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permanecer por muito tempo - como “mito”, seja no sentido de uma falsa ideologia, como um ideal que orienta a ação dos atores sociais ou ainda como chave interpretativa de cultura.

De qualquer forma, sabe-se que é preciso muito mais do que a mera mistura de culturas, de raças, a falada cordialidade ou o mito da democracia racial, como quer que ele se apresente, para a redução das desigualdades, manifestadas na mídia. Como lembrou Telles (2012, p. 2), durante mais da metade do século 20, não houve sequer democracia no país, com a maioria da população, incluindo os brancos, sendo privada de direitos humanos básicos e submetida à dominação autoritária, o que já denuncia que ainda há um longo caminho pela frente.

Seja como for, vale retomar a pergunta de Fanon (2008, p. 86): “existe uma diferença entre um racismo e outro?”. Concorda-se com ele quando af1rma que a mesma queda, o mesmo fracasso do homem podem ser sempre encontrados no racismo e, nesse sentido, ou uma sociedade é racista, ou não é. Felizmente, os processos sociais não são realidades estanques. Como colocou Hasenbalg e Silva (2003), os preconceitos não têm se mantido intactos desde a abolição da escravidão, mas adquirem novos signif1cados.

Assim, embora um olhar sobre as estatísticas sociais e mesmo para a capa das revistas sugerisse que o Brasil estaria entre as sociedades racistas das premissas de Fanon, é possível admitir que, nessa reorganização, movimentos de avanços e transformações possam promover espaços em prol de uma igualdade, seja por meio do apoio de práticas públicas ou graças a novas posturas, novas discussões.

Referências

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