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de que os pretos africanos faziam uso ás ocultas, começou a fumá-la, de princípio em cabeça e depois em cigaros. A mudança da sua conduta foi logo sensivel. As cartas que dirijia da fazenda ao dr. Mendes Viana e que eram sempre muito minuciosas, a respeito do movimento da mesma, começaram a, causar estranhesa, pela evidente desconexidade que lhes notava. A uma delas, fez apender este post scriptum, em caligrafia impecavel:— «A HISTORIA EXISTE: ELA FAZ 5.876 ANOS. A LINGUAJEM DOS PRIMEIROS HiSTORIADORES FOI AALEGORIA. O ESPIRITO HUMANO AFRAQUECEANDO-SE DESDE O PRINCIPIO DA ANTIGUIDADE (?); A IDÉA DE UM ENTE SUPERIOR E CRIADOR HA DE TER SUSEDIDO À BRUTEZA PRIMITIVA, NESSES PRIMEIROS TEMPOS DA RELIJIÃO NATURAL, OS HOMENS PERFERTERAM-SE E É PROVAVEL QUE DEUS ESCOLHEU UMA FAMILIA PARA GUARDAR O FOGO SAGRADO DA INTELIJENCIA... O POVO DE ISRAEL FOI ESCOLHIDO? MINHA CONSCIENCIA ME DIZ SIM E NÃO.... FOI ESCOLHIDO, POIS ABANDONADO(?)...». E assim por diante. Outra carta, encimada por uma alegoria, onde se vê uma balança sob o fiel desta um olho humano, começa assim:— «S. JOSÉ EM CONDÓ, 4º TRABALHO SOLARIO DA 666º POTENCIA DE SÃO JOÃO, CONFIRMADO PELA DIVINA LUZ DO ESPIRITO SANTO OU MELHOR PREDITO PELO MARABOUT PRETO (1/4) A. DUMAS, HÓMME DE LETTRES FRANÇAIS, O TUDO A CAVALO N'APOCALIPSE E NA METEMPSICOSE (QUE NÃO HA NENHUMA RAZÃO NUMERICA DE SER, COMO O DISSE ESSE PAPEL DO PADRE FARIA, MORTO JÁ FAZ TEMPO).

Com a leitura de tais disparates, resolveu então o dr. Mender Viana visitar a fazenda. Imajine-se que, ao entrar no vasto páteo que lhe ficava em frente, dá com o francez inteiramente nù, perfilado, a mandar avançar colunas imajinárias, em tom de comando. Tinha sido efetivamente militar e tomado parte na guerra franco-prussiana, na qual o prenderam. Agravando-se-lhe o delirio, decidiu o dr. Mendes Viana fazê-lo partir para a capital, na esperança de que èle melhoraria em S. Luiz. Mas, escoando-se os mezes sem que a loucura desaparecesse,