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XVIII

Narra-nos, feliz alma, a visão bela!
Quem sabe se por ti nos manda aviso
A Providência, que ao governo vela,
Do mortal nos seus fins sempre indeciso!
Não nos cales entanto o que revela
Por nosso lume, o excelso Paraíso,
E a nossos rogos com memória pronta,
Dizendo quanto viste, tudo conta."

XIX

Calaram todos com ouvido atento,
Pendendo da expressão de Catarina;
E, tomando na popa em roda assento,
Dão-lho sobre um canhão, que ao bordo inclina.
"Mandais-me (a dama disse) que o portento
Haja de expor-vos da impressão divina:
Quem poderá contar coisa tão alta,
Quando o lume cessou, a ciência falta?

XX

Nem inculco em meu sonho um sacro instinto,
Que tudo fingir pode a fantasia;
Porque a imagem talvez, que n'alma pinto,
Por força natural se fingiria.
Pode ser, se pressaga a idéia sinto,
Que, sem extraordinária profecia,
Anteveja o sucesso, o tempo e o prazo,
E depois não suceda, ou seja acaso.