Página:Ambições (Ana de Castro Osório, 1903).pdf/193

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— «Até ahi?!...

— «Vivia com... em casa de meu pae. Não se póde dizer que vivesse com elle, porque só raramente o via. Ah! como isto me faz mal, fico nervosa, sabe?!

— «Faz-lhe mal, sim. Está n’uma tremura e tem as mãos geladas... mudemos de assumpto. Tudo quanto lhe diz respeito me interessa, mas não a quero vêr triste — disse-lhe com doçura.

— «Não, — respondeu sacudida, querendo fugir á commoção que a tomava e a fazia estremecer, deliciada, por encontrar uma tão grande ternura a diluir-se em palavras tão simples, mas tão repassadas de affecto e respeito, ditas n’aquella voz um pouco velada, de amoroso. — Quero contar-lhe o que foi a minha primeira infancia. Não lhe disséram ainda de quem sou filha?!...

— «Tentaram dizer-mo, recusei saber tudo aquillo que não viesse da sua bôcca.

— «Como esse procedimento é nobremente orgulhoso! Admiro o pelo caracter, mas, mais me obriga ainda a dizer-lhe o que me entristece e envergonha. — Como o João ia responder, atalhou — não me responda! Deixe-me dizer-lhe tudo de uma vez só, sem respirar, como quem se resolve a beber um remedio custoso. Toda a demora me faria perder a coragem. Meu pae chamava-se Pedro Avellar; nunca ouviu fallar de um banqueiro com este nome que foi accusado de falsificar lettras e quebra fraudulenta e que n’essa quebra arrastou muita gente que lhe tinha confiado as suas fortunas e tinha negocios com elle? Antes do escandalo final desappareceu e ninguem mais soube onde pára. Esse era o