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XXI

Tendo Paraguassu dito discreta,
Prossegue então Gupeva os seus assuntos
Que, se as almas morressem, que indiscreta
A memória seria dos defuntos ?
A que servira a lei que nos decreta
Que no sepulcro se lhe ponham juntos
Comidas, arcos, frechas? quem resista
A quem depois da morte não subsiste?

XXII

O inimigo anhanhá, logo que deixa
A nossa alma esta carne, em fúria a invade,
E do mal, que cá fez, cruel se queixa,
Até que em sombras entre ou claridade;
O rito do sepulcro expresso deixa,
Que, enterrando-se em pé, na eternidade
O fim buscamos, a que Deus nos cria
E que antes de o alcançar se segue a via.

XXIII

Deste princípio nasce que com prantos
Noite e dia se chora o seu decesso.
Louvam-se nos congressos como santos,
E põe-se no sepulcro um marco expresso;
Tantas memórias, pois, ofícios tantos,
A que fim, se a alma acaba, eu não conheço.
A expiação e obséquio era frustrado,
Se ela não vive ou purga algum pecado.