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IX

Desde a origem da imensa eternidade,
Que tudo sem princípio ordena e rege,
Devemos presumir da Divindade
Que onde o ótimo encontra em tudo o elege.
E, sendo em nós tão grande a iniqüidade,
Não temos coisa que a qualquer se inveje,
Onde se os mais possíveis vendo fores,
Nós fomos os eleitos por melhores."

X

Embora seja assim (disse a donzela);
Mas que culpa têm estes, que o ignoravam?
Não cuida acaso Deus, ou pouco zela
As almas, que entre nós se condenavam?
E senão, por que causa aos mais revela
As doutrinas que aos nossos se ocultavam?
Distava mais do céu a nossa gente,
Por que medeia o mar d'Este a Poente?"

XI

Tornai a culpa a vós, e a vós somente
(O herói responde assim). Se com estudo
Procurais sobre a terra o bem presente,
Por que não procurais o autor de tudo?
Para o mais tendes lume, instinto e mente;
Somente contra Deus buscais o escudo
Em a vossa ignorância à brutal culpa!
Essa ignorância é crime e não desculpa."