Página:Caramuru 1781.djvu/91

Wikisource, a biblioteca livre
XXX

Sentada em meio da morada horrenda,
Branca de cãs e imóvel na manobra,
Imensa sombra faz que a cauda prenda
Dentro na boca horrível uma cobra:
Com rouca(a voz e intimação tremenda
Ao tempo preso na vipérea dobra
Diz, retumbando eco a cavidade:
Oh vida! oh tempo! oh morte! oh eternidade!

XXXI

Além da grã-montanha, em que se oculta
O cárcere das sombras horroroso,
De mil delicias num terreno exulta
Quem vive justo ou quem morreu piedoso.
Não se acha imagem nesta terra inculta
Que seja sombra do país ditoso.
O tempo ali da paz foi levantado,
Sempre aberto ao prazer e à dor fechado.

XXXII

Há do ameno jardim na vasta entrada
Uma grã-porta de safiras belas,
Onde da etérea luz reverberada
Se pinta em vasto fundo um mar de estrelas;
Toda ela em torno, em torno decorada
De flóridas belíssimas capelas.
Junto voragem há de um precipício,
Que sorve a quem se encosta infecto em vício.