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XLVIII

E fácil propensão na brutal gente,
Quando em vida ferina admira uma arte,
Chamar um fabro a Deus da forja ingente,
Dar ao guerreiro a fama de um deus Marte.
Ou talvez por sulfúreo fogo ardente,
Tanto Jove se ouviu por toda a parte,
Hércules e Teseus, Jasões no Ponto
Seriam coisas tais, como as que eu conto.

XLIX

Quanto merece mais que em douta lira
Se canto por herói quem, pio e justo,
Onde a cega nação tanto delira,
Reduz à humanidade uni povo injusto?
Se por herói no mundo só se admira
Quem tirano ganhava um nome Augusto,
Quando o será maior que o vil tirano,
Quem nas feras infunde um peito humano?

L

Tal pensamento então n'alma volvia
O grão Caramuru, vendo prostrada
A rude multidão, que Deus o cria
E que espera desta arte achar domada.
Política infeliz da idolatria,
Donde a antiga cegueira foi causada;
Mas Diogo, que abomina o feio insulto,
Quando aumenta o terror, recusa o culto.