e com as nações, como um menino com a sua péla, senta-se à mesa e esgrime-se contra uma asa de peru, da mesma maneira que um estudante esfaimado no dia de um enterro de ossos.
A religião, a ciência, a glória, o amor, a arte, todas essas coisas grandes e sublimes do mundo, tudo num momento dado some-se pelo fundo de um prato, ou pelas bordas de um copo de vinho.
Deixemo-nos, pois, dessas veleidades, desses orgulhos todos e sem fundamento. Todos temos as mesmas misérias, todos saímos do pó, e um dia a ele tornaremos.
Bem razão tinhas tu, meu Brillat Savarin, quando dizias que a cozinha é a primeira e a única ciência deste mundo; e que os homens só se distinguem dos animais, porque estes comem, e nós saboreamos.
Quantas da minha leitoras não terão amarrotado estas páginas e condenado o meu folhetim como a pior das revistas passadas, presentes e futuras?
Entretanto não têm razão; porque, apesar de todas estas reflexões que me assaltavam, tive bastante força de imaginação para não descer do mundo da idealidade.
Quando via um rostinho bonito inclinado sobre a mesa, chamava em meu socorro todas as comparações dos poetas antigos e modernos, e assim conseguia salvar as minhas ilusões.
Então não era uma mulher que via a comer, era uma flor que absorvia os raios de luz e as gotas de orvalho da manhã, era uma falena que libava o mel e o perfume das flores.
E tanto que, depois dessa hora de tortura, tive de acrescentar uma máxima aos aforismos tão conhecidos da Phisiologie du Gout : "O melhor meio de experimentar o amor que se tem a uma mulher é vê-la comer"
É preciso, porém, que advirtam numa coisa, e é que não falo de um jantar a dois, de uma mesa à qual nos sentamos ao lado ou mesmo defronte de uma bela moça.
Não: isto é a quinta essência da poesia.
O que disse referia-se à posição crítica de um sujeito que está morrendo de fome, e que se acha condenado ao suplício