Página:A alma encantadora das ruas (1910).pdf/18

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têm no cérebro a sensação dessa semelhança, e assim como dizem de um rapagão:

– Quem há de pensar que vi este menino a engatinhar!

Murmuram:

– Quem há de dizer que esta rua há dez anos só tinha uma casa!

Um cavalheiro notável, ao entrar comigo certa vez na Rua Senador Dantas, não se conteve:

– É impossível passar por aqui sem lembrar que a velhice começa a chegar. Quando vim da província esta rua tinha apenas duas casas no antigo jardim do Convento, e eu tomava chopps no Guarda Velha a três vinténs!

Eu sorria, mas o pobre sujeito importante dizia isso como se recordasse os dois primeiros dentes de um homenzarrão, com uma dentadura capaz atualmente de morder as algibeiras de uma sociedade inteira. Era a recordação, a saudade do passado começo. Há nada mais enternecedor que o princípio de uma rua? É ir vê-lo nos arrabaldes. A princípio capim, um braço a ligar duas artérias. Percorre-o sem pensar meia dúzia de criaturas. Um dia cercam à beira um lote de terreno. Surgem em seguida os alicerces de uma casa. Depois de outra e mais outra. Um combustor tremeluz indicando que ela já se não deita com as primeiras sombras. Três ou quatro habitantes proclamam a sua salubridade ou o seu sossego. Os vendedores ambulantes entram por ali como por terreno novo a conquistar. Aparece a primeira reclamação nos jornais contra