Página:Camões Os Lusíadas Page288 144r.jpg

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Nas naos estar ſe deyxa vagaroſo,
Atê ver o que o tempo lhe deſcobre,
Que não ſe fia ja do cobiçoſo
Regedor corrompido, & poauco nobre.
Veja agora o juyzo curioſo
Quanto no rico, aſsi como no pobre
Pode o vil intereſſe & ſede imiga
Do dinheyro, que a tudo nos obriga.

A Polidoro mata o Rey Treicio,
Sò por ficar ſenhor do grão teſouro:
Entra, pelo fortiſsimo edificio,
Com a filha de Acriſo a chuua douro:
Pode tanto em Tarpeia auaro vicio,
Que a troco do metal luzente, & louro,
Entrega aos inimigos a alta torre,
Do qual quaſi afogada empago morre.

Eſte rende munidas fortalezas,
Faz tredoros, & falſos os amigos,
Eſte a mais nobres faz fazer vilezas,
E entrega Capitães aos inimigos:
Este corrompe virginais purezas,
Sem temer de honra, ou fama algũs perigos,
Eſte depraua as vezes âs ciencias,
Os juyzos cegando, & as conſciencias.