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— «Não, confesso que não percebo.

— «Pois não sabe que meu tio representa uma das maiores fortunas que habitam Lisboa? Pois bem, meu tio criou-me como filha e não tem mais parente nenhum. Quem é, pois, a sua presumida herdeira?... Bom, agora supponha que estou mal com esse tio, eu, que não tenho fortuna propria...

— «Não diga isso! Rapazes a entrarem na vida são lá capazes d’um cynismo d’esses!

— «Creia que é a verdade mais verdadeira.

— «Pensando assim, como pode ter relações com elles?

— «Que ingenuidade a sua! Se fossemos a só fallar aos bons, aos honestos, em pouco tempo teriamos que nos esquecer da linguagem, por inutil... A comedia social diverte-me, porque me não prende nas suas mentiras e vaidades.

— «V. ex.ᵃ poderá fazer isso pela sua educação muito ingleza e pela independencia em que a colloca a fortuna de seu tio. No entanto, parece-me que ainda ha de soffrer com o contacto d’essa gente tão pouco digna. Cá por mim prefiro viver só.

— «Tambem eu preferiria, mas como estou na sociedade em que elles estão, divirto me a observá-los e ás vezes a fazer-lhes partidas. Pois não acha engraçado que elles me julguem de mal com meu tio, aquelle adorado tio William que nunca teve para mim senão palavras consoladoras e risos de approvação?!

— «É muito seu amigo, não é?

— «Muito! É toda a minha familia, e não havia mãe nem pae que fossem mais bondosos e