Página:A morgadinha dos canaviais.djvu/173

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quasi de um salto, o espaço, que o separava ainda do ribeiro, e lançou-se á agua.

Era a vez de Augusto revelar coragem. Henrique tambem a possuia, mas abusava d’ella ou, por vaidade malbarateava-a em ninharias. Ainda n’isto se revelava o seu amor de ostentação. Imaginava-se sempre n’um palco, deante de espectadores que o viam e applaudiriam, se desempenhasse bem o papel de homem perfeito. Fraco perante doenças imaginarias, arriscaria, para evitar o ridiculo, a propria vida, assim como suffocaria, por ventura, um impulso generoso, que não pudésse harmonisar-se com a convenção, que se chama elegancia.

Eram estes os defeitos que Magdalena adivinhára n’elle.

Augusto era differente.

As suas grandes qualidades guardava-as com modestia dos olhos estranhos, para sómente as revelar, quando pudéssem ser uteis.

Ao vêr cahir a mantilha de Magdalena, não arriscou temerariamente a vida para a buscar. Procurava com placidez os meios de o fazer, com mais segurança, embora com menos romanticismo; mas, para salvar uma vida, para obedecer a um instincto, verdadeiramente nobre e generoso, nada o fazia recuar.

Logo que Augusto voltou a terra e auxiliou o herbanario a subir para a margem, Magdalena, respirando emfim com desafogo, respondeu ás anteriores palavras de Henrique, dizendo em suave tom de censura:

— Bem vê que nem sempre é cauteloso o nosso guia, primo Henrique. Sabe tambem arriscar a vida, quando uma razão de humanidade lh’o pede. A sua imprudencia de ha pouco... agradeço-lh’a, mas... não posso approval-a. Confesse que não foi tão justificada como esta.

Henrique tinha a razão clara bastante e a consciencia justa para vêr que, apesar da sua façanha