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resoavam os chocalhos dos rebanhos indo para o pasto e a flauta do pastor a guiá-los até á madrugada, — que depois a calma aperta e os pobres animaes, de agoniados, nem podem comer. Mais longe ainda, o chiar rangente dos carros de bois, como um longo gemido angustioso... Dir-se-hia que todas as coisas soffriam do calor asphyxiante e cahiam n’uma invencivel preguiça de viver.

É pequeno o verão nas montanhas — alguns dias de julho e agosto, quando muito os primeiros de setembro — mas esses são pezados, infernalmente longos e ardentes, sem nenhuma compensação e consolo de leve aragem pelas tardinhas. Em casa abafa-se, não ha sombra que resista á subida do thermometro quando o mercurio chega á linha do Senegal, n’um escarneo a paizes temperados. Na rua, noite alta mesmo, não se sente nenhum allivio; da terra sóbe uma baforada quente de fornalha, que afflige.

Abafa-se... mas é moda ir-se em julho para lá, não obstante ser infinitamente mais agradavel um canto de praia — onde o mar põe levezas de ar salino e um frescôr de permanente banho de espumas, as gaivotas veem á babugem da agua gritar as sonoras alegrias das coisas simples e humanas, e os olhos navegam longe, com a amplidão suggestiva das azas e das velas.

E passam na cidade, — n’aquelle afadigamento de distracções e afazeres, que chegam a ser monotonos á força de repetidos — os que obedecem á moda por preguiça intellectual de pensar e querer, os dias criadores de primavera — quando os caminhos lá das serras se alcatifam de musgos