Página:A morgadinha dos canaviais.djvu/194

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O cabello louro e curto levantava-se-lhe graciosamente em anneis naturaes, com grande vantagem para a espaçosa e bem modelada fronte.

Quando Angelo chegou ao pateo, era quasi noite fechada. As janellas do Mosteiro estavam todas obscuras, á excepção das aguas-furtadas, correspondentes aos quartos das creanças. Angelo desmontou e cautelosamente se dirigiu a pé para casa.

Torquato dormia á porta, como frequentemente lhe acontecia.—­Angelo pôde assim penetrar sem ser percebido até o maïs intimo da casa, até os aposentos onde dormiam as creanças, e em cujas janellas avistára luz.

A scena que viu, ao entrar alli, insinuou-lhe no coração uma suave e encantadora alegría.

O maïs novo dos seus primos, creança de très annos, estava meio nú e de joelhos sobre o leito com as mãos erguidas e os olhos fitos em um crucifixo que tinha á cabeceira. Magdalena, ao lado d’elle, dictava-lhe as palavras da oração, que a creança repetia, cheia de fervor.

Nos quartos proximos palravam, ainda acordados, os maïs velhos, apesar das continuadas advertencias da prima.

Angelo approximou-se sem ruido, e quando a morgadinha se abaixava para beijar a creança, elle estendeu a cabeça e pousou tambem um beijo nas faces da irmã.

Magdalena soltou uma exclamação de surpreza e cingiu-o nos braços com effusão.

A creança levantou um brado, que foi o signal de revolta dado a Marianna e Eduardo, que cêdo abandonaram os quartos e correram a abraçar Angelo.

—­Vens só?—­perguntou Magdalena ao irmão, quando uma pergunta lhe foi possivel.

—­O pae ficou na loja do Canada—­respondeu Angelo.—­Estava em sessão a assembleia dos notaveis. E como estás tu, minha Lena, tu e Christe e a tia? Como vae toda essa gente?