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A cidade e as serras
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gravatas de setim escuro que uma perola prendia, as luvas de anta branca, o verniz das botas, vinham de Londres em caixotes de cedro; e usava sempre ao peito uma flôr, não natural, mas composta destramente pela sua ramalheteira com petalas de flôres dessemelhantes, cravo, azalea, orchidea ou tulipa, fundidas na mesma haste entre uma leve folhagem de funcho.

 

Em 1880, em Fevereiro, n’uma cinzenta e arripiada manhã de chuva, recebi uma carta de meu bom tio Affonso Fernandes, em que, depois de lamentações sobre os seus setenta annos, os seus males hemorroidaes, e a pesada gerencia dos seus bens «que pedia homem mais novo, com pernas mais rijas» — me ordenava que recolhesse á nossa casa de Guiães, no Douro! Encostado ao marmore partido do fogão, onde na véspera a minha Nini deixára um espartilho embrulhado no Jornal dos Debates, censurei severamente meu tio que assim cortava em botão, antes de desabrochar, a flôr do meu Saber Juridico. Depois n’um Post-Scriptum elle accrescentava — «O tempo aqui está lindo, o que se póde chamar de rosas, e tua santa tia muito se recommenda, que anda lá pela cozinha, porque vai hoje em trinta e seis