comme le feu.

Uma sanfona faria Harpagon generoso e Lady Macbeth boa.

Esta cidade é essencialmente musical; era impossível passar sem os músicos ambulantes. A música preside à nossa vida, a música auxilia até