Página:As Minas de Prata (Volume II).djvu/102

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o gargalo para sacar a rolha, o advogado suspirou e esteve algum tempo embevecido a olhar a poeira que se dissipava no ar; alguma porção lhe caiu na manga da garnacha, que o estremeceu com íntimo e recôndito sentimento.

A botelha viera de seu velho Portugal; quem sabia se aquele pó não era ainda da terra natal!

— É do superior! dizia entretanto o mestre de capela dando na língua o estalo clássico. Tão boa tivesse o excomungado do taberneiro a alma, como tem a adega!

O advogado tomou uma prova no pichel:

— Ótimo! disse ele, e melhor ainda mestre Bartolomeu, porque vem do nosso Minho!

— É verdade, senhor licenciado! Se tornaremos lá ainda?

— A mim espero que praza a Deus deixar que me vá restituir o pó destes ossos à terra de que foram amassados; mas a vós bem difícil me parece que lá torneis já agora.

— Por que então, Senhor Vaz Caminha! Cuidais que me não apertem a mim também as lembranças?...

— Oh! que não!... Alma sã e reta vos sei eu, amigo; e nas almas assim a pátria vive sempre