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a campanha de canudos
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« Senhor, repliquei eu, si é catholico, deve considerar que a Egreja condemna as revoltas, e, acatando todas as formas de Governo, — ensina que os Poderes constituídos regem os povos em nome de Deus.

E’ assim em toda parte. A França, que ô uma das principaes nações da Europa, foi monarchia por muitos séculos; mas ha mais de 20 anuos é republica: e todo o povo, sem excepção dos monarchistas de lá, obedece ás autoridades e ás leis do Governo.

Nós mesmos, aqui no Brazil, a principiar dos bispos até ao ultimo catholico, reconhecemos o Governo actual. Sómente vós não vos quereis sujeitar ? E’ máu pensar esse, é uma doctrina errada a vossa. »

Interrompeu-me um dos da turba, gritando com arrogancia: V. revm.é que tem uma doctrina falsa, e não o nosso Conse­lheiro. Desta vez ainda o velho impoz silencio, e por unica resposta me disse: eu não desarmo a minha gente, mas tambem não estorvo a sancta missão.

Não insisti no assumpto, e, acompanhados da multidão, sahimos todos, indo escolher o logar para a latada e pro­videnciar para que no dia seguinte principiassem os exer­cícios.

Feito isto, e quando me retirava, os fanaticos levantaram estrondosos vivas á Sanctissima Trindade, ao Bom Jesus, ao Divino Espirito Sancto, e ao Antonio Conselheiro.

Missionando em varias freguezias vizinhas, eu havia já colhido informações sobre Antonio Conselheiro e seus principaes sectários; mas, estando entre elles, quiz — antes de dar principio á minha prégação — averiguar o que realmente elles eram, e o que faziam.

Do que vi e ouvi apurei o que passo a registrar, para que se aprecie melhor o occorrido.

Antonio Conselheiro, cujo nome de familia é Antonio Vicente Mendes Maciel, cearense, de cor branca tostada ao sol, magro, alto de estatura, tem cerca de 65 annos, e pouco vigor physico, parecendo soffrer alguma affecção organica, por fre­qüentes e violentos accessos de tosse a que é sujeito.