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CARTA DE GUIA DE CASADOS

quis que vissem sua mulher ; ela se escusou ; mas enfim a visitaram. Depois à mesa quis seu marido que ela também comesse, e honrasse os hóspedes : retirou-se, e sendo apertada com recados, respondeu em sua própria língua: Dicid al Duque, qui si me hizo baxilla, no me hará vianda. Mostrando com agudeza castelhana, que já que como baixela a fizera vêr, a não quisesse também facilitar como iguaria.

Que o senhor leve algumas vezes o parente, o amigo, o ministro, o prelado, e estrangeiro, e homem douto, e principalmente o homem bom, a sua casa, e lhes faça convite, não só o não estranho, mas o louvo. É cousa honrada, e que faz os homens bemquistos. Não deve evitá-lo sua mulher, antes com todo o concêrto decente dispôr que se ministre, honrando a seu marido naquela acção ; com o que os muito ásperos se obrigam ; porque os corações nobres muito mais se satisfazem de vêr que se ama o que êles amam, do que ainda de serem por si mesmos amados.

Hei-de dizer aqui de umas, que se prezam de matronas, e quer bem, quer mal, elas querem ser os senhores de suas casa. Estas pretendem sua maioria por muito honradas, por muito sabedoras, ou por muito ilustres. E às vezes sem nenhum dêstes extremos, elas se dão tal manha, que a conseguem, especialmente dos maridos bons, simples, e divertidos.

Vigie-se logo ao princípio aquele que tais pensamentos descobrisse em sua mulher ; porque se lhe vir que uma vez deixa senhorear-se, tantas o intentará, até que de todo ela seja senhora, e êle servo. Dizia um em tal caso a sua mulher : Senhora, hei vos de levar a casa de vosso pai, e hei-de demandá-lo por justiça, que me dê minha mulher ; e perguntando ela porque, respon-