Tinha uma pena oradora, tinha discussões parlamentares, discursos de cinco e seis horas. Que elementos para não trabalhar!
Nada; era preciso por um termo a semelhante abuso, e tomar uma resolução pronta e imediata.
Comecei por bater o pé, e passar uma repreensão severa nos meus dois empregados, que assim se esqueciam dos seus deveres.
O meio era bom, e surtiu o desejado efeito como sempre.
Entramos em explicações; e no fim de contas soube a causa dessa dissidência.
A pena se tinha declarado em oposição aberta; o tinteiro era ministerial quand même. E ambos tão decididos nas suas opiniões, que não havia meio de faze-los voltar atrás.
Era impossível, pois, evitar uma discussão; resignei-me a ouvir os prós e os contras deste meu pequeno parlamento.
A pena do meu amigo fez um discurso muito desconchavado, a falar a verdade. Por mais que lho tenha dito, não quer acreditar que a oratória não é o seu forte; tirando-a da mesa e do papel não vae nada.
Enquanto, porém, ela falava, o tinteiro voltava-lhe as costas de uma maneira desdenhosa, o que não achei bonito. Estive quase chamando-o à ordem; mas não me animei.
Chegou finalmente a vez de falar ele, e defendeu-se dizendo que todas as penas faziam oposição aos tinteiros logo que estes lhes recusaram o elemento para trabalhar, e se não lhe davam a tinta necessária para escrever, sem a qual ficavam a seco.
— C'est trop fort! Gritou a pena do meu amigo, que gosta de falar em francês. Quebro os meus bicos antes do que receber uma só gota de tinta em semelhante tinteiro.
E, se o disse, melhor o fez. Não houve forças que a fizessem molhar os bicos no tinteiro e escrever uma só palavra com aquela tinta.
Atirei-a de lado, abri a gaveta, e tomei um maço de penas que aí havia de reserva.
Mesma coisa: todas elas tinham ouvido, todas se julgavam comprometidas a sustentar a dignidade de sua classe.