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CARTA DE GUIA DE CASADOS
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sabafa-se com êles o enfadamento familiar com mais confiança de compaixão, e remédio ; porque além de se referir a pessoa que os conhece, fica dito a pessoa, que outro dia pode fazer o mesmo.


XLI


Horas de recolher


Dias há que me perguntou um fidalgo sisudo, casado de poucos tempos, a que hora seria conveniente se recolhesse à noite para casa. Lembra-me que lhe disse, que essa hora daria o amor, ou ocupação, e não o relógio ; mas êle não satisfeito, fez que discorrêssemos naquele ponto.

A uns parece que se deve recolher o casado sempre a uma hora ; e tal, que possa muito bem antes dela haver negociado o que lhe pode suceder, sem dar sobressalto na tardança. A outros, que não deve ser assim, senão à hora que fôr possível ; porque vindo umas vezes cedo, se mostra que as outras que se tarda, teve a culpa a ocasião, e não a vontade.

Tenho para mim que nada disto é seguro : porque os alicerces da confiança do casado devem-se de lançar no crédito, e não no artifício. Inclino-me mais ao recolher sempre a uma hora justa, e proporcionada com as ocupações, ou de casa, ou de fóra. Sobretudo parece que os casados de pouco devem guardar mais cortesia a suas mulheres, assistindo-lhes com maior cuidado aqueles anos primeiros.