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a campanha de canudos
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policia havia tiroteiado com os tropeiros incumbidos daquelle serviço. E por toda parte então so espalhou — que Canudos era o reducto da monarchia e a guarda avançada da restau­ração.

E' certo, porém, não se ter nunca provado — que os monarchistas estivessem de intelligencia com os habitantes de Ca­nudos ; pelo contrario, se liquidou — que não passava de ballela o boato, que circulara, de haverem muitos — dentre elles — enviado sommas avultadas ao Conselheiro, em cujo acampamento alguns até deveriam se encontrar.

Não contesto — que os monarchistas anhelassem a victoria dos fanaticos, na esperança de tirar della proveito assás apre­ciável ; mas, na essencia, a questão era outra.

Um homem allucinado pela doctrina religiosa, que elle proprio creara, alterando a seu talante a orthodoxia aprendida de seus paes, conseguiu fanatizar uma população numerosa, pela qual era tido em conta de apostolo insubstituivel, e verda­deiro inspirado de Deus.

E’ exacto — que elle atacava a republica, menos porém pela pretenção de restaurar a monarchia do que pela vontade de ver ainda restabelecidos certos institutos, como — por ex­emplo — o do casamento religioso, que a Constituição de feve­reiro havia substituído, incorrendo por isto no desagrado dos tradicionalistas impenitentes.

O Conselheiro hostilizava a republica — por ter esta decre­tado a separação do Estado e da Egreja, medida repellida por quantos não aprofundaram jamais os ensinamentos de Christo, ou não têm forte e enraizada a sua fé.

Elle se insurgia contra a republica, porque esta ousara enfrental-o em Maceté, dando assim o signal de que não reconhecia aquelle Estado no Estado, constituído á sombra de uma tole­rancia imperdoavel, em menoscabo das autoridades e da lei.

Cumpre, porém, reconhecer — que era preciso ser um homem fóra do commum para se impor à multidão por meio da palavra e do gesto, como Antonio Conselheiro, o fazia, a despeito de faltar-lhe a eloquencia dos oradores de escól, e a magestade grandiosa dos prophetas biblicos.