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CARTAS DE AMOR

Porem se tudo quanto obrei por amor de ti pode merecer que dês alguma, ainda que ténue, atenção ao favor que imploro, conjuro-te de não me escrever mais, e de ajudar-me a perder inteiramente de ti a memória.

Se levemente mesmo me afirmasses ter sentido algum pezar, lendo esta carta, talvez te acreditaria, e talvez também a tua confissão e o teu consentimento me causariam despeito e ira, e tudo isto poderia atear em mim de novo a chama.

Não te embaraces pois com a minha conduta; derribarias todos os meus projectos, de qualquer modo que te quisesses ingerir neles.

Não quero saber o sucesso desta carta: não venhas perturbar aquele estado para o qual me disponho.

Parece-me que podes estar satisfeito dos males que já me causas, qualquer que fôsse o teu primeiro intento de fazer-me desgraçada.

Não me prives da minha incerteza; espero com tempo alcançar por meio dela alguma tranqüilidade.

Prometo de não aborrecer-te; desconfio demasiadamente de todo sentimento violento, para ousar intentá-lo.

Estou persuadida que acharia neste país um amante mais fiel… mas ai! ¿quem poderia dar-me amor?

¿A paixão de outrem teria acáso virtude de ocupar-me?… ¿Que poder teve a minha sôbre ti?

¿Não fiz eu a experiencia, que um coração enternecido não esquece mais o que o fez descobrir transportes que não conhecia, e de que era capaz? — ¿que todos seus afectos e movimentos estão profundamente arraigados ao ídolo que erigiu para a sua adoração? — ¿que as suas primeiras feridas não podem ser nem cicatrizadas, nem extintas? — ¿que tôdas as paixões