Página:A toponímia indígena artificial no Brasil.pdf/5

Wikisource, a biblioteca livre
ISSN: 2317-2347 – v. 9, n. 2 (2020)
Todo o conteúdo da RLR está licenciado sob Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional
3 A nomeação toponímica artificial no mundo e no Brasil e algumas de suas causas

A criação de topônimos artificiais pode ter diversas causas e motivações, dentre as quais arrolamos as seguintes:

a) A necessidade de se incorporar um objeto geográfico a um determinado sistema toponímico. Conforme bem observaram Urazmetova et. al. (2017, p. 26), os objetos geográficos não nomeados diminuem cada vez mais à medida que a humanidade expande seus horizontes sobre a superfície terrestre.
b) A intenção de marcar o início de um novo momento histórico, como é o caso da substituição do nome São Petersburgo por Leningrado, depois da Revolução Russa. Com a descolonização da África e da Ásia, no Pós-Guerra, por exemplo, buscou-se muitas vezes a eliminação de heranças coloniais, como foi o caso da substituição dos nomes Birmânia, Ceilão, Calcutá e Lourenço Marques por Myamar, Sri Lanka, Kolkata e Maputo, respectivamente.
c) O projeto de valorizar raízes nacionais e identidades culturais, em consequência de fortalecimento de nacionalismos políticos. Tal foi o que ocorreu no Brasil na primeira metade do século XX, quando houve intensa nomeação em línguas ameríndias faladas no passado, como veremos adiante.
d. A busca de uma estratégia geopolítica de dominação de um território, por meio de eliminação de elementos culturais de um povo que nele vive. Foi o que aconteceu em territórios palestinos ocupados por Israel. Segundo Nur Masalha, apud Moore et al. (2015, p. 17, tradução nossa), lá ocorreu um “toponimicídio”, isto é, “...a ‘desarabização’ da terra, a eliminação de antigos topônimos palestinos e sua substituição por toponímia sionista hebraica, criada recentemente[1]”.

No caso específico do Brasil, a nomeação artificial em línguas indígenas é explicada por certos fenômenos culturais e sociológicos observados no mundo ocidental desde o século XIX. Um deles foi o Romantismo, que valorizou a tradição histórica e nacional sobre os modelos estéticos da Antiguidade. Volta-se para o passado em busca de modelos e representações das novas nações que então surgiam. No caso do Brasil, tais modelos foram os índios de outros

256

  1. “the de-Arabisation of the land […] the erasure of ancient Palestinian place names and their replacement by newly coined Zionist Hebrew toponymy.”