Página:A alma encantadora das ruas (1910).pdf/161

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tejadilhos, e essa gente furiosa, numa fúria que lembrava bem a vertigem de Dionísios, berrava, apostrofava, atirava bengaladas num despejo de corpos e de conveniências. Entretanto, pelas mesmas ruas, a corrida aumentava e era uma disparada louca entre vociferações, sons de corneta, tren-ten-tens de bondes, estalar de chicote. Quando passamos o túnel num fracasso de metralha e demos nos campos de Copacabana, a velocidade foi vertiginosa, e era apenas vagamente que se divisavam, fugindo à sanha dos fon-fons, ao estrépito das rodas, a linha de fiéis da redondeza marginando o capinzal e, à esquerda, num diadema de estrelas, a iluminação da Igrejinha. Recostei-me. O automóvel saltava como um orango ébrio, no piso mau. De repente fez uma curva e entrou numa rua cheia de gente, de carros, de outros automóveis. Estávamos no grande sítio.

– É aqui?

– É.

Cerca de três mil pessoas – pessoas de todas as classes, desde a mais alta e a mais rica à mais pobre e à mais baixa, enchia aquele trecho, subia promontório acima. E o aspecto era edificante. Grupos de rapazes apostavam em altos berros subir à igreja pela rocha; mulheres em desvario galgavam a correr por outro lado, patinhando a lama viscosa. Todos os trajes, todas as cores se confundiam num amálgama formidável, todos os temperamentos, todas as taras, todos os excessos, todas as perversões se entrelaçavam. Quis notar o elemento predominante. Num trecho havia mais