Página:Ambições (Ana de Castro Osório, 1903).pdf/210

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— «Pois é; mas que fazer? A não se querer usar dos mesmos processos, mais vale não lhes ligar importancia.

— «O dr. hade confessar — dizia lhe o João indignadissimo — que tanta porcaria, tal esterquilinio d’almas desperta o desejo de caminharmos para o futuro varrendo todo esse lixo sem dó nem piedade...

— «João, João, cautella, não te mettas a regenerar o mundo, olha que se estes são o que vês, a canalha sem eira nem beira ainda se lhes avantaja em atrevimento... — respondia o visconde sybariticamente deitado n’uma cadeira de baloiço, soprando para o azul hilariante do céo o fumo leve do charuto.

— «Mas suppondo mesmo que a canalha, como o primo diz, seja mais exigente nas suas reclamações, tem direito a faze-las tendo arrastado seculos de captiveiro, tendo a vingar rios de sangue e de lagrimas...

— «Deixa lá, João, — acudiu a viscondessa para terminar uma discussão que sempre a irritava entre o egoismo do visconde e o ardente enthusiasmo do primo, que trouxera da Belgica, a par de uma grande instrucção, uma fé sem limites n’um melhor futuro para os despresados de hoje — O dr. soffre o castigo de ser honesto e ter entrado em politiquices de campanario.

— «Queres então dizer que eu não sou honesto, não é verdade? — sorriu com indifferença o visconde.

— «Não é isso, mas tu como chefe tens tido sempre melhor posição e menos responsabilidades locaes...