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A cidade e as serras

Não se separava então do Ecclesiastes. E circulava por Paris trazendo dentro do coupé Salomão, como irmão de dôr, com quem repetia o grito desolado que é a summa da verdade humana — Vanitas Vanitatum! Tudo é Vaidade! Outras vezes, logo de manhã o encontrava estendido no sophá, n’um roupão de sêda, absorvendo Schopenhauer — emquanto o pedicuro, ajoelhado sobre o tapete, lhe polia com respeito e pericia as unhas dos pés. Ao lado pousava a chavena de Saxe, cheia d’esse café de Moka enviado por emires do Deserto, que não o contentava nunca, nem pela força, nem pelo aroma. A espaços pousava o livro no peito, resvalava um olhar compassivo para o pedicuro, como a procurar que dôr o torturaria — pois que a todo o viver corresponde um soffrer. Decerto o remexer assim, perpetuamente, em pés alheios... E quando o pedicuro se erguia, Jacintho abria para elle um sorriso de confraternidade — com um «adeus, meu amigo» que era «um adeus, meu irmão!»

Esse foi o periodo esplendido e soberbamente divertido do seu tédio. Jacintho encontrára emfim na vida uma occupação grata — maldizer a Vida! E para que a podésse maldizer em todas as suas fórmas, as mais ricas, as mais intellectuaes, as mais puras, sobrecarregou