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CARTA DE GUIA DE CASADOS
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grande nos anos, na pessoa, e no estado ; e mais que tudo nos interesses. Era êste o que mais praticava com a criaturinha, e tais cousas lhe fazia fazer o espírito mau da lisonja, e adulação que trazia no corpo, que dizia outro pretendente por êle : Certo, muito é que o interêsse faça mais parvo a fulano com os filhos alheios, do que o amor nos faz a nós com os nossos.

Vá mais por jôgo, que por conselho. Quando, senhor N., Deus der filhas a v. m., não lhes consinta mais que um só nome liso, aquele que lhe ditar a devoção, ou obrigação. Tenho por grande leviandade esta ladainha de nomes (dissera melhor carta de nomes) que hoje se usa, pondo em camouço uns sôbre outros, deixando os de mais barafunda para o cabo. Deram as mulheres nesta nova casta de damaria ; e acontece que a que nasceu, e se criou mera Domingas, ou Francisca, lança sôbre si meia dúzia de Jacintas, Leocádias, Micaelas, Hipólitas, e outros nomes esdrúxulos, só porque viram chamarem-se assim, pouco mais, ou menos, a suas vizinhas.

Acho graça nesta história. Fôra a baptizar em um logar desta minha vizinhança a filha de um escudeiro ; e porque ouviu que a outra de um título tinha sua mãe mandado pôr na pia três nomes ; como a êle lhe custava barata a grandeza, içou um furo mais à vaidade, e mandou baptizar a menina com quatro nomes. Ouviu-os todos o cura, e disse aos padrinhos : Senhores, escolham um só nome, que sou fraco de memória ; ou juro a tal que lha baptize sem nome, ou lha mande para casa como veio, até que lá se resolvam no que melhor lhes parecer.

Parece que me ia esquecendo de uma cousa que julgo digna de advertência, e para que pode ser que