Página:As Minas de Prata (Volume IV).djvu/280

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docemente uns ternos arpejos de gusla, que afinavam para a doce melodia. Parando em face de uma porta, oculta por espesso e custoso reposte, mostrou o judeu aos olhos deslumbrados do mancebo e através dos lavores da madeira, um painel arrebatador.

A gentil e formosa judia descansava à moda das orientais sobre o coxim de damasco. O gracioso movimento do braço arqueando para dedilhar a gusla, acusava o rijo e palpitante contorno do seio esquerdo, prestes a escapar do decote, como um pombo da mão que o tem cativo. A ponta do pé, calçada em sandália de cetim, batia o compasso na banquinha de nácar ali posta, com a alâmpada de prata e a clepsidra dourada. Todo o mimoso talhe ondulava voluptuosamente com o fluxo e o refluxo do inquieto sentimento. Conhecia-se no sorriso vivace de seu lábio e no fogo surdo da pupila negra, que ela esperava com veemência um prazer já muito ansiado, um prazer soberano, digno de deusas.

A voz do judeu murmurou:

— Ela vos aguarda!...

D. José sentira a vista escurecer-se com os deslumbramentos daquele quadro. O sangue ardente e impetuoso