Página:Ambições (Ana de Castro Osório, 1903).pdf/317

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e de obrigações para com os outros e para com a propria existencia que não temos direito de sacrificar á dôr, por conveniencias de egoismo alheio.

— «O que se ha de fazer? — perguntou João, depois de ler a carta, acostumado a encontrar na mulher o primeiro conselho que orienta e vence o sobresalto, dispondo-nos á lucta.

— «Acho que devemos mandar um telegramma a prevenir a Maria Helena de que partimos no primeiro comboio, para a trazermos para a sua casa. É onde ficará melhor.

— «Mando já o telegramma, mas a prevenir só da minha ida; tu não vaes, queridinha, tenho medo por ti e pela chegada do nosso pequenino hospede.

— «Estou em cuidado na Maria Helena, que nunca se viu só a tratar dos seus negocios.

— «Descança em mim, verás que mereço a tua confiança, minha vaidosa.

Ella sorriu ao sorriso d’elle, erguendo a cabeça, que apenas lhe chegava ao hombro, para receber na bocca o beijo que lhe offerecia amorosamente.

O sol entrava pela porta de vidros que descia para o jardim, onde as rosas se abriam á primeira caricia da primavera, e nimbava-os de luz n’uma transfiguração milagrosa de vida.

Fôra alli, n’aquelle mesmo quarto, pela transparencia d’aquella mesma janella, na impassivel cumplicidade das coisas, que a Pillar assistira, por uma lucida noite de lua, ao desmoronar de todas as suas illusões. Fôra d’alli que vira, com seus proprios olhos, a traição d’essa mesma