Página:A alma encantadora das ruas (1910).pdf/31

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de tal maneira os seus habitantes, que há até ruas em conflito com outras. Os malandros e os garotos de uma olham para os de outra como para inimigos. Em 1805, há um século, era assim: os capoeiras da Praia não podiam passar por Santa Luzia. No tempo das eleições mais à navalha que à pena, o Largo do Machadinho e a Rua Pedro Américo eram inimigos irreconciliáveis. Atualmente a sugestão é tal que eles se intitulam povo. Há o povo da Rua do Senado, o povo da Travessa do mesmo nome, o povo de Catumbi. Haveis de ouvir, à noite, um grupo de pequenos valentes armados de vara:

– Vamos embora! O povo da Travessa está conosco.

É a Rua do Senado que, aliada à Travessa, vai sovar a Rua Frei Caneca...

Como outrora os homens, mais ou menos notáveis, tomavam o nome da cidade onde tinham nascido – Tales de Mileto, Luciano de Samosata, Epicarmo de Alexandria – os chefes da capadoçagem juntam hoje ao nome de batismo o nome da sua rua. Há o José do Senado, o Juca da Harmonia, o Lindinho do Castelo, e ultimamente, nos fatos do crime, tornaram-se célebres dois homens, Carlito e Cardosinho, só temidos em toda a cidade, cheia de Cardosinhos e de Carlitos, porque eram o Carlito e o Cardosinho da Saúde. Direis que é uma observação puramente local? Não, cem vezes não! Em Paris, a Ville-Lumière, os bandos de assassinos tomam freqüentemente o nome da rua onde se organizaram; em Londres há ruas dos