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CARTA DE GUIA DE CASADOS
 

V


Parentescos


Correm algum perigo as muito môças pela sobejo amor aos pais, e irmãos, com que se criaram; e é tanto mais ocasionado êste inconveniente, quanto parece mais lícito.

De ordinário esta acção se regula pelo ser dêsses pais, e dessa parentela. Quando os pais sejam como devem, louvável é a inclinação; quando não, é necessário que se vá desde logo, e por bons meios, despartindo aquela familiaridade.

Sobretudo eu quisera vêr antes nas casadas para com seus pais reverência, que amor; não que lho neguem, porque sem algum amor não há nenhuma obediência; mas quando seja amor, e êles tais que não sejam dignos dêle, se no marido houver arte, o remédio não parece dificultoso.

Julgava en que para esta tal mêzinha era bem conveniente uma nova brandura, um nove afago, (digamos assim) um namorar a mulher outro tanto mais do que sem esta razão seria necessário.

A criança que outra cousa não sabe senão o peito de sua mãe, o deixa a trôco de se lhe dar a conhecer a suavidade do mel, ou do açúcar, que é mais doce que o leite. Não se duvida que o bem querer do marido é mais próprio para a mulher, que o de seus pais, e parentes. Donde vem que a mulher obrigada, e amimada do marido, esquece fàcilmente o trato dos pais, e dos irmãos.